QUEM CONTA UM CONTO.. ACRESCENTA UM PONTO!

O que não falta por aí são histórias, contos, lendas que nos surpreendem, paisagens que nos maravilham e pessoas com experiências de vida que nos enriquecem só por falarmos com elas.

UMA CRÓNICA SOBRE AS CRÓNICAS

Este é um ditado popular muito utilizado quando nos referimos a alguém, geralmente maldizente e propagador de boatos, que tendo tido conhecimento de uma qualquer história – referente a uma terceira pessoa e que não está presente – a reproduz acrescentando sempre uns pozinhos da sua própria criatividade. E geralmente não são abonatórios do ausente visado.

Afinal, a imagem típica daquelas vizinhas coscuvilheiras, estão a ver?

Ao longo destes quase três anos de colaboração com a Andar de Moto nos quais vos vou maçando com relatos de viagens com a regularidade mensal da tiragem da revista, tenho procurado acrescentar alguns pontos às histórias que vou contando.

Obviamente não por coscuvilhice, mas enquadrando-as na dinâmica do trajecto, por vezes dando-lhes uma interpretação própria e sempre utilizando palavras minhas.

Mas afinal como surgem estes relatos?

É o destino que me impõe a procura da história ou, ao invés, um conto ou uma lenda obrigam-me a procurar o local?

AS VIAGENS AO VIRAR DA ESQUINA

Como o nome indica, não procuro viagens longas na distância e no tempo. Não quer dizer que não as faça mas aí o propósito é diverso.

O objectivo é que possam ser simultaneamente gratificantes e facilmente exequíveis. Num fim-de-semana ou numas pequenas férias. Sem rebentar o orçamento também!

Assim sendo, fácil é constatar a primeira dificuldade: enquanto o viajante de longa distância o faz com pouca frequência (uma vez por ano, por norma), traçando um objectivo e estendendo o planeamento e a preparação ao longo do tempo até chegar o grande momento da partida, aqui estas fases são naturalmente mínimas…quase rotineiras.

Na minha opinião, qualquer viagem assenta na resposta a três perguntas que devemos fazer a nós próprios:

  • O SonhoOnde quero ir?

O destino pode ser qualquer um: um local recomendado por amigos, uma paisagem de sonho vista num programa de TV, uma estrada fantástica que alguém comentou, um restaurante perdido no meio de nenhures que tem uns petiscos divinais….ou “apenas” uma daquelas fixações que surgem não se sabe de onde mas que nos martelam a cabeça persistentemente.

A minha não é segredo: o Cabo Norte! Hei-de lá ir…brevemente, que “o tempo urge”!

  • A CapacidadeConsigo fazê-lo?

Aqui entramos no domínio da realidade: tenho orçamento? tenho condição física para o desafio? a moto é adequada? tenho o equipamento necessário? posso ir sozinho ou devo levar companhia? e nesse caso, arranjo?

Todas estas perguntas têm uma resposta em cada momento e não têm que ser todas afirmativas. Basta que o sejam à hora da partida.

  • A Vontade – Algo me impede de o fazer?

Aqui não se trata da resolução dos pontos anteriores.Tem a ver com o nosso íntimo. Se tenho vontade de o fazer, porque não o fiz ainda? Porque hesito?

Acho que todos conhecemos aquela fase geralmente no Inverno, em que nas rodas de amigos começamos a antecipar as próximas conquistas…geralmente as não concretizadas nos anos anteriores, recicladas e acrescentadas de uma ou outra novidade. E afinal o que nos impediu? A família? O trabalho? O receio?…..

As razões serão do foro estritamente pessoal e não cabe aqui explorá-las.

Por isso esta é a questão cuja resposta é mais difícil. E mais complicada de ultrapassar.

É evidente que em pequenas viagens, todas estas questões não se colocam…ou são facilmente ultrapassadas. Uma grande vantagem e o benefício evidente de as podermos fazer, repetir…e repetir!

