Já conhece Oriola?

Foi assim. Desta forma simples que os meus cinco sentidos ficaram alerta.
Uma atenta seguidora de Viagens ao Virar da Esquina lançou assim, de chofre, a inquietação. Até porque fez acompanhar a interpelação com algumas fotos magnifícas.
“Oriola? O que é? Onde Fica?” – respondi, perguntando da mesma forma directa.

A expressão “Já conhece…” tem o poder mágico de me colocar a curiosidade em estado de alerta máximo. Por vezes não conheço mas já ouvi ou li algo. E acalmo. Neste caso, nada disso!

Enquanto aguardava a resposta fui à Enciclopédia Universal dos nossos dias: o Google. Oriola é uma pequena aldeia, situada a meio caminho entre Viana do Alentejo e Portel (a cujo município pertence).

A conversa prosseguiu mas o “mal” estava feito. Até porque há muito que queria também visitar Viana do Alentejo.

E os astros estavam mesmo de feição. Por esses dias tinha-me sido cedida para uma experiência de condução uma bonita Ducati Supersport 950. As estradas alentejanas seriam óptimas para tal finalidade e até para perceber se esta seria uma boa solução para viajar, tão diferente das configurações da moda.

Como disse Júlio César ao atravessar o Rubicão: “Alea Jacta Est”. Os dados estão lançados!

A viagem começa com com um cafézinho…

Sendo destino final Oriola, queria deter-me antes em Viana do Alentejo. Para lá chegar, e porque um amigo me fazia companhia desta vez, a volta tinha que ter um pouco mais de tempero.

Assim começámos por um cafézinho matinal numa esplanada em Alcácer do Sal, defronte para a tranquilidade das águas do Rio Sado e da magnífica ponte metálica, que depois de restauro recente voltou a ter a sua funcionalidade basculante perfeitamente operacional.

Ponte de Alcácer do Sal
Ponte de Alcácer do Sal

Rumámos a nordeste apenas para mais à frente tomarmos a estrada de S. Catarina. A M1071 que nos levaria até Alcáçovas, primeiro ponto de interesse da jornada.

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Planície alentejana

Para mim, era o regresso ao banco de jardim onde a tradição dos últimos anos e das diversas passagens por aqui, manda que tire uma foto (desta feita com companhia). Começou quando aqui passei a primeira vez que percorri a EN2. E pertencer à nossa estrada maior está bem sinalizado à entrada da vila.

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Foto tradicional em Alcáçovas
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Alcáçovas na EN2

Mesmo ao lado desse banco de jardim fica a imponente Igreja Matriz (em bom rigor deveria dizê-lo ao contrário por ordem de importância óbvia). Cujo rico património interior está bem protegido pelas paredes meias com o posto de GNR local (gente simpática, mas essa é outra história…).

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Igreja Matriz de Alcáçovas

Em Janeiro do ano passado, na “Opinião” da Andar de Moto #20, falei sobre Alcáçovas e sobre a importância histórica desta vila alentejana. Foi aqui que em 1479, Portugal e Espanha começaram a divisão do Mundo pelo Tratado que lhe leva o nome.

Esse tratado foi assinado no Paço dos Henriques (de Transtâmara), obra do Séc. XIII que recentemente foi alvo de importantes obras de restauro e que agora está inteiramente disponível para os visitantes.

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Paço dos Henriques

Essa divisão do Mundo foi a primeira pedra para a estratégia dos Descobrimentos de ambos os países nas décadas futuras. Foi a partir daí que ficou verdadeiramente redondo e portanto, como defendi, começou a Globalização. Convido-vos a reverem esse texto.

Mesmo ao lado fica a curiosa Capela das Conchas ou Capela de Nossa Senhora da Conceição. Construída nos séculos XVII e XVIII, apresenta a particularidade de ostentar a fachada e o altar decorados com conchas. Também adornam o jardim adjacente, onde é possível entrar através de uma torre com o interior coberto de conchas e cacos de porcelana antiga. Uma das paredes da capela, no espaço do jardim, encontra-se completamente revestida com um invulgar painel de desenhos coloridos feitos com conchas.

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Capela das Conchas
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Capela das Conchas – pormenor
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Capela das Conchas – jardim

Em Alcáçovas existe uma arte ancestral que é o fabrico de chocalhos. Desde 1 de Dezembro de 2015, que esse fabrico é considerado “Património Cultural Imaterial com Necessidade de Salvaguarda Urgente”, título atribuído pela UNESCO. O Museu do Chocalho é também um ponto de visita obrigatório.

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Arte Chocalheira

Foi em Alcáçovas que começou a chover. Os ameaços já tinham sucedido mas daqui até Viana, escassos 18 km, seguimos sempre abençoados pela água vinda do céu. Assim voltaria a acontecer ao longo do dia!

…e continua com chuva!

Debaixo de chuva mas bem protegidos, entrámos em Viana do Alentejo. Motos estacionadas no centro da vila, tréguas feitas com o S. Pedro (por enquanto…) e, como eram horas de repor energias, procurámos umas migas. Lá nos indicaram um sítio onde seriam boas. E digo seriam porque …não havia! Só no dia seguinte. Pois…

Lá almoçámos (quando a expectativa é elevada, o bom torna-se banal) que a hora ia adiantada e ainda faltava ver o principal.

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Rua típica de Viana do Alentejo

De Viana se diz que rivalidade regional a terá feito mudar da anterior designação, Viana a par d’Alvito ou Viana de Alvito, para a actual “do Alentejo” (certamente para a destacar de outra bem mais a norte). A razão de não terem preferido a ainda mais ancestral nomenclatura – Viana de Foxem (ou Fochem) – desconheço. E também não será relevante. Fiquemos com a mera referência histórica.

Tinha 3 pontos de referência em Viana do Alentejo: o Castelo com a Igreja Matriz no seu interior, o Santuário de Nossa Senhora d’Aires e a lenda de uma moira encantada e o Píncarinho de S. Vicente.

Começo por esta última.

Moiras encantadas e as suas lendas são inúmeras Alentejo fora. Reminiscências românticas – porque de amores desencontrados entre cristãos e mouros geralmente se tratam e com finais trágicos também amiúde – de muitos séculos de permanência mourisca no nosso território e das muitas lutas que no final lhe puseram termo. Contudo, desta não lobriguei história.

Fiquei de mãos a abanar e acabei por nem procurar o dito Píncarinho. É uma elevação relevante, 374 m no meio da planície, mas em dia cinzento e chuvoso … Apenas referir a curiosa expressão “píncarinho”, muito frequente no Alentejo (principalmente no Baixo, onde quase tudo merece este carinhoso sufixo diminutivo) quando se quer destacar um ponto de maior altitude.

A visita ao Castelo

A primeira curiosidade é o facto de esta fortaleza não ficar propriamente num alto – aqui ficaria apropriado utilizar novamente o termo “pincarinho”! – mas sim integrada em plena urbe. Lá se chega por rua estreita e quase conseguimos imaginar o carteiro a bater à porta para aí entregar uma carta. Certamente que o endereço terá nº de polícia e tudo…

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Entrada do Castelo

A fortaleza tem uma planta pentagonal, com 5 torreões cilíndricos e de telhado em bico a marcarem os 5 lados do polígono. No seu interior, um pequeno jardim, um pátio e duas igrejas: a Matriz de Nossa Senhora da Anunciação e a da Misericórdia.

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Castelo – Muralha e torreão

Diz-se sem certeza absoluta que a origem deste castelo estará no reinado de D. Dinis (1279-1325),sendo assim da mesma altura da outorga do primeiro foral da vila alentejana (1313). Alguns dados mais recentes poderão sugerir para uma construção mais tardia. Abrigou na sua disposição os primitivos Paços do Concelho, o primeiro cemitério da vila e a primitiva Igreja Matriz, consagrada a Santa Maria de Foxem.

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Castelo – pormenor do Jardim
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Castelo – Jardim, Torreão e Igreja Matriz

Sob o reinado de João II de Portugal (1481-1495), esta fortaleza foi remodelada, uma vez que o soberano, tendo reunido as Cortes em Évora a 12 de Novembro de 1481, depois as transferiu para Viana, onde vieram a encerrar-se a 7 de Abril de 1482.

Na ocasião, o soberano utilizou o Castelo de Viana como residência temporária. Fato semelhante repetiu-se em 1489, tendo a então Viana de Alvito sido escolhida como palco para as grandes festividades realizadas por ocasião das bodas de seu filho, o príncipe D. Afonso, com a infanta D. Isabel de Castela, em Janeiro e Fevereiro de 1491, para o que foram também promovidas remodelações na Igreja Matriz.

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Castelo – Pátio

Esses trabalhos prosseguiram no reinado de seu sucessor, D. Manuel I (1495-1521), com obras sob a direcção dos arquitectos Martim Lourenço, Diogo e Francisco de Arruda (o arquitecto da Torre de Belém). No castelo, destaca-se a construção de um novo pano de muralhas devidamente ameado.

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Castelo – Torreão

A Igreja Matriz de Nossa Senhora da Anunciação é preponderante neste conjunto pela sua matriz Manuelina, conjugando vários elementos de um gótico final e do Renascimento, despontando ainda numa clara influência mudéjar.

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Igreja Matriz
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Igreja Matriz

Na fachada principal encontramos um lindíssimo portal manuelino, exuberantemente decorado e com as divisas régias de D. Manuel: a cruz de Cristo, o escudo das quinas e as esferas armilares. Lindíssimo!

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Igreja Matriz – Portal manuelino

No interior majestoso, os fechos das abóbadas repetem as divisas do Rei. Subsistem no transepto dois belos vitrais quinhentistas representando São Pedro e São João Baptista. O altar da capela que é panteão de Vasco Godinho (m. 1525) é forrado com belos azulejos sevilhanos do séc. XVI.

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Igreja Matriz – interior
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Igreja Matriz – interior
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Igreja Matriz – interior.
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Igreja Matriz – interior
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Igreja Matriz – interior – pormenor do tecto

No recinto do castelo, um cruzeiro renascentista mostra duas comoventes figuras, uma Pietá e uma Virgem do Leite.

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Castelo – Cruzeiro renascentista
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Castelo – Cruzeiro – Pormenor

A Igreja da Misericórdia de Viana, também no estilo Manuelino, apresenta uma planta rectangular de dimensões mais recatadas, fruto de alterações arquitectónicas que o edifício sofreu ao longo do século XX. Tem um altar magnífico e a nave revestida de azulejos oriundos do século XVIII.

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Igreja da Misericórdia – Interior
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Igreja da Misericórdia – Altar

Sem dúvida que o Castelo de Viana merece uma visita. E se tiverem a mesma sorte que nós ainda melhor. O senhor do turismo local que estava na recepção, foi de uma simpatia extraordinária e brindou-nos com uma lição de História sobre aquilo que depois visitámos. E também conversámos sobre a vila e a vida. As conversas são como as cerejas (estamos quase no seu tempo) e é assim que se promove o Turismo e a riqueza da terra. Merece um aplauso!

Foi também ele que nos informou que o nosso terceiro ponto de destaque estava em fase de conclusão de obras: o Santuário de Nossa Senhora d’Aires. A sua reabertura já se terá realizado quando lerem este texto. Aprazado para 16 de Maio, veremos se os arruamentos e acessos ficam prontos, porque quanto ao edifício está terminado. E é magnífico. Imponente, destaca-se na paisagem e segundo nos foi referido, será o terceiro maior santuário mariano de Portugal (depois de Fátima e Lamego).

Santuário de Nossa Senhora d’Aires

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Santuario N S Aires

Pelo que refiro atrás, obviamente não foi possível visitar o seu interior. Ainda assim, fica o registo.

Aqui se venera a imagem em pedra de Ançã da antiga padroeira, Nossa Senhora da Piedade.

Essa imagem, em que Nossa Senhora está sentada com Jesus morto nos braços, é objecto de grande fé, pois segundo a tradição nunca deixou de socorrer os crentes, como o confirmam os inúmeros ex-votos expostos na Casa dos Milagres, uma colecção de arte popular única e singular que inclui objectos de diversas épocas como fotografias antigas, vestidos de noiva e tranças de cabelos.

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Santuário N S Aires

O santuário em estilo barroco foi construído entre 1743 e 1804, segundo o projecto do Padre João Baptista, no local onde existia uma anterior ermida quinhentista.

Na portada, uma inscrição em latim relata que após a expulsão dos mouros destas terras, um lavrador arava o campo quando encontrou dentro de um pote de barro a imagem que se vê no altar.

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Santuário N S Aires – Portada

O edifício tem uma planta de cruz latina, composta por uma única nave, com cobertura em abóbada de berço. No interior, destaca-se o altar de talha em estilo rococó.

Fazem parte do santuário também a fonte de Nossa Senhora d’Aires, situada no Terreiro dos Peregrinos e casas de romeiros.

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Fonte de N S Aires

Dois dos eventos mais emblemáticos de Viana do Alentejo estão relacionados com este local: a feira franca de Nossa Senhora D’Aires, que desde 1751 decorre no quarto fim-de-semana de Setembro; e a Romaria a Cavalo, que percorre os 120 kms da antiga canada real, entre a Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem, na Moita do Ribatejo, e este santuário, em Viana do Alentejo, que costuma realizar-se no quarto fim-de-semana de Abril. Por motivos dos tempos que correm, desde o início de 2020 que estão suspensas.

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Santuário N S Aires
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Santuário N S Aires – arranjos exteriores (em conclusão)
Finalmente…Oriola!

Desta terra disse José Saramago em “Viagens a Portugal” (1981):

“O viajante gosta de nomes, está no seu direito. Não tendo motivos para parar em Oriola, povoação no caminho de Viana do Alentejo, saboreou-lhe as sílabas italianíssimas ou geminalmente mais próximas da Orihuela valenciana.”

O viajante era, no texto, o próprio escritor, e a referência ainda que breve, ficou. Pouco simpática, qualidade que, julgo eu que o não conheci, também o caracterizava. Mas tinha razão. Oriola tem uma sonoridade que nos desperta.

Pequena terra que terá agora uns 200 habitantes, talvez, chegou a ter o triplo nos idos de 1800. Era então vila e sede de concelho, que o foi de 1282 e 1836. E é verdade que o seu nome derivará da palavra árabe que também está na raiz da Orihuela citada por Saramago.

O seu primeiro donatário foi João Moniz, clérigo e tesoureiro-mor do rei Afonso III, e o seu último, D. Luís Lobo da Silveira, 7º Barão de Alvito. No ano de 1282 recebeu foral dado por D. Dinis, e ampliado em 1516 por D. Manuel I.

Em 2006, Oriola recebeu a visita do primeiro-ministro da época (J. Sócrates) para comemorar o facto de a sua Escola Básica ter sido a última escola a receber banda-larga da Internet. Não sei se ser o último deve ser motivo de comemoração…mas seja como for, mais vale tarde que nunca!

O que hoje destaca verdadeiramente Oriola, para lá da sua traça genuinamente alentejana – casas térreas de branco caiado, ruas direitas, planas, perpendiculares e imaculadamente limpas – é a proximidade à barragem e albufeira de Albergaria dos Fusos (também chamada do Alvito…que fica mais longe!).

Quando seguimos na EN384 entre Viana do Alentejo e Portel, mais ou menos a meio caminho, cortamos à direita para Oriola. Uma pequena recta leva-nos à entrada e aí encaramos com um monumento ao 25 de Abril.

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Quase em Oriola

 

A escala é um pouco exagerada face à cércea dos edifícios da terra (acredito que esse sobre dimensionamento terá paralelo no sentimento da população, legítimo e justificado portanto) e hoje talvez um pouco kitsch, mas a simbologia está lá. E no final, é isso que interessa. A pomba branca com o cravo vermelho (único elemento cromático) assinala a entrada em Oriola.

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Oriola – Monumento ao 25 Abril

Logo de seguida podemos constatar que aqui se dá verdadeira importância aos detalhes…

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Oriola – a importância dos detalhes
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Oriola – Ruas brancas

Seguimos a direito, percorremos o casario e lá bem mais à frente uma placa indica-nos “barragem”. para o lado esquerdo.

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Oriola – A caminho da barragem

Viramos e uma centena de metros depois…a estrada afunda nas águas da albufeira da barragem. Logo ali!

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Oriola – Onde a estrada afunda

Essa estrada que ligava Oriola a Santana (e que curiosamente ainda hoje encontramos em mapas actuais e até no Google Maps) está completamente submersa. Como submersa também está uma ponte romana.

E aí parámos para umas fotos. Garanto-vos que a paisagem, o silêncio dos campos apenas quebrado pelo cantar dos pássaros ou o marulhar do ventos na superfície da água, tornam este local belíssimo e transmitem-nos calma. Muita calma!

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Oriola – Barragem de Albergaria dos Fusos
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Oriola – Uma Ducati na paisagem.
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Oriola – Uma Ducati na paisagem
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Oriola – Barragem – panorâmica
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Oriola – Panorâmica
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Oriola – Chegámos ao fim da estrada
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Oriola – Chegámos ao fim da estrada

E sim! Já conheço Oriola.

E a Oriola (e também a Viana) hei-de voltar em breve.

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Oriola: Até já….

No Verão…com sol e calor. Porque é a melhor forma de sentir o Alentejo. Se calhar, para muitos não será a mais agradável mas, para mim, é a mais genuína!

E a Ducati? Perguntam vocês…

A primeira impressão é notável: a Ducati Supersport 950 é muito bonita. Apesar de não ter o vermelho característico da marca, este branco pérola mate fica-lhe a matar! É linda, qualquer o ângulo em que para ela olhamos. Mas lá está….os gostos são subjectivos…

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Ducati Supersport 950

Dispenso-me de comentários mais técnicos que não têm aqui o seu lugar. Para saber tudo sobre a Ducati Supersport 950S, lerQuanto è bella questa machina!

Mas tinha muita curiosidade em perceber como se comportava uma moto do Século XXI, com todo o requinte de uma marca premium, a elegância do design italiano e um coração que herda o que de melhor a Ducati sabe fazer. Já agora, no final comparar com a memória da minha antiga CBR 600….mesma potência mas os cavalos eram de 1999!

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Ducati Supersport 950

A tendência actual – uns chamam-lhe moda… – é a de utilizarmos motos mais encorpadas, com um perfil a que o marketing chamou trail, para viagens. Postura mais direita, mais confortável e menos exigentes para outras partes da anatomia humana como sejam os pulsos (algo que me levou a optar por esta fórmula). A Supersport 950 é uma moto, neste domínio, à antiga. Será que funciona?

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Ducati Supersport 950

Direi que no final de quase 400 km de viagem, alguns deles debaixo de chuva e outros poucos no meio de engarrafamentos em Évora e Montemor (até já aqui há horas de ponta…), os meus pulsos já se queixavam. A postura, principalmente no meio do trânsito, castiga-os sobremaneira. Já em estrada livre…não há queixas! Nem os pulsos sofrem por aí além – mérito dos avanços serem em posição mais alta face à mesa de direcção – muito menos as costas que ficaram impecáveis nesse e nos dias seguintes.

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Ducati Supersport 950
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Ducati Supersport 950

Em andamento é o que se esperava. Temos máquina para andar e andar. E “chegamos lá” enquanto o diabo esfrega um olho. Uma única preocupação: os fotógrafos à la minuta que por estes tempos se dedicam ao passatempo do voyeurismo velocimétrico. As fotos não ficam nada de jeito, as carteiras mais aliviadas e o cartão de fidelização de condutor ganha rapidamente pontos adicionais.

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Ducati Supersport 950
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Ducati Supersport 950

Os diferentes modos de condução adequam-se às condições de utilização, as suspensões são magníficas – filtram as irregularidades do terreno de forma notável para o tipo de moto que é – e os travões devem ter sido extrapolados do TAV – Treno Alta Velocità (o TGV por paragens transalpinas).

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Ducati Supersport 950
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Ducati Supersport 950

Comparativamente à CBR 600? 22 anos depois até os 110 cavalos parecem diferentes (os antigos “respiravam” melhor, mas isso podemos agradecer aos Euros 5 e anteriores). Mas no resto…os 20 anos parecem 2 séculos.

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Ducati Supersport 950

Que vos posso dizer mais? A moto é linda!!!

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Ducati Supersport 950
Agradecimentos:

Em primeiro lugar, à Ducati pela cedência desta espectacular Supersport 950.

Em segundo lugar, a duas pessoas importantes para esta viagem ter acontecido:

  • a fiel seguidora que me lançou na intranquilidade de não conhecer Oriola;
  • ao meu Amigo Carlos que me acompanhou e tornou a viagem muito mais divertida!

(crónica também publicada na revista Andar de Moto #36 de Maio de 2021)

 

 

 

Por terras do Priorado do Crato

Os tempos não recomendam grandes aventuras. Estava perto. Fui até ao Crato. E, porque fica mesmo ao lado, a Flor da Rosa.

É território que me é familiar. Mas como se costuma dizer, “santos de casa não fazem milagres”!

Uma aventura à porta de casa

Para mim (e julgo que para muitos que foram aprendendo História na base do empinanço e das mnemónicas…) sempre associo Crato a D. António Prior do Crato. Juro que em miúdo julgava que era o nome do senhor… Mais tarde percebi que o Prior tinha a ver com o facto de ser eclesiástico. E era, mas de uma forma sui generis. E o Crato seria a terra onde foi padre…

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D. António Prior do Crato

Conhecendo o Crato, pequena vila nos confins do nordeste alentejano, sempre estranhei de onde viria tal notoriedade e como era possível ter tido notável protagonismo, em certos momento da nossa História.

Devo confessar que me relaciono com a História, como um informático diria, na “óptica do utilizador”. A ela recorro quando necessito e em ocasiões concretas. Esta é uma delas.

A História do Crato, de Flor da Rosa e da Ordem dos Hospitalários

Segundo parece, o Crato terá sido fundado há cerca de 2.500 anos pelos Cartagineses. A sua notoriedade é mais recente. Mas não muito…

Teria como designação inicial Castraleuca ou Castra-Leuca. No decorrer dos séculos, e por alterações sucessivas, passou a ser Ucrate ou Crate e, por fim, Crato.

Como sabemos, o início do segundo milénio, ficou marcado pela Reconquista Cristã da Península Ibérica. Os Mouros aqui chegaram por volta dos anos 700 e só daqui saíram quando o Séc. XVI estava prestes a começar, com a queda do reino de Granada.

O movimento de reconquista, vindo de norte (começou nas Astúrias) para sul, teve a ajuda de muitos nobres guerreiros da Europa e também a participação de Ordens Religiosas que se dedicavam a combater os Infiéis (as Cruzadas à Terra Santa são o maior exemplo).

Assim, cá chegou, entre outros, D. Henrique de Borgonha a quem pelos seus feitos foi oferecido o Condado Portucalense. E também vieram as Ordens dos Templários e dos Hospitalários.

Esta última, chamada Ordem de São João Baptista de Jerusalém foi fundada em 1093, nesta cidade, para socorro dos peregrinos que se dirigiam à Terra Santa. Também conhecida por Ordem Soberana Militar e Hospitalária de São João de Jerusalém, de Rodes e de Malta. Muito mais tarde, já no Séc. XVI passaria a ser designada apenas por Ordem de Malta (onde passou a estar sediada).

Entre 1122 a 1128, a Ordem estabeleceu-se no Condado Portucalense fixando a sua sede no antigo Mosteiro de Leça, situado nos arredores do Porto. A localidade converteu-se em cabeça do priorado da Ordem em Portugal.

Em 1194, D. Sancho I doou-lhes um vasto território na margem Norte do Tejo, com a obrigação de aí erguerem um castelo, que tomou o nome de Belver. Mais tarde, em 1232, D. Sancho II doou o Crato à Ordem do Hospital, concedendo-lhe o primeiro foral, sendo então Mem Gonçalves, Prior da Ordem.

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Crato – Placa comemorativa do 775º aniversário do Foral

Em 1340, D. Afonso IV transferiu a sede da Ordem para o Crato, onde se manteve até 1354. Nesta data, D. Álvaro Gonçalves Pereira, prior do Crato e pai de D. Nuno Álvares Pereira mandou construir o Mosteiro de Santa Maria de Flor da Rosa para instalação da sede da Ordem.

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Mosteiro de Flor da Rosa


Em 1439, a sede da Ordem regressou ao Crato, vulgarizando-se a designação de Priorado do Crato. Este possuiu 23 comendas e as seguintes 12 terras e seus termos: Amieira, Belver, Cardigos, Carvoeiro, Crato, Envendos, Gáfete, Oleiros, Pedrógão Pequeno, Proença-a-Nova, Sertã e Tolosa.

Ou seja, um vasto território que abraçava ambas as margens do Rio Tejo. A extensão de tais domínios marcava então a enorme importância desta Ordem. Recorde-se que imperava o regime feudal e portanto a Ordem recebia a sua parcela de tudo o que era aí produzido, bem como tinha o poder de mobilizar os homens disponíveis para combater e reforçarem os exércitos reais sempre que tal era necessário. O que acontecia com muita frequência.

Aqui nasceu, diz-se, D. Nuno Álvares Pereira

Referi atrás que o Mosteiro de Santa Maria situado em Flor da Rosa (a escassos 3km do Crato) foi mandado construir pelo pai de D. Nuno Álvares Pereira. E terá sido (embora não seja certo) que aqui nasceu o futuro Santo Condestável.

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Flor da Rosa – Estátua de D. Nuno Álvares Pereira

Como sabemos, D. Nuno, Condestável do Reino, foi o braço direito de D. João, Mestre de Avis, nas lutas dinásticas que garantiram a continuidade da independência de Portugal – vitorioso nas batalhas de Atoleiros, Aljubarrota e Valverde – e que deram início à segunda dinastia da realeza portuguesa. Tal era o seu engenho militar que os Espanhóis tinham verdadeiro pavor de o enfrentarem.

E se temos aqui a ligação ao início da Dinastia de Avis, aquela que representou até hoje o apogeu da presença de Portugal no mundo, é também aqui que vamos encontrar a ligação ao facto que representou o seu fim e, pior ainda, a perca da independência nacional.

D. António, Prior do Crato, Rei de Portugal

Encaminhava-mo-nos para o final do Séc XVI e Portugal tinha uma posição de domínio no mundo. Com os Descobrimentos, o domínio das rotas marítimas da Índia e o ainda inexplorado Brasil, éramos a potência dominante a par da Espanha (unificada à menos de 100 anos). Mas alguma decadência já se pressentia

Quando D. Sebastião ascende ao trono, para lá da sua juventude e impreparação, a imaturidade que o levava a sonhar com batalhas e conquistas heróicas, impele-o a uma improvisada incursão a terras de Marrocos. Seguiu-se Alcácer-Quibir (1578) e a sua morte, lançando Portugal para uma crise de sucessão, pois o Rei não deixava descendência. Sucedeu-lhe seu tio o Cardeal D. Henrique, que viria a morrer em 1580 em plenas Cortes de Almeirim onde iria ser coroado.

Agrava-se a questão sucessória. As principais alternativas eram Filipe II, soberano de Espanha, ou D. António, Prior do Crato, cargo que tinha herdado de seu pai.

D. António era filho bastardo de D. Luís de Portugal e neto do Rei D. Manuel I, pelo que a sua legitimidade à sucessão era discutível, o que reforçava a ambição do rei de Espanha.

Sendo aclamado Rei de Portugal pelo povo de Santarém, viria todavia a perder as sucessivas batalhas perante a maior força e poder do inimigo espanhol.

Assim, fica o Crato, na infeliz pessoa do seu Prior, ligado ao final da Dinastia de Avis e à perda da independência nacional.

No Crato

A vila é pequena. Terá cerca de 2 mil habitantes para um total de aproximadamente 3,5 mil no município. Dos seus tempos áureos resta pouco mas ainda assim relevante.

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Castelo do Crato – ao fundo a Serra de S. Mamede

O castelo medieval, tinha formato trapezoidal com as muralhas reforçadas por 5 torres nos ângulos, sendo a Norte a de menagem. Por sua vez, a cerca da vila, da qual subsistem alguns troços, era amparada por seis torres: do Sino, da Seda, de São Pedro, da Porta Nova, de Beringal e de Santarém.

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Castelo do Crato – Muralha

Em meados do século XVII, foi transformado num fortim abaluartado, com planta poligonal irregular no formato de uma estrela com quatro pontas.

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Castelo do Crato – Pormenor da muralha

Os séculos seguintes acentuaram o estado de ruína do conjunto, tanto das estruturas medievais como das modernas, desaparecendo a Casa do Governador (da qual subsistem algumas arcadas), a ponte levadiça, baluartes e outros, tendo chegado aos nossos dias apenas alguns trechos de muralha, uma guarita, a cisterna, duas torres arruinadas e algumas canhoneiras.

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Castelo do Crato – Muralha
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Crato – Pedaço da muralha

Encontrei toda a área do Castelo fechada. De fora é possível antever a construção de algo no seu interior…com pilares de betão. Não sei se poderemos ficar optimistas quanto à eventual recuperação do património….

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Castelo do Crato – Obras
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Castelo do Crato – Obras

A Igreja Matriz do Crato ou de Nossa Senhora da Conceição data do século XIII, embora com sucessivos acréscimos, subsistindo da época a estrutura imponente da torre sineira. Quanto ao estilo, denotam-se alguns traços góticos. Possui três naves e cinco tramos, separados por quatro pares de arcos ogivais e um arco de volta perfeita.

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Igreja de N. Senhora da Conceição

Na Praça do Município é possível ver o que resta do Palácio do Grão-Prior do Priorado do Crato: um janelão e a imponente varanda sustentada por arcos de volta perfeita.

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Crato – Varanda do Palácio do Grão Prior

Para lá dos Paços do Concelho e do Palácio Sá Nogueira encontramos o tradicional pelourinho onde era exercida a justiça. Outros tempos…

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Crato – Paços do Concelho
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Crato – Pelourinho e Palácio Sá Nogueira

Em tempos de maior liberdade, o Museu Municipal é um local de visita obrigatória para melhor conhecer os testemunhos desta tão longa história.

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Crato – Museu Municipal

Também ao percorrer as ruas da vila é possível encontrar em muitos edifícios e placas toponímicas, as cruzes da Ordem de Malta.

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Crato – placa toponímica com Cruz de Malta
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Crato – aqui as efemérides são multi-centenárias

Mais recentemente, o Crato tornou-se famoso junto da juventude portuguesa pelos seus Festivais de Verão que trazer enorme afluência de gente de fora e bastante notoriedade à vila, com os naturais benefícios para a sua população.