Mas a questão fundamental é comum: onde ir?

COMO ESCOLHO OS MEUS DESTINOS

Julgo que esta é a parte mais divertida – excluindo a viagem, claro – porque no momento zero, a ideia do destino surge por vezes donde menos se espera.

Devo dizer, como nota prévia, que tenho 2 defeitos grandes (quer dizer, de certeza que tenho mais!): tenho pouco espírito aventureiro – detesto surpresas e procuro controlar os acontecimentos o mais possível – e sou um péssimo gastrónomo – quando estou a andar de moto é frequente esquecer-me das refeições e só dou por isso quando a fraqueza aperta!

Ou seja, quando saio de casa sei para onde vou. Se não souber, assim tipo ir “à sorte”, dou a volta na primeira rotunda e volto para casa. Simplesmente porque ir sem objectivo não me faz sentido.

Mas atenção! Isto sou eu. Sei de quem o faz e se diverte imenso… Chegaria a ter inveja, não fosse esta um pecado mortal. E eu acho que a vista do céu é mais bonita que a do inferno (embora haja quem sugira que este será mais divertido….) portanto vamos lá evitar este em concreto.

Quanto aos destinos “alimentares”, vou se me levarem. Sou incapaz de tomar a iniciativa de ir de propósito. Mesmo que seja para um fabuloso ensopado de enguias, um belo naco de vitela ou uma saborosa sopa da pedra. Ou uma simples bifana…

Mas então como acontece?

Vou contar-vos alguns exemplos

1. “Tem que ir a Brotas!”

Muito no início, quando os Solares de Portugal decidiram fazer o favor de me apoiar, aconteceu um diálogo que nunca mais esqueci e que vou reproduzir:

-“Tem que ir a Brotas!

Fiquei surpreendido. Conhecia terra há muito, por lá passar antigamente quando ia do Alentejo onde morava para a Beira das raizes familiares e nada me sugeria que tivesse algo digno de nota para ver. Mais uma terra anónima pelo caminho…

-“Brotas? Sei onde fica. Mas o que tem de especial?” respondi.

-”Brotas tem um santuário de culto mariano que data de há alguns séculos. Muito, mas mesmo muito, anterior a Fátima.

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Santuário de Nossa Senhora de Brotas
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Interior do Santuário de Nª Sª de Brotas

Não sou religioso mas confesso que fiquei curioso. Algo ancestral e “perdido” no meio do Alentejo?

Não perdi muito tempo a ir até lá. Na realidade, a expectativa foi amplamente superada. Chamei-lhe “Brotas – segredo escondido do Alentejo”

A história assenta, como tantas e tantas outras, numa lenda.

Conta-se que por volta de 1400, um pobre aldeão pastoreava a sua vaca quando ela despencou por um barranco, partindo uma perna. Sendo o único sustento da sua família, logo o pastor antecipou a sua desdita, pois a solução seria matar o animal para lhe poupar o sofrimento.

Foi nesse momento que lhe apareceu a Virgem Maria e lhe disse que se ele fosse chamar os outros aldeões e prometessem construir uma capela em Sua homenagem, ela curaria a vaca.

Enquanto ele foi a correr, a Virgem corta o seu próprio braço direito para substituir o membro partido do animal. Quando regressou, o pastor viu a sua vaca restabelecida. E ele e os seus vizinhos cumpriram a promessa.

Aí se iniciou a devoção a Nª Sª de Brotas. Todas as imagens da santa têm o braço direito amputado.

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Imagem de Nª Sª de Brotas

 Que tem mais três pormenores curiosos:

– o culto foi ganhando dimensão e noutras povoações mais ou menos vizinhas foram criadas confrarias de devotos que faziam romarias periódicas até Brotas. Ao ponto de cada uma construir a sua casa. Estas casas eram depois utilizadas e partilhadas pelas confrarias para reposo dos romeiros. Chama-se hoje Casas de Romaria, estão recuperadas e estão disponíveis a quem queira visitar Brotas;

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Casas de Romaria e Santuário de Nª Sª de Brotas

– ao longo do tempo e, principalmente com os Descobrimentos, devotos de Nª Sª de Brotas espalharam-se pelos quatro cantos do mundo. E levaram o culto consigo. Na Igreja – Santuário é possível encontrar imagens oriundas de paragens longínquas como o Brasil ou a Índia.