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Crato – Antiga Escola Primária
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Crato – Centro de Saúde
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Crato – Reminiscências industriais
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Crato – rua típica
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Crato – Jardim e imagem de N. Sª Conceição
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Crato – rua típica
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Crato – Filarmónica do Crato
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Crato – encontro de ruas
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Crato – Rua típica com edifícios seculares
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Crato – Arte urbana
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Crato – Arte urbana

Também as pequenas unidades de alojamento turístico, na zona urbana ou em meio rural são uma forma de trazer a quem procura estas terras uma aproximação às tradições e à cultura destas gentes.

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Crato – Turismo – Casa do Largo
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Crato -Turismo – Casa do Crato

Em Flor da Rosa

Obviamente que o grande destaque desta pequena povoação, até pela grandeza que o faz destacar do resto do casario, é o Mosteiro de Santa Maria, considerado o maior exemplo de mosteiro fortificado da Península Ibérica.

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Mosteiro de Flor da Rosa

Este mosteiro é composto por três edificações distintas: a igreja-fortaleza de estilo gótico, um paço-acastelado gótico, já com alterações quinhentistas, e as restantes dependências conventuais com traça renascentista e mudéjar.

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Mosteiro de Flor da Rosa

O conjunto sofreu alterações ao longo dos séculos, nomeadamente nos século XVI e XVII. No tempo do Rei D. Manuel I o espaço monástico é alargado para um maior número de aposentos, transformando-o num Paço Real.

O grande terramoto de 1755 e um temporal devastador em 1897 afectaram toda a estrutura e levaram-na muito perto da ruína.

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Mosteiro de Flor da Rosa – Claustros
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Mosteiro de Flor da Rosa – Pormenor
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Mosteiro de Flor da Rosa – Claustros
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Mosteiro de Flor da Rosa – Pormenor das abóbodas
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Mosteiro de Flor da Rosa – Túmulo de D. Álvaro Gonçalves Pereira (pai de D. Nuno Álvares Pereira e fundador do Mosteiro)

Mais tarde, jé em 1940 começaram as tentativas de restauro que foram retomadas em 1991 com a planeada transformação em Pousada de Portugal.

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Mosteiro de Flor da Rosa – pormenor da renovação

Apesar da polémica inicial, veio a revelar-se uma notável recuperação em que a simbiose entre o antigo e o moderno casam na perfeição. Com a vantagem de poder dispôr na sua função turística de todas as valências necessárias e simultâneamente ter sido possível preservar a essência do edificado monumental. Merece assim aplauso a obra do Arq. Carrilho da Graça.

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Mosteiro de Flor da Rosa – pormenor da renovação
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Mosteiro de Flor da Rosa – pormenor da renovação

Não há terra em Portugal que não tenha para si, uma lenda que justifique o seu nome. Flor da Rosa não é excepção.

Vem de tempos muitos antigos e ali existiria um pequeno lugarejo onde vivia um fidalgo cavaleiro de mui ilustre nome e bem amado por toda a gente. Certo dia, o cavaleiro adoeceu gravemente. Poucos dias de vida teria segundo os médicos que o acompanharam.

Os seus amigos visitivam-no amiúde. E também a sua noiva de nome Rosa. Certo dia, numa dessas visitas, Rosa levou-lhe uma flor. Perante a estupefação de todos, e quando era esperada a morte do fidalgo, eis que quem morre é Rosa.

Desde então, todos os dias era possível ver o cavaleiro chorar o seu amor perdido junto do túmulo de Rosa. Até que certo dia, ele próprio acabou por morrer de desgosto.

Antes de morrer, o fidalgo cavaleiro fez dois últimos pedidos: que a flor que Rosa lhe oferecera o acompanhasse à sepultura e o nome de Flor da Rosa fosse dado aquele lugar. E assim foi!

Outro edifício que se destaca, não pela sua antiguidade pois tem pouco mais de 100 anos, é a Igreja Paroquial dedicada a Nossa Senhora das Neves. Também ligada à sua construção há uma lenda.

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Flor da Rosa – Igreja de Nº Sª das Neves

Parece que certa tarde, os pedreiros que iam trabalhar na construção deixaram as ferramentas no local onde se pretendia fazê-la. As mesmas desapareceram e vieram a ser encontradas noutro local…aquele onde a igreja acabou mesmo por ser construída.

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Flor da Rosa – Igreja de Nº Sª das Neves

Esta pequena aldeia em tamanho, mas grande em costumes e saberes é também conhecida como a terra dos oleiros, pela grande tradição que aqui existe de trabalhar o barro de forma singular.

Existe actualmente uma escola de olaria, que faz com que esta tradição se mantenha viva, apesar de ainda existirem dois oleiros que trabalham e vendem as peças em barro por conta própria.

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Turismo – Palácio de Flor da Rosa
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Flor da Rosa – casario típico

Como chegar ao Crato e a Flor da Rosa

Para quem venha de sul ou genericamente da margem sul do Tejo, as estradas não são particularmente interessantes. Tipicamente estradas alentejanas, pouco sinuosas. A não ser que nos queiramos aventurar pelas muitas estradas municipais, estreitas e nem sempre nas melhores condições.

Já para quem venha de norte a coisa muda de figura. A EN18 entre Vila Velha de Ródão e Nisa é um pedaço de diversão com 18 km e um bonito enquadramento paisagístico. De Nisa ao Crato é um pulinho.

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Crato – o que vemos à chegada
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Crato – Panorâmica

De qualquer forma, para uns e outros, a Serra de S. Mamede e o triângulo Portalegre, Marvão e Castelo de Vide estão à mão de semear. Ou melhor dizendo, à distância de um breve enrolar de punho. E aí…há estradas retorcidas para todos os gostos!

E termino com uma sugestão: porque não um brinde ao encontro do passado com o presente, olhando para o futuro?

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Um brinde!
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Mosteiro de Flor da Rosa

(texto publicado na edição de Abril/2021 da revista Andar de Moto)

Uma viagem às arrecuas do tempo

As histórias que vou contar situam-se em pouco espaço. Para lá chegar todavia, foi necessário atravessar Portugal e quase chegar a Espanha. 

O dia estava quente, muito quente e não recomendava grandes saídas. Até porque na véspera, a viagem tinha sido longa – mais de 400km a subir o Tejo saltitando de margem em margem pelas suas 13 pontes e 2 barragens – e, acima de tudo, com uma canícula extrema, acima dos 40º na maior parte do trajecto. 

Assim, até sabia bem que a volta deste novo dia não obrigasse a grande deslocação.

Resumo da volta
“Resumo” da volta

Comecei por Castelo de Vide

Há quem lhe chame a “Provença do Alentejo” e dizem que El-Rei D. Pedro V, um apaixonado pela terra, a terá baptizado de “Sintra do Alentejo”. 

Compreendo que por vezes, para tentar transmitir uma ideia, se faça por semelhança. Mas é preciso perceber que a cópia nunca é melhor que o original. E ao fazê-lo está-se a subalternizar algo que tem o potencial de valer por si só. Castelo de Vide tem esse valor, sem qualquer sombra de dúvida. 

Antes de entrar na vila, virei à direita e subi ao Monte da Penha. Onde está a Capela de Nossa Senhora da Penha e uma vista deslumbrante para o casario.

Chegada ao Monte da Penha
Chegada ao Monte da Penha
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Escadaria para a Capela de N.S.Penha
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Capela de Nossa Senhora da Penha

Destacam-se lá em baixo, o Castelo, a grandiosa Igreja Matriz de Nossa Senhora da Devesa e o casario alvo, típico do Alentejo.

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Vista panorâmica de Castelo de Vide

Para os apaixonados da Geologia (não é o meu caso…) também este local é bastante interessante pelas formações geológicas possíveis de observar na encosta.

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Encosta do Monte da Penha – Formações geológicas

Voltei pelo mesmo caminho. Cá mais abaixo quase a entrar na vila, junto à Fonte da Mealhada, vê-se melhor o Castelo.

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Fonte da Mealhada

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Castelo

Reza a lenda que “quem bebe da água da Fonte da Mealhada há de voltar a Castelo de Vide para casar”. Fica a nota….

 O castelo data do Séc. XIII, erguido por ordem de Dom Dinis só viria a ser concluído no reinado do seu filho Dom Afonso IV.

 Subi ao centro da vila. Parei na Praça D. Pedro V. Amplo espaço dominado pela presença da Igreja de Nossa Senhora da Devesa.

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Praça D. Pedro V

 

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Igreja Matriz de Nossa Senhora da Devesa

Contornei a Praça e a Igreja. Por trás, na Rua de Bartolomeu Alves da Santa é possível ver o edifício da Câmara Municipal e também algumas esplanadas. Por um pequeno túnel é possível voltar à Praça D. Pedro V.

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Câmara Municipal de Castelo de Vide

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Para regressar à Praça D. Pedro V

Um pouco mais à frente, o Largo de Gonçalo Eanes de Abreu com cuidado jardim de um lado e mais uma das numerosas fontes de Castelo de Vide, do outro. Ao fundo, lá em cima, a Capela de Nossa Senhora da Penha.

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Largo de Gonçalo Eanes de Abreu
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Largo de Gonçalo Eanes de Abreu – Jardim
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Largo de Gonçalo Eanes de Abreu – Fonte

Este largo tem a sua toponímia ligada a este herói da terra, que participou, com bravura, na batalha de Aljubarrota, onde integrou a Ala dos Namorados que reunia os mais jovens do exército e onde se encontrava vários homens de confiança do então jovem líder militar, Dom Nuno Álvares Pereira. 

E se esta foi a batalha fundamental que assegurou a independência de Portugal contra o poderoso exército de Castela, a batalha de Valverde (Perto de Badajoz – Valverde de Mérida) veio mais tarde a consolidar a anterior vitória. 

Aí, o valente Gonçalo Eanes de Abreu lidera uma ala militar contra um exército bem mais numeroso e em condições desfavoráveis. Em plena batalha têm que atravessar um rio e conquistar a margem repleta de adversários. Entre os derrotados, figuravam personagens notórias da elite militar de Castela como os notáveis mestres das Ordens de Santiago de Castela (Pedro Muñiz de Godoy que foi decapitado no duelo) e de Calatrava, Gonzalo Núñez de Guzmán que foge quando se torna óbvio que o conflito contra os homens de Dom Nuno está, outra vez, perdido. 

Décadas depois, Dom Nuno Álvares Pereira, viúvo e após o falecimento da filha, opta por viver uma vida monástica (refugiando-se no Mosteiro de Flor da Rosa, perto do Crato e não muito longe donde estamos). Distribui a riqueza que acumulou pelos seus feitos heróicos, pelos netos e algumas entidades religiosas e aos leais irmãos de armas – a Gonçalo Eanes de Abreu oferece Alter do Chão e respectivo Castelo. 

Deste largo e da rua de onde viemos saem diversas das ruas típicas de Castelo de Vide: estreitas, íngremes, em empedrado por vezes irregular, com as suas casas brancas.

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Rua típica

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Rua típica
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Rua típica

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Rua típica
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Rua típica
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Rua típica
Castelo de Vide – a herança judaica

Outro dos aspectos que lhe dá notoriedade é o passado ligado aos Judeus. A sua Judiaria excelentemente conservada, nas ruas da encosta do Castelo é testemunha desse passado. E o que se conta também é interessante.

Da bonita Fonte da Vila saem as ruas que levam até ao Castelo e onde se situa a Sinagoga mais antiga de Portugal.

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Fonte da Vila

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Judiaria

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Judiaria

Em 1492, os Reis Católicos de Espanha, por força do Decreto de Alhambra, expulsaram os Judeus do território espanhol. Muitos, até pela proximidade à fronteira, vieram refugiar-se em Castelo de Vide.

Talvez por isso, porque os seus pais aqui procuraram refúgio, nasceu em Castelo de Vide em 1501, Garcia de Orta, médico português que viveu grande parte da sua vida na Índia e foi um autor pioneiro sobre botânica, farmacologia, medicina tropical e antropologia

 Frequentou as universidades de Salamanca e Alcalá, onde estudou gramática, artes e filosofia natural, provavelmente a partir de 1515, tendo-se licenciado em medicina em 1523. Regressou a Castelo de Vide em 1523, dois anos após a morte do pai, onde praticou clínica.

 Em 1526 obteve licença para praticar medicina e no mesmo ano mudou-se para Lisboa. Aí tornou-se médico de D. João III e conheceu o grande matemático Pedro Nunes. Foi escolhido para dar conferências de filosofia natural na Universidade de Lisboa, e em 1533 foi eleito pelo conselho para professor da cadeira.

 No ano seguinte, embarcou para a Índia, a 12 de Março de 1534, como médico pessoal de Martim Afonso de Sousa, que foi para o Oriente como capitão-mor do mar da Índia entre 1534 e 1538 e governador de 1542 a 1545. Depois de acompanhar o seu patrono durante os quatro anos em que este granjeou grande prestígio em várias campanhas militares na costa ocidental da Índia, Orta estabeleceu-se como médico em Goa, onde adquiriu grande reputação. Aí ganhou a amizade de Luís de Camões.

Graças ao seu serviço e amizade com o vice-rei Pedro Mascarenhas, cerca de 1554 foi-lhe dado o foro da ilha de Bombaim, então sob domínio português. Em Bombaim mandou construir uma quinta ou solar no local onde depois os britânicos erigiram o Forte de Bombaim (actualmente também chamado Castelo e Casa de Orta).

 Mas a história dos Judeus, em Portugal e em Castelo de Vide em Portugal tem mais que se lhe diga e ainda anterior ao nascimento de Garcia de Orta.

 No fim do século XV, o Rei Dom Manuel I pretende-se casar com a Princesa das Astúrias, Dona Isabel de Aragão e Castela.

 Não se trata de amor, mas de gerar um herdeiro legítimo. Estratégia política pura: Os Reis Católicos (Isabel de Castela e Fernando de Aragão) que pelo seu casamento já tinham unificado a maior parte do território da Península tinham aspirações a anexar o que faltava. Incluindo o reino situado a ocidente e que na altura dominava os mares, vastos territórios além mar e, principalmente, o poderoso comércio com o Oriente. Assim, esse casamento seria a forma mais linear de evitar essa anexação. Porque se no futuro viesse a acontecer…seria com um varão português! (Inteligente, D. Manuel…)

 Todavia, como vimos atrás, os Judeus tinham sido liminarmente expulsos de Castela. E era condição inegociável para o casamento que D. Manuel ambicionava, que também o fizesse em Portugal

 Dom Manuel acredita que a união é vital para a sobrevivência do reino e concede a fazer desaparecer os judeus de Portugal… Após o casamento promulga várias medidas que torna impraticável a saída voluntária ou a expulsão dos judeus – o plano é convertê-los ao cristianismo — cristão novo (cripto-judeus). D. Manuel tinha consciência da importância desta comunidade e até por força da tradição ancestral: o fundador do reino, Dom Afonso Henriques confiava a gestão das finanças a um rabi; tradição seguida por todos da sua linhagem…

 As conversões foram uma tortura psicológica, muitas vezes física, e em casos extremos culminam em mortes – uma traição aos judeus portugueses.