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Imagem vinda da Diáspora

– ainda hoje, os habitantes de Brotas acreditam na benção de Nª Senhora. Todos os naturais desta terra alentejana que, no Séc XX, foram mobilizados para guerras – I Grande Guerra ou Guerra Colonial – sobreviveram e apenas um chegou ferido e por acidente.

Uma das características das histórias que procuro e dos locais onde me dirijo é que sejam pouco conhecidas. Tento fugir dos clichés ou dos locais que toda a gente conhece.

Assim, nunca falei de Lisboa – a minha terra natal – ou do Porto – que mal conheço – mas que é destino de tantos. Ou também, porque nunca falei de uma terra de que gosto muito, mas sobre a qual é difícil contar algo sem cair no que todos conhecem: Évora. Ou talvez ainda não tenha encontrado aquela história escondida…

2. O Guimarães das Duas Caras

E isso recorda-me quando no início de 2020 me dirigi a Chaves para iniciar o “Portugal de Fio a Pavio” (percorrer a EN2 num só dia como desafio próprio e teste de uma nova Honda Africa Twin). Deparei-me com uma história pouco conhecida e localizada em Guimarães… e lá está! Uma daquelas terras sobre a qual é difícil falar sem recorrer ao chavão do “Berço da Nacionalidade”, às lutas de D. Afonso Henriques com sua mãe D. Teresa ou à imponência do Castelo altaneiro.

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Castelo de Guimarães

Detive-me na cidade minhota e fui à procura do Guimarães das Duas Caras. Um personagem que tem a sua estátua no topo do medieval edifício dos Paços do Concelho localizado no Largo da Oliveira.

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Largo da Oliveira – Monumento à Batalha do Salado

E a história (algo macabra…) conta-se brevemente: quando a batalha de Alcácer-Quibir se encaminhava para o seu fatal destino, alguns nobres percebendo a inevitabilidade resolveram fugir levando com eles El-Rei D.Sebastião.

Encaminharam-se para o deserto que percorreram dias a fio, sem comida nem água. A certa altura, já desesperados, resolveram tirar à sorte qual deles se sacrificaria em proveito dos restantes (a condição real já não fazia sentido nem dava privilégio) e a má sorte caiu em D.Sebastião que assim… serviu de refeição aos restantes.

Quis o destino que no dia seguinte chegassem perto do mar e um barco que por ali passava os acolhesse com a promessa de os trazer de volta (o que seria um problema e tiveram que jurar nunca contar o sucedido porque senão seriam acusados de traição!). Mas uma tempestade afundou o navio e só um sobrevivente restou: o dito Guimarães (de nome e de terra de origem).

Herói se tornou por tal feito mas o segredo ficou com ele. Não podendo mais guardar para si coisa de tal dimensão resolveu contá-lo em confissão ao Padre Inácio Laranjo.

E assim, o Guimarães viveu e morreu como herói ao ponto de a população lhe querer erigir estátua em homenagem. Não podendo revelar o segredo abjecto, restou ao padre fazer com que ela fosse o que é hoje: a figura do Guimarães mas com um segundo rosto situado na zona do abdómen. O rosto de D. Sebastião, comido pelos fugitivos da batalha perdida.

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Paços do Concelho – Estátua Guimarães Duas Caras
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O Guimarães Duas Caras

Percebem de onde vem a expressão “Ter o Rei na barriga”?

 3. “Já conhece Oriola?”

A grande vantagem das redes sociais é a capacidade de interacção com quem nos lê ou vê. Os comentários são sempre um bom feedback. E por vezes, acontecem coisas inesperadas.

Um dia, uma seguidora da minha página de Facebook, colocou o seguinte comentário numa crónica sobre o Alentejo, cujo tema em concreto já não recordo. E dizia só e simplesmente isto:

 -“Já conhece Oriola?”

Respondi ignorantemente: -“O que é Oriola? Onde fica?” (triste figura, diga-se)

Fiquei de boca aberta. Acreditem. Nunca tinha ouvido o nome de tal terra apesar de me orgulhar de conhecer bem o Alentejo onde vivi longo tempo e onde sempre regresso pois é o meu refúgio. Oriola?

Fui procurar a localização. E a história. Entretanto, a seguidora atenta enviou-me umas fotos da paisagem e restou-me prometer que lá iria logo que possível. Assim foi.

É uma pequena aldeia alentejana, entre Viana do Alentejo (onde há muito queria ir) e Portel, e que fica nas margens da barragem conhecida como do Alvito mas cujo verdadeiro nome é Barragem de Albergaria dos Fusos.

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Oriola – Monumento ao 25 Abril
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Oriola – Ruas brancas

A terra pouco mais tem do que a tipicidade do branco casario alentejano, a calma que caracteriza estas paragens e uma beleza paisagística notável.

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Oriola – Chegámos ao fim da estrada (albufeira da barragem)

Quanto à minha seguidora a quem estou grato, não cheguei a conhecê-la – ainda! – mas está combinado um encontro num destes dias. Merece relevo o facto de ter abandonado a vida citadina e hoje se dedicar a promover a sua terra – registem o nome Oriola para não fazerem a mesma figura que eu fiz – e os seus produtos típicos.

Se por caso tropeçarem na expressão tão tipicamente alentejana “Nã Te Moas!” já sabem: é de Oriola que se trata e o petisco é saboroso. Ou melhor…não tropecem e vão procurar!

4. O meu nome é Arrábida, Serra da Arrábida!
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Serra da Arrábida

Sou, desde há muito, fã incondicional dos filmes do James Bond. Vejo-os e revejo-se sempre com enorme prazer…apesar de já saber o que se vai passar ou até recitar as falas em simultâneo.

Há um filme, datado de há 50 anos, chamado “Ao Serviço de Sua Majestade” que tem algumas peculiaridades: foi o único protagonizado por George Lazenby, passa-se praticamente todo em Portugal e é nele que o agente secreto conhece a Condessa Teresa (Tracy) di Vicenzo, com ela casa…e logo fica viúvo.

O filme começa com a descida da Serra de Sintra em direcção ao Guincho, onde James Bond conhece a futura esposa, o romance e a aventura vai-se desenrolando entre o Estoril, a Baixa Lisboeta, o Ribatejo e a zona de Sesimbra e Arrábida. É precisamente aqui, na estrada da serra que percorre o seu cume e a descer já para o Convento que o carro onde o casal viajava em núpcias é baleado por uma sequaz do vilão Ernst Stavro Blofeld. E Tracy morre.

Este foi durante décadas considerado o “filme maldito” da saga Bond mas é hoje um dos que tem o epíteto de filme de culto. Escusado será referir que Ian Fleming, o criador de 007, também ele antigo espião mas na vida real, escreveu o primeiro livro em Portugal, no Estoril. Certamente inspirado pelo ambiente que aí se viveu durante a 2ª Guerra Mundial.

Bem, perguntam vocês: “o que tem isto a ver com viagens?”.

Pois outra das minhas paixões e local onde vou recorrentemente é a Serra da Arrábida. Daí a misturar as duas coisas foi um passo.

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Palácio da Comenda de Monguelas
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Palácio da Comenda- antes da reconstrução

 Depois, a crónica final foi ainda completada com a história muito curiosa e interessante do Palácio da Comenda de Monguelas (então em ruínas mas actualmente recuperado) ou do forte da 7ª Bataria de Artilharia de Costa, património deixado ao Deus dará por um Estado que muito mal cuida do que é de todos, e que tem uma vista sobre o estuário do Sado, Setúbal e Tróia de enorme beleza.