 Todo o processo, macabro, foi em vão: a jovem rainha morre no parto de Miguel da Paz (herdeiro de Portugal, Castela, Leão, Aragão e Sicília) e este morrerá com 2 anos (quando se encontrava com os avós; os reis católicos de Espanha). Inevitavelmente, no fim do século XVI, Espanha e Portugal entrarão em rota de colisão.

 Como “cristãos novos” os judeus são livres para saírem, e que foi o que aconteceu com os portugueses que foram para Amesterdão e cujos descendentes assistem à anexação de Portugal pela coroa espanhola (União Ibérica). A maioria dos judeus não tinha meios para sair e cá ficaram como “cristãos novos”. Em Castelo de Vide…

 Sabemos da História, a importância que os Judeus vieram a ter, mais tarde, nos Países Baixos e no domínio que estes partilharam dos mares e das riquezas com os Ingleses. Nas terras que os Portugueses descobriram e nos caminhos por nós abertos.

Para lá de Gonçalo Eanes de Abreu ou Garcia de Orta, Castelo de Vide também viu nascer outros filhos ilustres, como sejam:

  • José Xavier Mouzinho da Silveira (Castelo de Vide, 12 de Julho de 1780 – Lisboa, 4 de Abril de 1849) foi um estadista, jurisconsulto e político português e uma das personalidades maiores da revolução liberal 
  • Fernando José Salgueiro Maia, militar português. O mais conhecido dos capitães do Exército Português que liderou as forças durante a Revolução de 25 de Abril de 1974.
A caminho do próximo destino

Deixei para trás Castelo de Vide. Terra histórica como vimos, com muito mais que contar e acima de tudo com uma beleza que nos leva sempre a voltar. Não necessariamente para casar, como reza a tradição da Fonte da Mealhada.

Dirigi-me a Marvão. Pela estrada (EN246-1) que tem um pedaço que será dos mais famosos (e fotografados) de Portugal. Dizem os locais que “é a estrada onde as árvores estão de cuecas”.

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“onde as árvores estão de cuecas”

A mim, todavia faz-me recordar muitas das estradas do Alentejo que conheci na minha meninice. Eram assim: estreitas, sem bermas, com as árvores (azinheiras, sobreiros, oliveiras) mesmo à beirinha, inevitavelmente com as pinturas brancas à cintura. Uma tentativa, inúmeras vezes infrutífera, de evitar os acidentes….

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“onde as árvores estão de cuecas”

À medida que me aproximo de Marvão, começamos a vislumbrar a majestosa escarpa da Serra do Sapoio culminada pela vila fortificada de Marvão a quase 900m de altitude.

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Marvão…lá em cima

 Sempre que aqui venho questiono-me sobre o grau de loucura que alguém terá tido para construir um castelo naquele sítio. E o esforço que terá sido fazê-lo, na época em que foi. Nem hoje seria tarefa fácil…. 

Na Mui Nobre e Sempre Leal Vila de Marvão

Foi a Rainha D. Maria II que outorgou à vila de Marvão este título. Mas a história vem de muito atrás…muitos séculos antes!

 A presença romana na zona é testemunhada pelo local que visitarei depois: a cidade de Ammaia. E estes rochedos terão feito parte das defesas dessa importante cidade à época.

 Todavia, a importância de Marvão reforça-se enquanto praça fortificada os tempos do domínio árabe na Península Ibérica (desde o Séc. VIII).

 Abd al-Rahman ibn Muhammad ibn Marwan ibn Yunus, conhecido como ibne Maruane Aliliqui (Ibn Marwan al-Yil’liqui) ou simplesmente ibne Maruane, foi um líder militar e religioso sufista do Al Andalus que, rebelando-se contra o emir omíada de Córdova Maomé I, criou um reino independente sediado em Badajoz, cidade da qual é considerado fundador, que ocupava o Médio e Baixo Guadiana e o sul do que é hoje Portugal.

 O reino duraria até à fundação do Califado de Córdova em 928.

 Ibne Maruane deu nome à vila de Marvão (Marvão pela aliteração do seu nome Maruane), cujo castelo construiu entre 876 e 877 e qe no século X já era conhecida como Amaia de ibne Maruane ou fortaleza da Amaia, referida pelo historiador hispano-muçulmano Issa Ibne Amade Razi.

 Na época da conquista de Alcácer do Sal, D. Afonso Henriques terá tomado a povoação aos mouros entre 1160 e 1166. Perdida novamente para os mouros numa contra-ofensiva de Iacube Almançor em 1190, aquando da demarcação do termo de Castelo Branco (1214), Marvão já se incluía em terras portuguesas novamente.

D. Sancho II concedeu-lhe Carta de Foral (1226), visando manter esta sentinela avançada do território povoada e defendida diante das repetidas incursões oriundas de Castela à época.

D. Afonso III doou os domínios de Marvão aos cavaleiros da Ordem de Malta (1271), posteriormente outorgados a seu filho, Afonso Sanches, juntamente com os senhorios de Arronches, Castelo de Vide e Portalegre. Por esta razão, ao se iniciar o reinado de D. Dinis , a vila e o seu castelo viram-se envolvidos na disputa entre o soberano e o infante D. Afonso, vindo a ser conquistados pelas forças do soberano em 1299. No encerramento da questão, os domínios de Marvão, Portalegre e Arronches foram trocados pelos de Sintra e de Ourém, permanecendo os primeiros na posse do soberano. Este confirmou a Marvão o foral de 1226 e empreendeu-lhe obras de ampliação e reforço das defesas, destacando-se a construção da torre de menagem, iniciada no ano de 1300.

No decurso dos séculos seguintes, Marvão teve papel importante na generalidade dos conflitos, seja com os vizinhos espanhóis, na época das invasões napoleónicas ou na guerra civil que opôs liberais e absolutistas. A este facto não é alheia a sua situação estratégica bem como o ser quase inexpugnável, seja pelas características do terreno seja pela visibilidade que alcança fazendo com que seja praticamente impossível um ataque de surpresa.

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…até onde a vista alcança

 

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Onde conseguimos ver as águias de costas

 Entro em Marvão. É impossível fugirmos à imponência do Castelo. Situado numa ponta da muralha que rodeia a vila e que está aos seus pés.

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Entrada em Marvão – Porta de Ródão

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Castelo de Marvão

 

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Castelo – Peça de artilharia

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Pormenor do Castelo

 

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Castelo

A pequena vila está toda ela dentro das muralhas. Ruas estreitas, por vezes íngremes, de calçada irregular, irrepreensivelmente conservadas. Bem como todo o casario.

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Marvão

 

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Marvão
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Marvão – Fonte do Concelho

 

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Marvão

 Um pequeno jardim encostado à muralha dá o contraste com a rudeza da pedra da muralha que segue o contorno da falésia.

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Marvão – Jardim

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Marvão – Muralha e Jardim

 

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Muralha

Logo adiante, a Igreja de Santa Maria. Retirada do culto integra actualmente o Museu Municipal. Todavia existem referências à paróquia de Santa Maria desde 1321, altura em que foi entregue à Ordem do Hospital, liderada pelo Priorado do Crato nesta região alentejana.

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Igreja de Santa Maria

Continuamos a percorrer a muralha. Ruas estreitas. E ameias onde o horizonte espreita. Mais à frente outra igreja: a de Santiago. Esta era a outra paróquia de Marvão na época do Priorado do Crato. Mais tarde, fundiram-se na actual paróquia de Santa Maria sendo a Igreja de Santiago a Matriz.

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Igreja de Santiago

 Continuei o périplo pela vila de Marvão. Agora já a caminho da saída.

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Ruas de Marvão

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Ruas de Marvão

 

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À saída

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Porta de Ródão

Foi José Saramago que disse, no seu livro “Viagem a Portugal”, que ” de Marvão vê-se a terra toda” tal não é a magnificência da vista, lá de cima do alto das suas muralhas.

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“De Marvão vê-se a terra toda”

 Fora das muralhas, fica o Convento de Nossa Senhora da Estrela.

Em 1445, pela bula “Fidelium vota“, do papa Nicolau V, de 7 de Junho, a pedido do infante D. Henrique, foi concedida autorização para a fundação do Convento. Foi edificado fora dos muros da vila de Marvão, próximo do local onde, segundo a piedade popular, a Virgem tinha aparecido e feito alguns milagres, recebendo, por isso, uma invocação mariana.

De acordo com outra lenda local, a imagem de Nossa Senhora foi oculta por D. Rodrigo, último rei dos visigodos, quando da invasão muçulmana da península Ibérica (711), sendo descoberta apenas quando a vila de Marvão foi libertada do domínio islâmico, à época da Reconquista. Dai a origem da devoção a Nossa Senhora.

De Marvão desce-se pelo mesmo caminho da chegada. Estrada sinuosa e íngreme que nos leva até à Portagem. Pequena povoação atravessada pelo Rio Sever e intersecção de estradas.

Desde a que nos trouxe de Marvão, à esquerda em direcção a Espanha (onde a uma dúzia de quilómetros, depois da fronteira, podemos atestar a viatura com o precioso líquido que a faz trabalhar a um preço substancialmente mais barato. Nome do fornecedor?….GALP, pois claro!). Se por outro lado apontarmos a poente, regressamos a Castelo de Vide.

Seguimos em frente e vislumbramos o maciço da Serra de S. Mamede. Parque natural e a mais alta elevação a sul do Tejo. 3 km adiante, estamos em S. Salvador da Aramenha. É aí que se situa o próximo destino.

A cidade romana (quase) esquecida!

Ammaia – fundada no início da Cristandade, provavelmente no Séc I (contemporânea portanto da Ponte de Trajano em Chaves), no tempo de Augusto.

Foi elevada a Civitas por volta do ano 44/45 d.C. durante o reinado de Cláudio. A florescente cidade em breve receberia o estatuto de município (Mvnicipivm – “terminus ante quem“) sob o reinado de Lúcio Vero – mais provavelmente durante a época de Vespasiano -, e viria a desenvolver-se como um importante núcleo urbano devido à sua localização e à exploração dos recursos minerais e naturais da região, como o quartzo e o ouro.

Um outro factor determinante terá sido a sua localização num ponto de cruzamento de vias romanas que uniam importantes núcleos urbanos na altura, ligando uma dessas vias a de “Ammaia” à capital da província, “Emerita Augusta” (atual Mérida).

Durante o século IV, houve uma reconstrução e restauração dos espaços de Ammaia. No entanto, entre os séculos V e IX, Ammaia caiu em declínio e ficou despovoada. Quando esta parte da península ibérica já estava sob o domínio árabe, a cidade parece ter sido completamente abandonado em favor da fortificação de Marvão. Ibne Maruane (cujo nome terá originado o de Marvão, como vimos atrás), começou a usar o título de estilo próprio de capitão de Ammaia e suas ruínas no século IX.

Ammaia era uma cidade importante com cerca de 2.000 habitantes. Ocupava uma área de 21 hectares e tinha uma planta regular de ruas paralelas e perpendiculares que dividia os muitos quarteirões. Era rodeada de uma muralha granítica com cerca de 7m de altura.

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                Ammaia

Nas redondezas abundava a água. Isso permitiu a construção de uma barragem, de um aqueduto e de um complexo sistema de canalização que alimentava a cidade de água potável durante todo o ano.

Tinha 4 portas principais, orientadas segundo os pontos cardeais.

A mais importante, a única que é possível vislumbrar actualmente (num dos três pólos arqueológicos visíveis) era a Porta Sul.

A esta porta, com duas torres circulares e um pátio interior, chegava a importante estrada proveniente da capital da província: Emérita Augusta – a actual Mérida.

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Ammaia – Porta Sul

 

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Ammaia – Porta Sul

 

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Ammaia – Porta Sul

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Ammaia – Porta Sul

 Sendo a porta principal, era daí que saía a principal rua da Ammaia: o Cardo Maximus.

Uma via comercial, rodeada de lojas e edifícios com pórticos. A meio (o que seria também o centro da cidade) ficava a entrada para o mais relevante núcleo de edifícios da cidade: o Fórum! Este é o segundo pólo arqueológico visível.

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Forum

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Forum
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Forum
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Forum
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Forum

No seu interior, um grande largo, rodeado de pórticos e lojas, com pavimento granítico e onde se situava o mais importante templo de Ammaia: um edifício rodeado de colunas, com um imponente pórtico, provavelmente dedicado a Júpiter ou eventualmente ao próprio Imperador. Existem vestígios desta edificação no sub-solo.

 No outro lado da praça, ficava outro edifício relevante: a Basílica. Aí se situava o Tribunal e seria também utilizado para reuniões políticas ou comerciais.

 Saindo do Fórum, do outro lado da rua, ficavam as Termas. Um conjunto de diversas salas com vestiários e banhos de diferentes temperaturas, quentes e frias. Teria também uma piscina e uma área de repouso no exterior. Este é o terceiro pólo arqueológico que está visível.

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Termas

 

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Termas
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Termas

Conseguimos ter um vislumbre da dimensão da cidade pelas distâncias que percorremos entre os 3 pólos arqueológicos. Mas mais relevante é percebermos como há 2 mil anos, uma civilização fortíssima colonizou este território deixando marcas indeléveis…e não me refiro a estes conjuntos de pedras que restaram dos edifícios que não resistiram ao tempo e aos homens. Falo da língua que nos deixaram, da cultura e de uma organização social, económica e política que é difícil imaginar decorridos 20 séculos.

 No final da visita, é recomendável passar pelo núcleo museológico que tem um relevante acervo de peças, naturalmente da época romana.

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Museu Ammaia
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Museu Ammaia

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Museu Ammaia

 

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Museu Ammaia

 

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Museu Ammaia

 

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Museu Ammaia

 

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Museu Ammaia

 

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Museu Ammaia

Uma curiosidade final sobre Ammaia: apesar de se saber da sua existência, durante séculos não se conhecia a localização. Porque muitas das suas pedras foram utilizadas na construção de diferentes edifícios nas redondezas. Diz-se que muitas serviram para a edificação dos conventos de Portalegre, sendo que à época, era apelidada de “Pedreira dos Padres”. Há também registo de um arco em pedra ter sido levado para Castelo de Vide. Mais recentemente, no Séc. XX a construção da estrada (que nos trouxe até aqui) e que se prolonga rumo à Serra de S. Mamede destruiu uma parte significativa da zona pois corta o perímetro da cidade quase a meio. 

Uma viagem às arrecuas do tempo

O título desta crónica deve-se a um facto que não sei se repararam: à medida que avançava a viagem recuava o tempo.

 Falámos de Garcia de Orta e da história dos Judeus em Castelo de Vide (Séculos XV e XVI).

 Visitámos Marvão e a fortaleza quase inexpugnável a tocar o céu. Contámos a sua história na época do domínio muçulmano e subsequente conquista no início da nacionalidade.

 Finalmente, recuámos ainda mais no tempo, ao inicio da contagem do tempo, ao Séc I e à passagem do Império Romano nesta parte do território.

 Por falar em andar para trás no tempo, a minha companheira de viagem também merece uma palavra neste domínio: a Suzuki Katana, gentilmente cedida pelo representante português da marca, a Moteo Portugal SA.

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Esta “nova” Katana, para lá de ser muito bonita, mostra à evidência o seu património genético: recorda sem sombra de dúvida a “moto mais rápida do mundo” como nos anos 80 foi apresentado o modelo que iniciou a nomenclatura. E aqui, mais um ir para trás, à procura do tempo passado.