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Forte 7ª Bataria
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Vista do estuário do Sado e 7ª Bataria
A ESCOLHA DO CAMINHO

Pelos exemplos se pode ver que a escolha de um destino pode ter origem nas coisas mais variadas. Basta um detalhe que me capte a atenção e me faça ir à procura. Que me estimule a curiosidade e tenha algo para contar.

Consequência lógica é que, na minha mente, uma parte importante da história que depois contarei – seja na Andar de Moto ou nas redes sociais – já está esboçada.

Falta o segundo passo: a escolha da rota. Porque nas viagens de moto não é o caminho mais curto que interessa. Duas palavras definem o que então procuro: “sinuoso” e “montanhoso”.

Traduzindo, quero estradas com curvas e contra-curvas, com subidas e descidas. Ou seja, as nossas belas (e muito frequentemente mal tratadas) estradas nacionais e municipais.

O primeiro passo é abrir uma daquelas vetustas instituições caídas em desuso pelas novas tecnologias: o velhinho Mapa das Estradas.

O Google Maps e outras ferramentas do género são óptimas para vermos o detalhe. Mas a “big picture” só através de um belo mapa estendido na mesa da sala!

Aí se começa a esboçar a rota. Seja porque tenho o primeiro vislumbre de que estradas quero percorrer, como também quais os lugares por onde vou passar. Que também têm a sua história própria e quantas vezes tão ou mais interessante.

Quais as fontes a que recorro habitualmente, para lá dos mapas?

O Google e a Wikipédia são óptimos auxiliares para começar a delinear o roteiro.

Também a literatura portuguesa. Nos clássicos, de Ramalho Ortigão – “Pela Terra Alheia” – a José Saramago – “Viagem a Portugal – não esquecendo o “Viagens na Minha Terra” de Almeida Garrett. Ou outros autores contemporâneos, com o devido cuidado de procurar não reproduzir o que já foi feito. Revistas de viagens são também uma boa fonte de recolha de informação.

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Ferramentas para preparação de viagens – Mapas, livros, gps, computador

Mas sobretudo….estar sempre atento no dia a dia. Porque a ideia pode vir de um noticiário, de uma entrevista ou até, quem diria, de um daqueles programas “pimbas” que animam as tardes televisivas e que num momento de zapping nos podem acordar os sentidos.

Na fase em que o trajecto está esboçado, é fundamental dar-lhe um formato. Chama-se GPX e é a extensão que identifica um ficheiro pronto a ser carregado no GPS. Constrói-se passo a passo através de programas a isso destinados. No meu caso uso habitualmente o site AllTrails. No final exporto para o TomTom Rider. E pronto…

Construído o roteiro e deixando algum espaço à inspiração do momento, falta depois montar a logística: moto pronta, alojamentos se for o caso (tanto pode suceder que leve a reserva feita como fazê-la quase no momento graças às modernas tecnologias que muito facilitam neste capítulo). E a bagagem estritamente necessária, naturalmente!

A CAMINHO

Esta é a fase em que respondemos afirmativamente às três questões: sei onde quero ir, consigo fazê-lo… e nada me impede!

Como referi algures aí atrás, não gosto de surpresas. É uma questão de feitio… Por isso tento planear os timings da viagem. Sem excessos de rigor mas de forma a permitirem atingir os objectivos sem correrias.

Uma lição já aprendi: parar nos pontos de interesse, nos pré-definidos e nos que vão surgindo demora algum tempo; se lhe adicionar o tempo para fotografar (escolha de planos, da melhor luz, evitar transeuntes, etc.) a demora duplica; e se a tudo isto acrescentar filmagens, então o consumo de tempo cresce exponencialmente. Se não for devidamente antecipado…o final do dia tende a ser dramático! Falta tempo e algo vai ficar para trás….