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A marca e o símbolo…

Esta não será a moto ideal para estas viagens porque não tem capacidade de carga…e será quase pecado mortal adaptar-lhe sistemas de malas. Francamente…ela não merece que lhe estraguem a beleza das linhas. E digo isto porque ao natural é muito mais bonita do que as fotos mostram. Opinião subjectiva, eu sei!

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Ponte de Belver

A posição de condução poderia ser incómoda mas não. O encaixe é perfeito, muito ajudado pela posição elevada do guiador que transmite confiança e naturalidade na postura. A protecção aerodinâmica é suficiente para as velocidades praticadas. O pequeno deflector por cima da óptica cumpre a sua missão. A velocidades para lá dos máximos legais (em autoestrada, por exemplo)…não há milagres.

VVEz015O principal defeito que lhe encontrei foi a autonomia. Não porque seja esbanjadora do líquido precioso (a média da minha experiência, cerca de 700km, foi de 5,1l/100) nada disso, mas sim porque o depósito é pequeno. 12 litros dizem, mas o máximo que lhe consegui meter foram 10l e tinha autonomia para 20 km nessa ocasião. Torna-se incómodo estar a fazer paragens para reabastecimento e é aconselhável planear o percurso para não haver azar.

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Em andamento? Talvez pelo seu comprimento ou pela diferença de largura dos pneus (atrás um ambicioso 195) a inserção nas curvas não será a mais linear mas, com o hábito, não constituiu qualquer problema. Agora à saída…meus amigos!!! Os 150cv, um pneumático daqueles e um motor com binário que nunca mais acaba é absolutamente fantástico. O 4 cilindros sobe desde as 3000rpm sem qualquer hesitação até quase ao infinito, sendo que o infinito – o red line – está nas 11500! Nas mudanças superiores provoca aquela adrenalina que gostamos. E nas mudanças baixas, saímos das curvas que nem um foguete…e com uma banda sonora a sair do escape a condizer.

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Não tenho dúvidas em afirmar que esta Suzuki Katana ficava muito bem na minha garagem…assim fosse possível!

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A Katana e o Castelo de Almourol 

Em conclusão: seja pela viagem em que andámos para trás no tempo, seja pela companhia da Suzuki Katana que recorda com alguma nostalgia a mítica Katana dos anos 80 do século passado, andámos às arrecuas do tempo em mais uma Viagem ao Virar da Esquina.

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Suzuki Katana

A Royal Enfield a caminho das planuras alentejanas

Para uma travessia da planície alentejana em época de canícula nada como uma calma e carismática Royal Enfield Himalayan.

De Lisboa a Alcácer do Sal

A companhia desta viagem foi uma Royal Enfield Himalayan na sua versão Adventure, gentilmente cedida pelo representante nacional.

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Saido manhã cedo rumo a sul, a primeira paragem foi em Alcácer do Sal, local propositadamente escolhido para o cafézinho matinal. A marginal que bordeja o Rio Sado e com vista privilegiada para a ponte metálica que o atravessa, está hoje ocupada por diversas esplanadas que o sol ilumina e aquece.

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Distante pouco mais de 90 quilómetros de Lisboa, é a porta de entrada no Alentejo e o local onde a estrada, que no limite nos transporta até ao Algarve, definitivamente assume o rumo a Sul.

Conhecer Alcácer do Sal – um pouco de História

Cheguei lá cerca de uma hora depois. Muito menos tempo do que demorou a conquista definitiva deste território aos Mouros, depois de Lisboa ter caído às mãos de D. Afonso Henriques em 1147. A primeira conquista ocorreu em 1158, mas não foi definitiva. Só bastante mais tarde, em 1217, Alcácer do Sal ficou na posse dos cristãos. 70 anos depois. Eram outros tempos mas a dificuldade denota também a importância estratégica de Alcácer.

Tendo sido fundada antes de 1.000 a.C. (existem vestígios de presença pré-histórica nas suas imediações) pelos Fenícios, a sua importância já denotava a grande riqueza de então: chamaram-lhe Bevipo e o sal era a principal produção da região. Acresce que a navegabilidade do Rio Sado, era propícia ao acolhimento dos barcos que faziam o comércio à época, com a segurança de um porto interior mais protegido das intempéries e da pirataria. A região exportava sal (as margens do rio que ainda retinham o sal das águas oceânicas oriundas da foz, cerca de 40 quilómetros a jusante), peixe salgado e ainda cavalos que seriam abundantes nestas zonas de lezíria.

Com a conquista romana, no início da era Cristã, a sua denominação alterar-se-ia para Salácia. A posição estratégica, pela via marítima e também por ser já na época um ponto de passagem dos que vindos de sul demandavam a aproximação ao estuário do Tejo e a Lisboa, deram-lhe a notoriedade e a importância que é testemunhada pelo facto de os seus habitantes terem o privilégio de ser considerados Cidadãos de Roma.

Mais tarde e já depois da passagem dos Visigodos que substituiram o Império Romano, Salácia é tomada pelos Mouros em 715, no seu avanço pela Península Ibérica. A povoação passará a chamar-se Qasr Abu Danis e nela é construída importante fortaleza (Al-Qasr, fortaleza ou povoação fortificada em árabe). Era a capital da província de Al-Kassr. Daqui terá saído certamente a origem da sua actual designação: Alcácer do Sal, pela associação da sua importante fortificação à principal riqueza da região.

Já vimos que a reconquista cristã foi dificil e apenas em 1217, defintivamente concretizada.

De então para cá, a sua posição estratégica manteve-se relevante e apenas no século XIX a sua principal riqueza, o sal, foi substituído pelo cultivo do arroz, existindo no concelho os maiores arrozais da Europa. Aliás, o concelho de Alcácer do Sal é o segundo mais extenso de Portugal.

Mais actualmente, outra das suas riquezas é a produção de pinhão. Portugal produz cerca de 15% da produção mundial e a região alcacerense é predominante no conjunto do País.

Foi em Alcácer do Sal que em 1502 nasceu Pedro Nunes (sim, aquele que deu nome ao liceu em Lisboa) célebre matemático, tendo-se celebrizado pela invenção do nónio. E que seria fundamental para o posterior desenvolvimento de instrumentos de navegação, como o sextante, que seriam essenciais na época dos Descobrimentos e da exploração maritíma.

Já no início do século XX, em 1902, nasceu João Branco Núncio, distinto cavaleiro tauromático e proprietário rural da zona, evidenciando também a componente agrícola desta primeira região do litoral alentejano.

Descrita a história desta agora cidade alentejana, era tempo de rumar a sul e atravessar um grande ex-libris de Alcácer do Sal: a sua ponte metálica, inaugurada em 1945.

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Com características originais, o seu tramo central erguia-se verticalmente para permitir a passagem de barcos à vela que transportavam cereais – trigo e arroz principalmente. E era também o local de desespero de muitos, que indo ou vindo do Algarve, aí encontravam filas de trânsito homéricas! Naturalmente, antes da construção da auto-estrada (a montante) e da variante com uma nova ponte, a jusante.

Actualmente, e depois de obras de restauro e recuperação, a ponte recuperou este tramo levadiço que permite a passagem novamente de barcos à vela, mas agora com carácter exclusivamente turístico.

Himalayan – as primeiras impressões

Até aqui, a minha companheira, uma Royal Enfield Himalayan Adventure cumpriu face às expectativas.

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Não se trata de uma moto cujas caracteristícas estradistas sejam as ideias para grandes viagens feitas a ritmos mais elevados. Na realidade, para uma velocidade de ponta que pouco passará dos 120km/h, manter um cruzeiro pelas estradas nacionais, na casa dos limites legais e com bastante trânsito de e para o Algarve, obriga-nos a prudência acrescida nas ultrapassagens pois são obviamente algo longas.

Por outro lado, o conforto em andamento com uma suspensão que bem absorve as irregularidades de asfaltos mal mantidos e o ritmo pacato faz com que as viagens sejam calmas e relaxadas.

Não haja dúvidas de uma coisa: chega onde outras mais dotadas de cavalos chegam! E se a estrada ficar um pouco mais revirada…acaba por se tornar divertida.

Todavia não esqueçamos algo: Esta é uma moto pacata, cujo objectivo é dar-nos o retorno do investimento feito na sua aquisição. Não lhe exijamos mais do que é suposto e garanto…dar-nos-á mais do que à partida esperaríamos.

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Agora sigamos, rumo a outra terra, também ancestral, identicamente velho porto de rio e com ainda mais forte presença do passado mourisco: Mértola!

De Alcácer do Sal a Mértola

À beira do Sado, cafézinho despachado. Fotos idem. A caminho!

Saído de Alcácer rumo a sul pelo IC1, tomei a “antiga” Estrada do Algarve” precursora da mais recente auto-estrada e durante tantos e tantos anos o calvário daqueles que a percorriam a caminho ou no regresso das férias veraneantes.

Passei a Grândola da minha infância e pouco depois do Canal Caveira, outrora paragem obrigatória para os devotos do Cozido à Portuguesa, virei para o IP8 a caminho de Beja. Seguramente a capital de distrito mais mal servida no que a acessos se refere. A estrada é a mesma de há tanto tempo, apenas com um tapete asfáltico melhorzinho e alguns arrebiques na sinalização.

Beja percorre-se pela circular que a contorna até à viragem à direita para um pouco do IP2 e depois, finalmente a EN122 que me deixaria em Mértola.

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E a Royal Enfield?

A Himalayan continua sem quaisquer queixas a palmilhar os quilómetros, com a calma que a caracteriza.

Se em vias onde o cumprimento dos limites de velocidade é “mais optimista” se sentem as suas limitações nas ultrapassagens (e se a estrada for ligeiramente a subir, ainda mais), quando a estrada se torna mais estreita, sinuosa e com piso mais irregular, a minha companheira está como peixe na água!

A potência e o binário, que são escassos face à aparência da moto – cerca de 25cv de potência e 32Nm de binário originados pelo monocilíndrico de 411cc. – são aqui mais do que suficientes para garantir uma boa velocidade de cruzeiro e, acima de tudo com o maior conforto. Sim! A Himalayan é bastante confortável em viagem. E a posição do guiador permite com a maior das facilidades conduzir de pé. O que é bom para o offroad mas também para, de vez em quando, “esticarmos as pernas”.

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E assim cheguei a Mértola. A aproximação teve um aperitivo de algumas curvas em sobe e desce até à descida final para o centro da vila. Aqui, o indicador de combustível aproximava-se da reserva e, por prudência, nada como reatestar. Pouco mais de 8 litros e uma média desde Lisboa de 3,76 l/100km parece-me francamente positiva, considerando que a viagem foi feita sempre em regime rapidinho e com bastante calor.

Em Mértola

Mértola será a povoação portuguesa onde melhor está preservada a herança da ocupação muçulmana, não deixando de estar disponíveis aos visitantes, imensos vestígios de todos os povos que por aqui passaram e deixaram a sua marca indelével.

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A preservação deste património tem sido desde há algum tempo, um missão levada a bom porto sendo hoje e com inteira justiça, uma vila monumental.

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Por outro lado, para aqueles que não dispensam algum lazer, as margens do Guadiana proporcionam as condições para uma saudável pratica de desportos náuticos. E seguramente, que o facto de também ser protagonista da cultura alentejana, patente na gastronomia e nos costumes, lhe dá um cunho ainda mais atractivo.

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Tal como Alcácer do Sal, Mértola foi também fundada pelos Fenícios, para lá das evidências de algum povoamento pré-histórico. E a sua importância era tal que a consideravam o último porto do Mediterrâneo a Ocidente. O último antes das águas mais agrestes da imensidão do Oceano Atlântico.

As semelhanças não terminam aqui, pelo contrário. Situada na margem direita do Guadiana, a navegabilidade deste rio fez com que fosse, também, um importante entreposto comercial naquela época (a questão da segurança face às intempéries e a ataques de pirataria) e nas eras vindouras.

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De destacar que o efeito das marés no Rio Guadiana ainda se faz sentir em Mértola, cerca de 70km a montante da foz em Vila Real de Santo António. Por outro lado a sua localização no cimo de um monte que dum lado tem o já referido Guadiana e do outro a Ribeira de Oeiras (que desagua naquele logo a seguir), dá-lhe um carácter de fortaleza quase inexpugnável. E certamente ao longo da sua história essa configuração prestou um tributo de segurança aos seus habitantes.

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Depois dos Fenícios. Os Romanos denominaram-na por Mírtilis Júlia aquando da ocupação da Península. Sucederam-lhes os Visigodos e depois, como na maioria da Península, a ocupação mourisca. Chamaram-lhe Martulá e foi de tal forma importante que era a capital de um pequeno emirado islâmico independente: a Taifa de Mértola. Importante na correlação de forças e nas alianças que sucessivamente se foram gerando, nomeadamente quando foi necessário fazer face aos esforços dos Cristãos na reconquista do território.

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E foi em 1238, no reinado de D.Sancho II que finalmente Mértola passa a fazer parte do território do então já quase centenário Reino de Portugal.

Em meados do século XIX e até quase ao final do século XX, o concelho conheceu uma nova fase de grande prosperidade. As minas de S. Domingos foram o motor dessa nova riqueza. E é para lá que irei a seguir!

De Mértola às Minas de S. Domingos

Desde tempos imemoriais que é conhecida a riqueza mineral de vastas regiões do Alentejo. No caso do seu extremo mais raiano, a zona onde se situam as Minas de S. Domingos, desde a época dos Fenícios e dos Cartagineses que a actividade de extracção de minério está bem presente. Tal como sucedeu na época da ocupação romana. O objectivo era a extracção de ouro, prata e cobre, minerais nobres que entram na composição das pirites.

A exploração mineira a nível industrial inicia-se em 1858 e vai ser contínua até 1965, altura em que o veio piritoso se esgota, deixando a mina de ser viável. E com ela também toda a vida que girava em torno de uma exploração à época de grande dimensão. Basta referir que a exploração a céu aberto se prolongou até aos 120 metros de profundidade, prosseguindo depois de forma subterrânea, através da construção de poços e galerias até cerca dos 400 metros.

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Estima-se que tenham sido extraídos 25 milhões de toneladas de minério ao longo dos mais de 100 anos de exploração. Foram durante muitos anos, a maior exploração mineira em território nacional.

As Minas de S. Domingos distam cerca de 17km de Mértola.

A estrada, apesar de estreita, está em bom estado (e à saída de Mértola até tem uns quilómetros sinuosos com umas sequências de curvas engraçadas) e rapidamente nos leva ao destino. E qual não é a surpresa! A primeira visão é a de uma paradisíaca praia fluvial situado no meio do montado tipicamente alentejano.

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Esta praia – Praia Fluvial da Tapada Grande – resulta de um açude e da sua albufeira. É a maior de duas albufeiras de água doce criadas pela empresa Mason & Barry durante o século XIX, para fornecer água para o processamento de minerais de baixo teor pela via húmida. É praia fluvial desde Junho de 2000.

Actualmente serve e bem para deleite dos muitos que a procuram, principalmente quando a típica canícula alentejana ataca. E a este respeito é de referir que mais à frente no nosso trajecto, o termómetro atingiu neste dia os 46º!

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Um pouco adiante está a povoação. Criada para albergar os trabalhadores das minas, suas famílias e todas as infraestruturas necessárias à indústria de exploração da mina. E também todos os equipamentos sociais necessários.

Convém referir que Minas de S. Domingos foi a primeira aldeia portuguesa servida por energia eléctrica. Bem como a assistência médica e sanitária que consta ter sido de referência. E foi também aqui que foi inaugurada a primeira via férrea em território nacional: na extensão de 17km unia a zona da extracção com o porto fluvial do Pomarão (onde irei de seguida…).

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Nela chegaram a habitar 10.000 pessoas, dos quais um terço seriam trabalhadores da Mina. Hoje, poucos mais serão que meio milhar… envelhecidos e tristes pela saudade da agitação e da vida de outros tempos. Mesmo que a esta fosse dura, muito dura!

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Na Mina de S. Domingos foi também construída a primeira central eléctrica do Alentejo, era detentora de um palácio, um posto de policia, um cemitério anglicano, várias colectividades com intensa dinâmica cultural, um campo de jogos e até o seu próprio clube de futebol.

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O minério extraído, depois de separado, ia consoante as suas características, por via férrea para o Centro de Britagem da Moitinha, para a Fábrica de Enxofre da Achada do Gamo ou, finalmente, para o Pomarão. E este porto fluvial, foi desde sempre uma vantagem comparativa importante pela facilidade de escoamento graças à navegabilidade do Rio Guadiana.

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Quando nos embrenhamos pelas ruas da aldeia, cujo casario é repetidamente igual, será inevitável depararmo-nos com a gigantesca cratera – a Corta – resultante da extracção mineira efectuada em socalcos e em profundidade. Cujo fundo não se alcança por estar completamente inundada pela elevação do nivel freático. As margens assumem diversas tonalidades cromáticas, devidas certamente aos diferentes componentes que contaminam estes solos, até ao plano de água. Água será força de expressão, porque também esta está altamente contaminada e com elevados níveis de toxicidade.

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Duas últimas palavras sobre as Minas de S. Domingos: são um património riquíssimo de um passado ainda recente, quer pela possibilidade de vermos como era extraída esta riqueza do sub-solo alentejano, quer principalmente para percebermos as condições de vida e a dureza extrema de quem nelas trabalhava. O Centro de Documentação e a Casa do Mineiro funcionam num conjunto de quatro antigos alojamentos de operários da mina e são elementos fundamentais para percebermos hoje, o que foi ao longo de mais de um século, a vida desta comunidade e a própria evolução da exploração mineira nestes confins do Alentejo. Uma visita que se impõe!

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Daqui, era obrigatório visitar o ponto final da fileira de extracção do minério (no que a S. Domingos concerne): o porto fluvial do Pomarão, distante apenas 17 quilómetros.

 Finalmente, até ao Pomarão

A estrada, no meio da planície a perder de vista, cenário típico do Alentejo profundo, reservava ainda uma surpresa: no exacto momento em que o odómetro marcava os 3.333,3 km, o termómetro andava pelos 44ºC. Arranquei e logo a seguir…45º. Dois ou três quilómetros adiante… 46º!!! Um ovo no topo do capacete…e estrelava! Felizmente, depois estabilizou…nos 45º! …É Alentejo. É Agosto.

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Recordava-me de anterior visita que a paisagem remetia para outras paragens mais verdejantes e setentrionais – quiçá um certo vale do Danúbio….se formos optimistas! Outra época certamente, pois no pino do Verão predominam por aqui as cores da terra, diversos cambiantes do mesmo castanho, a que algum arvoredo não retira certa monotonia. Ainda assim, a abordagem “cá de cima”, que surge repentinamente ao virar de uma curva da estrada em que sinal rodoviário nos alerta para uma descida a 10% de inclinação, não deixa de nos mostrar a beleza do Guadiana que aqui reinicia o seu trajecto internacional (até à foz, quilómetros abaixo em Vila Real de Santo António).

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Da anterior azáfama, resta apenas algum casario e as ruínas do cais de descarga do minério.

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Nos últimos quilómetros que me trouxeram até ao Pomarão foi possível ver partes do trajecto da antiga linha férrea, a primeira em Portugal, mas já desapossada dos carris e travessas que lhe davam corpo. Quanto à vista…a curva do rio, tranquilo, é ainda assim deslumbrante.

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No Pomarão pode ainda ver-se a ponte em que na outra margem é território espanhol (e as diferenças logo visíveis no estado da estrada…) bem como o paredão da Barragem do Chança (afluente do Guadiana).

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E estava feita a visita.

De volta a Mértola e um veredicto sobre a Himalayan

O regresso a Mértola e o final desta parte do périplo alentejano com a Royal Enfield Himalayan versão Adventure. E que bem lhe fica esta designação.

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É nestas estradas que ela se sente verdadeiramente à vontade. O monocilíndrico que não “transpira” cavalos chega e sobra para mantermos o ritmo adequado às estradas percorridas, com segurança e conforto.

Esta versão vem equipada com caixas laterais que levam mais do que aparentam. Efectivamente se os 26 litros de cada uma e o formato não permitem alojar um capacete (que seria útil principalmente em utilização diária e citadina), têm ainda assim a capacidade de fornecer bastante arrumação (e com um saco na garupa, vamos em frente pelo tempo/distância que quisermos!).

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Já anteriormente comentei que esta moto não tem por vocação trajectos em auto estrada ou em estradas cuja velocidade de circulação ande por cima dos limites legais (as ultrapassagens são algo longas), mas quando tomamos estradas mais estreitas, sinuosas e com pisos irregulares, aí sim! Ela está no seu meio. E, se numa qualquer curva da estrada precisarmos de arriscar um percurso off road que nos transporte a um daqueles “locais secretos” que tanto apreciamos, não há que hesitar. A Himalayan continua no seu meio.

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O regresso  pela Estrada Nacional 2

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A palavra regresso no título tem duplo sentido: em primeiro lugar porque é o regresso a casa depois deste périplo por terras do Sul com a Himalayan Adventurer; em segundo lugar, porque é o regresso a onde verdadeiramente começou o Viagens ao Virar da Esquina: a EN2.

Desta feita, a Nacional 2 será percorrida apenas até ao Torrão (depois “faço agulha” a Alcácer do Sal e Lisboa). Mas será a oportunidade para rever as 365 curvas da Serra do Caldeirão, agora em sentido contrário ao que fiz em Abril de 2018, de Sul para Norte.

E a viagem começou no final! Sim, no final da EN2, se considerarmos que em Faro se situa o km 738 – no marco quilométrico – ou 738,5 – nas placas que indicam o rumo a Chaves (de salientar que por duas vezes já as tinha procurado e não tinha encontrado; desta feita, fiz o trabalho de casa e fui lá direitinho!).

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Rumo a Norte, pouco depois da saída da capital algarvia, uma pequena povoação com um nome curioso: Coiro da Burra! Nada mais correcto…era no “coiro” da “burra” – a Himalayan – que iria fazer a tirada de cerca de 280km até Lisboa.

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Já referi anteriormente algumas das características desta moto, nomeadamente o facto de ser humildemente potente mas honestamente consistente. Na realidade, a Serra do Caldeirão não tem inclinações pronunciadas onde se poderia fazer sentir alguma falta de energia. Pelo contrário, a estrada flui ao ritmo de curva e contra-curva subindo ou descendo, mas sempre em ritmo turístico, pois essa é mesmo a sua vocação. A Royal Enfield é uma moto utilitária, não uma máquina de corridas infestada de cavalos. Cumpre a sua vocação e diria que o faz muitíssimo bem!

Foi assim, em ritmo turístico, desfrutando da paisagem que nesta época – Agosto com temperaturas a rondar os 40º – é algo árida e seca que segui viagem. Noutras estações terá maior beleza sem dúvida, mas a EN2 está lá sempre à nossa disposição.

A primeira paragem para a foto da praxe foi no cruzamento com a EN124 em Barranco do Velho. Momento de nostalgia pois lá passei também a 25 de Abril de 2018 quando percorri a EN2 com dois fiéis amigos e companheiros e, um ano depois, precisamente na mesma data e quase à mesma hora, quando fiz a EN124 (que recomendo vivamente).

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Depois, um pouco mais à frente, desfrutei da amplitude que a vista do miradouro da Serra do Caldeirão nos permite alcançar. Tempo para fotos, para descansar…e meditar, para quem for de meditações. Como não é o caso, segui viagem!

Adiante, uma magnifica e antiga Casa de Cantoneiros (da época em que ainda existia esta profissão e uns senhores cuidavam da estrada numa lógica de proximidade…alguém falou em descentralização?). Pois bem, há ano e meio estava em mau estado. Agora, provavelmente foi adquirida e está em fase de recuperação, mas para uso privado, claro. A casa é bonita e vale a pena que alguém a mantenha, até porque foi construída em 1937…

No Ameixial, paragem obrigatória no monumento aos Camionistas da EN2. De facto, quando esta era uma das vias principais de entrada no Algarve (a principal diria eu, porque se dirige à capital algarvia) e não havia AEs, IPs, ICs e outras que tais, fazer estas 365 curvinhas agarrado ao volante e com umas toneladas atrás não seria petisco simpático… Justa homenagem, portanto.

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E pronto, quase a chegar a Almodôvar, a Serra estava feita. Aproveitei um recanto para um breve descanso e petiscar o farnel, pois a viagem ainda nem sequer estava a meio!

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3 quilómetros à frente, a vila de Almodôvar, que à entrada tem uma espectacular estátua, feita com uma amálgama de peças metálicas e que simboliza a dura vida dos mineiros da região. Bonita homenagem, sem dúvida.

Breve paragem para um café e meia de conversa…que isto de andar de moto tem essa característica: há sempre alguém que nos aborda com uma palavra ou um comentário. Onde quer que estejamos, fazemos parte dessa história.

A partir daqui, sempre a andar: Castro Verde, Aljustrel, Ervidel, Ferreira do Alentejo, Odivelas foram-se sucedendo, em ritmo ligeiro. Até porque não lembra a ninguém andar a mais de cento e vin….perdão, 90 km/hora, naquelas rectas planas e desertas do Baixo Alentejo.

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E assim cheguei ao Torrão. Desta vez, a EN2 ficava por aqui…mas deu para matar saudades!

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Em direcção a Alcácer do Sal, breve desvio até à barragem de Vale de Gaio…para constatar que a água escasseia naquela albufeira. Vivemos tempos de seca…

Há muito que a temperatura indicava 40º ou mais ainda. Assim, nada como uma paragem em Alcácer para saborear um gelado e animar para os restantes 80km que ainda faltavam. A marginal desta cidade alentejana, à beira Sado, dá-nos um enquadramento de tranquilidade que é sempre agradável.

Ao parar, junto a um grupo de motos, logo 2 companheiros se acercaram com curiosidade sobre a Himalayan. Na realidade, não foi caso único ao longo destes dias. A moto suscita curiosidade! E isso é bom. Significa que a Royal Enfield fez um bom trabalho.

Esses companheiros, nortenhos de Gondomar, tinham feito a EN2 e regressavam agora a casa. Por etapas. E espero que o almoço do dia seguinte que já estava apalavrado para a Mealhada tenha cumprido as expectativas!

Meia horita de confraternização motard e ….até Lisboa!

O resto da viagem não teve história. A EN5 é daquelas estradas em que a Himalayan deve ser conduzida com alguma atenção. A velocidade dos automóveis anda com frequência no limite legal ou até um pouco acima, o que dificulta as ultrapassagens e as torna algo compridas. A fazer com cuidado e calma.

Aliás, calma deverá ser o nome do meio desta moto, que proporciona viagens confortáveis, sem o stress das grandes velocidades, a desfrutar da paisagem. Garanto, fazem-se tiradas de 300 ou 350km e no final, algum cansaço natural mas não ficamos nem moídos nem partidos, prontinhos para no dia seguinte voltar a repetir a dose.

Terminada a história da Royal Enfield Himalayan Adventurer pelas planuras alentejanas, fica apenas por contar a apreciação desta experiência de condução de uma moto do mais antigo construtor mundial em produção contínua! E com uma surpresa…ou será um bónus?

Final – A Royal Enfield Himalayan Adventurer, fiel companheira desta jornada

Os anglo-saxónicos gostam de reduzir e simplificar conceitos e conclusões através de acrónimos. No caso desta Himalayan, eu sugiro o seguinte:

WYGIWYP – and more!!! (“uiguiuip” soa bem…)
(What you get is what you pay – and more!!!)

Esta versão custa pouco mais de 5.000 euros. Uma trail, equipada com barras de protecção e, principalmente, um conjunto de malas perfeitamente integrado com a capacidade de 26l cada uma. São relativamente estreitas (não permitem guardar um capacete mas são suficientemente profundas para armazenar muita tralha…) o que é uma vantagem em utilização citadina.

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O monocilindrico motor de 411cc com 25cv de potência e 32Nm de binário dá o que tem. E é mais do que pode parecer. A velocidade máxima rondará os 130km/h com o redline às 6.500rpm (uma nota curiosa: o velocímetro tem um desvio mínimo portanto cuidado com os excessos…quase não há folga).

Ou seja, temos motor para cumprir os limites legais. Mas em estradas em que a circulação se faça junto ao limite dos 90km/h devemos ter atenção porque as ultrapassagens serão longas, já que estamos perto da velocidade de ponta e as recuperações não são rápidas.É questão de hábito.

Por tudo isto, qualquer viagem nunca será para malta apressadinha. Mas será uma delicia para quem gosta de percorrer as estradas nacionais em ritmo turístico e desfrutar de tudo o que nos oferecem. Inclusivamente naqueles segmentos mais revirados, conseguimos ter alguma diversão porque a moto é estável e a ciclística adequada. Poderemos ter que trabalhar com a caixa de velocidades, é certo…mas é para isso que ela lá está!

Em estrada, com andamentos bem rápidos (dentro do que atrás referi, claro) e substancial calor, a média de consumo ultrapassou ligeiramente os 3,6 l/100. Com andamentos mais calmos e tranquilos, admito que aquele valor se reduza ainda umas décimas.

Referi atrás que pertence à classe das trails. Com as vantagens e defeitos inerentes.

Em primeiro lugar, em offroad mostra boa aptidão para uma condução divertida. A roda 21” à frente garante a direccionalidade adequada e a capacidade de superar os obstáculos, a suspensão com bom curso e bastante macia, absorve as irregularidades do terreno e proporciona conforto. A posição do guiador permite-nos conduzir de pé com grande facilidade. Ou seja, é sempre possível fugir para aquele estradão que nos leva ao tal “recanto secreto”, sem qualquer receio. Ela chega lá!

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No entanto, pareceu-me que a distância ao solo é relativamente pequena. A moto (pelo menos esta que me acompanhou) é baixa e isso levanta dois problemas: nas curvas em asfalto com mais “balda”, a pezeira raspa com facilidade no alcatrão. Com facilidade a mais… E por outro lado, temos que ter algum cuidado quando a colocamos no descanso lateral pois fica demasiado vertical (e nalguns casos invalida o estacionamento!). Admito todavia que um apuro de afinação da suspensão traseira possa melhorar esta situação.

Por falar nas suspensões, merece referência a capacidade de absorver as irregularidades de asfaltos mal mantidos, o que se traduz numa condução confortável e em menor fadiga ao fim de uma longa jornada. É possível fazer cerca de 350km sem que o corpo se queixe…e no dia seguinte estaremos preparados para repetir a dose. E como a velocidade é pacata, serão sempre viagens calmas e relaxadas.

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Relativamente à ergonomia, o guiador tem a largura e a posição correctas, as mãos “caem” naturalmente nos punhos. Já as pernas vão relativamente flectidas (a tal questão da moto estar baixa…e 1,82 de altura do motociclista!). Compensei esta situação com alguns momentos de condução em pé para “esticar as pernas” e tudo bem!

Também não foi surpresa alguma perturbação aerodinâmica na zona dos ombros. É normal neste tipo de moto. E devo referir que não senti necessidade de colocar o écran na posição superior (possível mas com recurso a ferramentas)

A estética desta moto sugere alguma rusticidade. E isso não é defeito! Uma trail não é moto de cidade por definição. E as linhas “vintage” dão-lhe um charme muito próprio, que pude constatar pois várias foram as vezes em que fui interpelado sobre a moto. Também a pintura em concreto, o esquema cromático em diversos tons de cinzento, acentuam o tal carácter “rústico” quase como se fosse uma camuflagem…

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E já que falamos de questões estéticas, merece destaque o painel de instrumentos. Completamente clássico, com velocímetro e conta rotações analógicos e a curiosidade de ter uma pequena bússola digital (engraçado…mas na era do GPS…talvez fosse preferível ter um termómetro da temperatura do motor, digo eu…). Mas que o painel é giro, é! E à noite ainda mais…

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No que se refere à mecânica…se a embraiagem prima pela suavidade, já a caixa – de 5 velocidades – está longe de ser referencial (também não se esperaria que o fosse), mas estou certo que a sua fiabilidade não nos deixará ficar mal.

Os travões, também, não são exemplares. O travão dianteiro (apenas 1 disco e é suficiente) exige alguma força para sentirmos a sua “mordedura” (o que resulta estranho para quem está habituado a travar apenas com o dedo indicador…mas isso é defeito meu!) e o traseiro, é algo esponjoso. Mas trava! Só precisamos de nos habituar…

Os motores monocilindricos transmitem mais vibrações ao chassis. Isso é sabido e também aqui sucede. Mas quando atingimos as 5.000rpm (cerca de 100km/h em 5ª velocidade – a caixa é de 5) sentimos uma vibração na zona do cóccix que se torna desagradável e pode levar a alguma dormência nesta zona do corpo, mas que depois tende a amenizar se subirmos ligeiramente de rotação.

Não desdenharia voltar a fazer a Estrada Nacional 2 nesta Royal Enfield Himalayan!

Porquê?

Porque tem a velocidade ideal para garantir que desfrutamos das paisagens e de tudo o que a nossa vista pode alcançar. Porque é confortável para assegurar que chegamos ao final de cada etapa em excelentes condições para o convívio de fim de dia. Porque não se nega a fazer qualquer tipo de percurso ou de piso. Porque carrega com facilidade a bagagem necessária.

E porque não dá chatices!

E porque é económica!!! Uma média abaixo dos 4 litros aos 100, numa moto com estas características é um factor a considerar. Repito, a Himalayan tem as características ideais para este tipo de viagens…e por um preço à volta dos 5.000€, julgo que dará que pensar! Eu disse 5 mil euros….

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A Royal Enfield diz que a Himalayan é “the only motorcycle you will ever need”.

Não garanto que assim seja se formos mais ambiciosos, como por exemplo se quisermos atravessar o país vizinho numa tirada directa para chegar mais depressa à Europa. E daí partirmos à conquista de outros objectivos…

Será que uma futura Himalayan com o bicilíndrico de 650cc e 47 cavalos seria o ideal?

Foi a resposta a esta questão que procurámos!

E foi aqui que experimentámos a Interceptor 650 Twin

Terminado o périplo alentejano (com um cheirinho de Algarve também) tivemos a oportunidade de dar uma pequena volta na Royal Enfield Interceptor 650.

É obviamente uma moto completamente diferente. Com um look retro fantástico. E sendo os gostos subjectivos, arrisco dizer que “…a moto é linda!”

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Quanto ao motor, que era a questão a resolver, é um seis e meio bicilindrico com 47cv. E isso faz toda a diferença. Menos vibrações, quase o dobro dos cavalos, mais binário, melhores travões, suspensões ajustadas….parece-me que com um preço adequado – por baixo dos 7.000€ – seria um competidor feroz. E julgo que a ciclística da actual Himalayan, com algum retoque, poderia servir a contento!

Este motor de 650cc, não sendo nenhum foguete, longe disso, já mexe. Já se sente algum empurrão da potência e, principalmente, maior rapidez de reacções, nomeadamente nas recuperações.

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Sabendo-se que o lançamento de novos modelos por parte da Royal Enfield não se caracteriza pela rapidez, pode ser que dentro de algum tempo algo possa surgir.

Esperaremos sentados…para ver!

Last but not the least

  • A Royal Enfield Himalayan Adventurer que me levou por estas estradas alentejanas e também algarvias, foi gentilmente cedida pela Royal Enfield Portugal.

 –     A Royal Enfield Interceptor 650 que pude experimentar num breve test-drive, foi cedida pela Zemarks, o concessionário da marca para a região de Lisboa e que se situa em Massamá. Sugiro que façam uma visita e ficarão bem surpreendidos…

A ambos o meu sincero agradecimento pela disponibilidade e simpatia!

Motos, menires e 2 alentejanos…no Alentejo!

Um desafio: andar de moto e fazer um filme. Aceite!
Com o Samuel Amaro e duas Honda cedidas pela Motodiana, experimentámos os caminhos alentejanos.

Onde se fala de Astérix e Obélix

Quando ouço ou vejo a palavra “menir” logo a minha imaginação resvala para as aventuras de Astérix e Obélix. Os irredutíveis gauleses que desafiavam o domínio das legiões romanas de Júlio César. E bem nos recordamos que Obélix, quando não se entretinha a sovar romanos ou a devorar javalis, era um empresário da indústria de menires. Monólitos de rocha de forma ogival e que geralmente eram utilizados como pedras tumulares…a não ser que o dito gaulês se enfurecesse e resolvesse utilizá-los como arma de arremesso, provocando estragos substanciais no fisico e na moral dos infelizes legionários romanos.

Mas isto vem a propósito de quê?

O que tem a ver com motos…ou viagens?

Tem …porque fomos ver menires!

O desafio

O Samuel Amaro do OLHARES SOBRE RODAS (página do facebook e  canal do You Tube, que recomendo!) lançou o desafio:

Vamos até Évora…Experimentamos umas motos…E fazemos um filme!

Sendo a cidade e a zona circundante ricas em História e paisagem, faltava escolher o cenário. E não foi difícil: o Cromeleque dos Almendres e o caminho até lá eram ideais. Teríamos estradas asfaltadas e em terra. O monumento daria também um enquadramento diferente. E pelo caminho viríamos ainda descobrir um outro cenário apropriado pela sua beleza paisagística: a Barragem de Tourega.

Em Évora, na Motodiana

E foi assim que madrugada nos fizémos ao caminho até Évora. Partindo de locais diferentes, o encontro só podia ser em Vendas Novas… (aquela cena das bifanas, já ouviram falar?)

À hora prevista chegámos ao santuário do motociclismo alentejano: a MOTODIANA. O concessionário Honda em Évora mas sobretudo, o ponto de encontro de todos os que gostam deste mundo das motos. E foi aqui que escolhemos as companheiras que nos iriam acompanhar nesta demanda, e por diferentes razões:

– a CB650R – uma moto estradista, naked, com um motor de 650cc e 95cv disponíveis. Muito recente no mercado, havia a natural curiosidade em avaliar as suas características;

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– a NC750X – a trail de gama média, já há algum tempo no mercado (com versão revista para 2019) e um verdadeiro sucesso de vendas. O porquê iríamos descobrir. Acresce a curiosidade de comparar com a X-ADV que recentemente conduzi e que partilha muita da estrutura e mecânica com a NC.

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Uma aventura a “4 mãos”

Sobre o companheiro de aventura e o seu blogue Olhares Sobre Rodas, nada como citar a própria apresentação feita pelo Samuel Amaro:

“Olhares Sobre Rodas, são visões partilhadas de lugares que visito sobre duas rodas. Partilho filmes sobre aventuras motorizadas, sempre com produção Olhares Sobre Rodas.
A mota não é um meio de transporte, é uma PAIXÃO.”

E de facto, é a paixão pelas motos, pela comunicação sobre motos, pela partilha de imagens e experiências que nos une…para lá da amizade, claro!

A caminho dos menires…e um pouco de História

Saímos de Évora rumo a sul. Por lapso, escapou o desvio à direita que nos levaria à povoação de Nº Sª de Guadalupe por onde se acede ao Cromeleque. Mais adiante, breve consulta ao Google Maps e novo caminho definido. O tal que nos surpreenderia com a vista para a Barragem de Tourega e um enquadramento fantástico para recolha de imagens.

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Caminho este por estradão de terra batida, o que logo nos permitiu avaliar capacidades das máquinas. E filmar e fotografar!

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Depois, mais um pouco de estradão e novamente uma estreita estrada municipal que nos levou a Guadalupe e a virarmos à esquerda para a estrada de terra batida que vai até ao Cromeleque dos Almendres.

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O cromeleque localiza-se próximo ao topo de uma encosta suave, voltada a leste, num monte de 413 metros de altitude, a cerca de 12 km a oeste da cidade de Évora. O conjunto foi descoberto em 1964.O cromeleque localiza-se próximo ao topo de uma encosta suave, voltada a nascente (pormenor não dispiciendo pois supõe-se que o conjunto megalítico seria o recinto de celebrações aos deuses, provavelmente celebrando a luz e calor do Sol), num monte de 413 metros de altitude, a cerca de 12 km a oeste da cidade de Évora.

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Constitui-se num círculo de pedras pré-histórico (cromeleque) com 95 monólitos de pedra. É o monumento megalítico do seu tipo mais importante da Península Ibérica, e um dos mais importantes da Europa, não apenas pelas suas dimensões, como também pelo seu estado de conservação. Curiosamente, é mais antigo que o célebre Stonehenge inglês em cerca de 2 mil anos!

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É dificil compreender, face à importância histórica do monumento, as más condições de acesso bem como ao facto de não haver apoio à visita para lá de um mero cartaz explicativo. O Centro Interpretativo fica a 4km, em Guadalupe. Mas afinal, talvez dificultando o acesso, mantendo alguma confidencialidade, seja a forma de o preservar…

As nossas companheiras de aventura

Quanto às motos, o que poderemos dizer, considerando que o ensaio não foi muito demorado nem extenso e sem correr o risco de ser injusto ou incorrecto? Vou tentar:

CB650R

Está classificada como uma Streetfighter (o marketing tem esta característica de encontrar rótulos que nos simplifiquem as explicações…mesmo que os mesmos possam ter alguma falta de bom senso…convenhamos, uma guerreira das ruas? Há guerra nas ruas? Adiante… que a culpa até nem é da Honda, bastante conservadora nestas coisas). Ou como a marca lhe chama, uma “Neo Sports Café”.

O que tem está à vista. E é bonita!

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O motor tem 650cc com 95cv às 12.000rpm e 64Nm às 8.500. O painel de instrumentos LCD dá-nos toda a informação com grande clareza. A roda da frente está logo ali, o que é sinónimo de grande maleabilidade. As suspensões são excelentes (os troços em terra comprovaram-no, pois absorveu as irregularidades do terreno muito bem…atendendo às características desta moto e ao curto curso das suspensões…obviamente que este não era o seu terreno de eleição). Mas o que mais me chamou a atenção foi o motor. Não por ter uma potência fantástica (95cv não é assim tão pouco para uma moto com esta tipologia) mas pela sua elasticidade. Experimentei deixá-la vir até ás 1.500rpm em 6ª…e depois subiu por ali acima, sem queixas, soluços ou batimentos (se o fizesse na minha VFR…não fazia! Porque iria “bater” por todo o lado).

Subiu linear, com facilidade…limpinho, limpinho! E depois das 6.000rpm a moto revela-se! Se até aí foi suavidade, um motor a ronronar, não deixando de ser rápida…a partir desse ponto…dispara até ao limite das rotações, às 12.000. Um foguete.

Sendo uma naked, a questão aerodinâmica nem se coloca. Todavia, em circulação normal, a moto é confortável, ligeira e conduz-se com tremenda facilidade. Por cerca de 8 mil euros, uma opção muito relevante para quem procura algo deste género.

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Conduzi recentemente uma X-ADV que partilha muito da mecãnica e da ciclìstica com a NC. Relativamente à ciclística, as motos têm comportamentos completamente diferentes (como teria que ser pois a NC é uma trail e a X-ADV não deixa de ser uma scooter).

Entre semelhanças, a maior diferença sente-se no motor. Na realidade, com diferentes afinações, a X-ADV privilegia as “baixas” tendo talvez uma melhor “saída”. A NC é mais linear e conjugada com a caixa DCT (esta estava equipada com a minha caixa de velocidades favorita!) a moto aproveita muito bem os seus 55cv.

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Esta é uma moto polivalente e fantástica para o dia a dia. Até pela sua economia. O tamanho não é obstáculo para a condução citadina, com a vantagem da posição trail que permite uma melhor visibilidade no meio do trânsito.

Por outro lado, tem capacidade mais do que suficiente para viajarmos com ela, naturalmente que a velocidade de ponta não é alucinante, longe disso, mas também tal não se espera (nem se desja…) em estrada aberta.

Com a vantagem adicional de não se negar a uma incursão por caminhos de terra. A experiência neste aspecto foi muito positiva (desliguei o controlo de tracção) e a moto teve um comportamento sempre muito são e equilibrado, a transmitir muita confiança, com as suspensões a comportarem-se muito bem, assimilando todas as irregularidades do terreno.

Quanto à caixa de velocidades DCT…ou se ama ou se odeia. Eu gosto muito…mas isso sou eu!

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Por cerca de 8.000€, é uma proposta francamente competitiva (e o sucesso no mercado comprova-o) para uma utilização quotidiana, económica, fiável e polivalente. E com a chancela de qualidade Honda.

E agora venha de lá esse filme…

Em resumo, mais uma experiência motociclistica que nos permitiu conhecer um pouco mais da paisagem e História deste nosso cantinho alentejano. O regresso fez-se a meio da tarde, com nova paragem para refrescar e reabastecer em Vendas Novas.

Para ver as melhores fotos desta expedição alentejana, clicar no “Album Fotográfico“!

Finalmente, toda a nossa gratidão à Motodiana e ao nosso Amigo José Caniço Nunes, pela simpatia, disponibilidade e cedência das motos que nos permitiram mais esta experiência, pela primeira vez na história do Viagens ao Virar da Esquina, a quatro mãos!

Um abraço Samuel Amaro…e agora ficamos à espera do nosso filme! Ansiosamente…

. . .

e o filme está AQUI!

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Africa Twin – O mito, a lenda e…..dois mil e tal quilómetros depois!!!

Durante alguns dias, em dois períodos diferentes andei com a Africa Twin CRF1000L DCT. Percorri mais de 2000km no Alentejo e Algarve. E o diagnóstico ficou feito: é uma excelente moto e a que eu gostaria de ter nesta altura…

Abril/Maio 2019

25 Janeiro 2019

Por cortesia da Honda Portugal, tive o privilégio de, nas recentes viagens pelo sul do País, conduzir uma CRF1000L DCT, para os amigos e familiares conhecida como AFRICA TWIN.

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E não foi uma AT qualquer! A versão tinha a caixa automática DCT – Dual Clutch Transmition que, sendo alvo permanente de discussão entre os ”puristas” do pedal e manete e os “modernistas” que a acham a última coca-cola do deserto, garante desde logo uma certeza: ninguém discute os inegáveis méritos desta versão da Africa Twin dos tempos modernos. A conversa centra-se no sim ou não ao DCT. E é uma discussão mais apaixonada do que racional…

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Pela minha parte, digo já que tomo o partido dos segundos (neste caso) e considero esta verdadeira inovação que a Honda trouxe para o mundo das motos, um factor decisivo ao tomar opções futuras sobre motos.

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E aqui vale a pena tecer algumas considerações sobre a relação entre a marca Honda e o corrupio de inovações que vemos no mundo das motos.

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A primeira constatação é que, nos segmentos de mercado em que a Honda está presente, não há motos más. Pelo contrário. Muitas, por invenção, analogia ou cópia vão sucessivamente acrescentando funções, características, “inovações”, geralmente com as siglas apropriadas ao marketing “da coisa”. É raro vermos a Honda embarcar nestas dinâmicas. Mas quando o faz….a coisa é séria. O DCT é um excelente exemplo (como dizia em tempos um anúncio de um “enlatado”… um dia todos serão feitos assim). Inovação verdadeira, porque inédita e diferenciadora. E como tal, mais dificilmente imitável pela concorrência. É assim que a Honda entende o conceito de inovação!

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Nesta altura, dizem vocês: “deixa-te de paleio e fala mas é sobre a moto!”.

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Então aqui vai (voltarei ao DCT lá mais à frente. É inevitável!)…

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A primeira coisa que me chamou a atenção (e não de agora) foi o respeito manifestado pela herança das “velhinhas” Africa Twin. As linhas evocam-nas, sem deixarem de ser modernas, actuais e elegantes. Acresce que a pintura da que me calhou em sorte, tricolor, evocava as antigas, com as espectaculares jantes douradas. É uma opinião pessoal, exclusivamente pessoal, mas uma Africa Twin tem que ter rodas douradas…e se o esquema cromático não o aconselha…mude-se o esquema cromático!

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Antes de ir às coisas importantes, uma breve recordação. A primeira AT foi lançada em 1988 (uma evolução da Transalp lançada no ano anterior) com motor duplo cilindro em V e 647cc e cujo desenvolvimento e posterior construção foi feita no seio do HRC (um selo de garantia que as torna hoje em dia ainda mais valiosas…), tendo como inspiração as máquinas que à época dominavam o Paris-Dakar.

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Dois anos depois, o motor “cresce” para 742cc.. Com regulares actualizações, a destacar as de 1989 e 1993, a sua produção manteve-se até 2003. Em 2016, a Honda volta à Africa Twin, desta feita com um motor (sempre) de 2 cilindros mas paralelos, 998cc e 95cv. O carácter está lá, o visual muito bem actualizado também…e até o “bater” do motor e o seu som fazem lembrar os saudosos Vs….

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Africa Twin – 2200km de convívio

Finalmente, vamos lá então à experiência com a Africa Twin:

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Consideração importante (um clássico Honda), em nenhum momento a forma condiciona o conteúdo. A mota é equilibradíssima, em andamento não se sente o seu peso a não ser na estabilidade que proporciona, e proporciona uma muito boa protecção, atendendo à sua tipologia. Quando me sentei na moto, a sensação foi que tinha sido feita “no alfaiate”. Caí na perfeição, a posição sentado, a altura e posição do guiador, os comandos e o painel à frente dos olhos, tudo como se tivesse sido feito por medida.

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Mas, não há bela sem senão. E é aqui que encontrei dois defeitos sensíveis: o primeiro, no punho esquerdo, a disposição dos comando de buzina e piscas não me agradaram. Ao ponto de geralmente andar “à pesca” do pisca. Outro aspecto que é evidente durante o dia: o painel de bordo: tem toda a informação necessária, a navegação mesmo durante a condução é simples mas….faz imensos reflexos e em muitos casos, mais facilmente vemos o nosso reflexo que alguma da informação. Já à noite, com um fundo em azul e lettering branco, tem uma visibilidade notável.

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É evidente que a zona dos ombros e dos antebraços (nestes senti-o porque foi a única zona em que o blusão ensopou com as chuvadas que apanhei) está mais desprotegida. É normal nas trail. E a AT nem sequer será das piores neste domínio, pelo contrário.

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Tudo junto, os quilómetros sucedem-se às centenas (sim! Às centenas…) e o corpo tarda muito a queixar-se. Para quem tem alguma envergadura e mazelas nas costas…dizer isto já é dizer imenso sobre o conforto que é fazer viagens na AT. A suspensão absorve na perfeição todas as irregularidades da estrada e à medida que as atravessamos dá a sensação que vamos num berço, tal a forma como vamos integrados com a moto (nem “em cima” dela como numa mais endureira, nem “dentro” dela como nas mais radicais).

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E o prazer aumenta porque alguém com conhecimentos musicais profundos lá para o Japão, resolveu dotá-la de uma banda sonora que é…fantástica. Uma “voz” grossa, pausada, rouca que em marcha lenta impressiona e na estrada em velocidade de cruzeiro faz companhia sem qualquer tipo de incómodo. A imagem que me vem à cabeça é a de irmos a ouvir um álbum do Leonard Cohen (os fãs que me perdoem a heresia…)!

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A altura da moto tem os constrangimentos naturais. Temos sempre que ter algum cuidado quando paramos…não vá o pé não encontrar o chão e o peso da moto (o centro de gravidade é alto) tornar irremediável a queda! Aconteceu, mesmo com pernas compridas…

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Por outro lado, a circulação em cidade ou em trânsito intenso em estrada é espectacular. Pairamos sobre os “enlatados” com uma boa visão muitos metros adiante. A moto é algo sensível a ventos laterais. Mas julgo não ser um defeito mas antes uma inevitabilidade. A mancha de perfil feita pelo condutor e sua posição de condução e pela moto é muito avantajada, logo sensível. Principalmente, sente-se na roda da frente com o seu diâmetro de 21”. Não tenho dúvidas que nas mesmas circunstâncias outras motos da mesma tipologia sofrerão de idêntico mal, pois a aerodinâmica (principalmente a lateral) não será a maior prioridade. Acresce ainda que a moto tinha instalado o kit de malas (e bom jeito deram!) o que ainda aumenta essa “mancha”.

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Outro aspecto que me impressionou foram os ângulos em curva que a moto permite – será melhor dizer, que convida? – tornando uma estrada revirada em momentos de diversão absoluta. Na realidade quer a inserção em curva se faz com uma certeza grande (e voltamos ao tema da roda 21”) como a saída em força é … entusiasmante!!! Como é óbvio, não estamos a falar de uma “R”…nem lá perto. Não tem nada a ver. Mas, dois condutores com perícias idênticas, numa estrada de serra…admito que o primeiro a chegar não terá muito que esperar pelo segundo. Mas uma coisa sei…o da AT vai chegar muito mais fresco e descansado!

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Os travões acompanham naturalmente o equilíbrio da moto. Estou habituado a que “mordam” com mais acutilância (o que terá a ver com a diferença de perfil de moto que uso no dia a dia) mas realizada a necessária habituação, excelentes. E nas muitas ocasiões em que o clima não ajudou, muita chuva e vento, em nenhum momento se negaram a actuar em conformidade.

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Já vos falei da ergonomia, do conforto, das suspensões, da aerodinâmica, dos travões, do peso, do som, da roda 21… o que falta? O motor e a transmissão. La está…..o DCT. Vamos ter que falar do DCT….

Motor e Transmissão – DCT: Dual Clutch Transmition

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O motor surge perfeitamente disponível desde baixas rotações e depois sobe alegremente. Evidentemente que o seu momento glorioso não será perto do red-line, pelo contrário, nem isso seria de esperar (nem desejável) numa moto que faz da polivalência o seu ponto forte. O binário está lá para quando dele precisamos. E está mesmo! Mas sem nunca nos provocar sobressaltos ou “saltos em frente”. A moto transmite confiança! Muita confiança….

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Tudo isto é possível também graças à conjugação dos “modos de condução” com o esquema de gestão da transmissão. E lá vamos nós falar do DCT!

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A moto tem 4 “modos de condução” – 3 pré configurados e 1 personalizável – que fazem toda a gestão da electrónica disponível: ABS, HSTC – Sistema de Controlo de Binário, sistema de detecção da inclinação, que altera o padrão de passagem das mudanças consoante o grau de inclinação, etc.

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Os 4 modos são Tourer, Urban, Gravel e User (este o personalizável). Na minha experiência apenas não utilizei este último (não cheguei lá….nem sequer sei se, tendo uma moto destas, o faria sem ser para alguma situação mais específica, até porque os restantes chegam e sobram!).

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No caso do Urban, foi mais para ver a diferença que será mais sensível para quem eventualmente a use intensamente no tráfego urbano quotidiano. Numa curta (mas divertida) experiência em TT utilizei o Gravel e nota-se a sua influência no comportamento da moto, muito mais “agarrada” ao chão e mais intuitiva na utilização (tenho quase nula experiência nestas condições…). Note-se que os pneus estavam a léguas de serem os mais indicados a esta utilização…

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Em resumo, o modo Tourer foi o standard da experiência.

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Por outro lado, mais especificamente do lado da transmissão – o tal de DCT – temos 4 níveis de gestão: D(rive) e S(port) com 3 escalões. Assim o D (também poderia querer dizer “default”…até porque quando ligamos a moto e activamos a caixa, é neste modo que sempre fica) faz as passagens de caixa a rotações mais baixas, alongando as relações e permitindo um modo de condução mais suave e económico. Depois, seleccionando o S (a moto recorda sempre qual o último S escolhido) através de um segundo toque no botão de engrenar a caixa (o primeiro toque activou o D), teremos sucessivamente o S1, S2 e S3, cujo efeito mais sensível é o de as passagens de caixa serem efectuadas a regimes cada vez mais elevados. Como é óbvio, no S3 as mudanças são mais “esticadas”. Também aqui…o consumo se poderá ressentir. Mas o gozo é imenso! “No pain, no gain!” .

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Em estradas de serra, reviradas, com bom piso, e condução empenhada, experimentei o S1 e S2. Este último revelou-se o mais gratificante. Todavia, importa ainda fazer aqui uma referência nada dispicienda: a caixa faz as passagens de caixa de forma automática (inclusivamente detecta se estamos numa subida ou descida mais acentuada, actuando em conformidade, reduzindo para manter a rotação ou activando o travão motor para melhorar o controlo, respectivamente)…por isso é uma caixa automática!

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Mas….o condutor pode sempre, em qualquer momento sobrepôr-se a ela e reduzir ou passar acima através dos dois botões do punho esquerdo: polegar para reduzir e indicador para subir (devo dizer que me habituei desde o primeiro momento…talvez por o movimento ser idêntico às mudanças das bikes de BTT…sempre as 2 rodas!).

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Assim, porque na minha forma de conduzir, gosto de entrar nas curvas com mudanças baixas e depois ir subindo à medida que saio da curva, utilizava um “sistema misto”: reduzia manualmente uma abaixo daquilo que o DCT fazia e depois deixava-o gerir a saida em força. Perfeito e diversão garantida. Só um alerta…se não formos incisivos no acelerador, pode suceder que a moto entenda tal como vontade de “subir” e introduzir a mudança acima prematuramente.

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E isto porquê? Porque o sistema de gestão “percebe” as intenções do condutor!!! Inteligente? Talvez ainda não…mas suficientemente bem programado para o fazer. Dou um exemplo: se formos em modo D em estrada aberta e andamento normal, as passagens de caixa fazem-se na zona das 2200rpm. Mas se entretanto precisarmos de fazer uma ultrapassagem e “enrolarmos” decisivamente o punho, a moto “entende” e se o mantivermos “enrolado” as passagens de caixa far-se-ão a rotações mais elevadas.

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Dito isto, o que representa o DCT? Consideremos apenas as configurações de fábrica (omitimos então o “User”)…

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3 modos de condução, combinados com 4 níveis de gestão da caixa (já aqui temos 12 combinações diferentes), mais a gestão electrónica e acrescentamos a intervenção manual a gosto (utilização das patilhas de selecção de mudanças) e chegamos a um número infinito de possibilidades!

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Se a tudo isto adicionarmos a opção de escolha do modo M – intervenção manual para selecção de mudanças – isto é, o condutor é que mete as mudanças quando e como quer (sempre nas patilhas, claro que não há manete de embraiagem ou pedal selector), só me ocorre a célebre frase do Buzz Lightwear no Toy Story: “até ao infinito e mais além!

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Será preciso acrescentar que fiquei adepto incondicional do DCT? Reconheço que hoje em dia, as caixas das motos são sofisticadas e de excelência, que os quick-shifts facilitam a rapidez de utilização, mas….este é todo um novo mundo. E como acima referi, acredito que um dia todas serão feitas assim. Todas? ….Bem, quase todas.

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De referir ainda que existe a possibilidade de activar dois botões no lado direito do painel: o ABS para o desligar e o G onde a tracção e o controlo da moto aumentam, ao reduzir o deslizamento da embraiagem durante as passagens de caixa. Obviamente para utilizar em condições de utilização mais difíceis e específicas.

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Notas finais:

A primeira para os consumos: sem preocupações de economia na condução, com diferentes condições de circulação (desde temporal a calor, vias rápidas, estradas municipais ou de serra), mas sem exageros de qualquer espécie….ou seja, uma utilização muito aproximada do normal mas naturalmente dedicada a explorar as características da moto, fiz cerca de 5,3 l/100km. O que me parece francamente bom e acima de tudo melhorável numa utilização quotidiana!

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A segunda para a qualidade da moto. Uma palavra apenas: Irrepreensível! Ou seja, tipicamente Honda.

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Outra ainda, que tem a ver com a agradabilidade de utilização. Com intempérie nunca me senti desconfortável (para lá do que as condições do tempo admitiam), a protecção face à chuva e ao vento eram muito boas, permitindo por exemplo que a viseira do capacete (mesmo olhando por cima do vidro) nunca estivesse demasiado molhada e que o equipamento se mantivesse em boas condições (e não ficasse sujo!).

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Quando o calor apertou (travessia do Alentejo com temperaturas acima de 30º e velocidades de cruzeiro na ordem dos 100…e qualquer coisa), nunca senti o calor proveniente do motor nas pernas ou a circular para o tronco, o que prova o bom trabalho neste aspecto da aerodinâmica.

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CONCLUSÃO:

Reflecti bastante sobre a utilização da Africa Twin. Tive muito tempo para tal (alguns troços de estrada monótonos e convidativos à introspecção) e a conclusão a que cheguei foi que esta moto, em concreto com o DCT, poderá não ser a melhor moto do mercado (cada um dirá, legitimamente, que a sua é a melhor) até porque afirmá-lo seria um absurdo, mas será certamente a moto que neste momento eu gostaria ter (VFR…mil perdões, mas…sabes, a vida é assim…e em questões de motos não precisamos ser monogâmicos!)!

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