Por outro lado, o excesso de planeamento retira espontaneidade e prejudica as interacções com as pessoas dos locais por onde passamos. E isso é demasiado prejudicial para o resultado final.

Ou seja, mais vale chegarmos ao final do dia com tempo de sobra que poderemos aproveitar para descansar ou procurarmos algo de diferente…e no fundo desfrutar também do caminho. Porque de moto, o caminho é essencial para o prazer da viagem. Por isso o escolhemos com tanto cuidado.

E DEPOIS?

Chegado a casa, “desmontada a loja”, é importante sistematizar o material recolhido – fotos, filmes, apontamentos – e passar à fase solitária da escrita. A escolha das palavras que consigam transmitir as sensações vividas. Como se o leitor tivesse viajado connosco “à pendura”…

Se se consegue? Quero acreditar que umas vezes sim e outras nem tanto. Seja como for…venham daí! Porque o importante é sair porta fora, montar a moto e seguir viagem. Pode ser só ao virar da esquina ou mais além.

O que não falta por aí são histórias, contos, lendas que nos surpreendem, paisagens que nos maravilham e pessoas com experiências de vida que nos enriquecem só por falarmos com elas.

‘Bora lá!

 

(crónica publicada originalmente na revista Andar de Moto  #42 – Novembro 2021)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Por Este Rio Acima

Há uns anos que acalentava o desejo de voltar a percorrer as 15 travessias do Tejo.

A primeira vez foi há 5 anos mas tinha faltado qualquer coisa…que importava completar: unir a foz do rio até ao ponto onde passa a ser exclusivamente português.

Assim nasceu o “POR ESTE RIO ACIMA”.

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NOTA PRÉVIA:

“POR ESTE RIO ACIMA” foi o regresso às 15 travessias do Tejo. Curiosamente, cerca de duas semanas depois, descobri que afinal há uma 16ª. Original e diferente…mas está lá! É isso que vos conto no final da crónica deste desafio.

 – A ESTRADA AGUARDAVA… –

8.30h da manhã! À minha frente, na outra margem, a Cova do Vapor. Um pouco à direita (a jusante, em linguagem de rio…) o ilhéu do Bugio. Para o outro lado (a montante), lá ao longe e ainda envolta por alguma neblina matinal, a Ponte 25 de Abril. A primeira da viagem…

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Foz do Tejo – 25 Abril lá longe

Esperavam-me mais de 400km. Não era distância que assustasse…mas o ritmo seria lento pelo tipo de estradas a percorrer e por nelas atravessar inúmeras localidades. A expectativa seria de cerca de 8 horas de condução, às quais teria que adicionar as óbvias paragens para fotografias, reabastecimento de homem e máquina, etc. No total, foram quase 12 horas. Ainda assim, por este prisma, o desafio não era assim tanto.

Desafio que é desafio tem que ter uma componente de imprevisibilidade. Não alinho na basófia que “desistir não é opção!”. Aliás, aqui só existem duas opções: é fazer ou desistir. Porque não procuro riscos que se sobreponham ao prazer de viajar e de conduzir moto. Cumprir o desafio é…fazer!

Para apimentar a coisa, a data escolhida antecipava uma das maiores canículas deste Verão. Promessa cumprida pelo S. Pedro, esse meu inimigo figadal! A partir de Santarém, o termómetro não baixou dos 40º, com um largo período nos 42º….

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42º em Vila Nova de Barquinha

E, para que a coisa ainda tivesse mais piada, nada como levar uma moto improvável. Nada de maxi-trails. Nem de turísticas preparadas para palmilhar milhares de quilómetros. Nada disso. A moto improvável foi uma Suzuki Katana! 

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Suzuki Katana

Assim já tinha condimentos para o desafio. Só não lhe antecipava a dificuldade…

Esperavam-me as 15 travessias que o Rio Tejo tem: 13 pontes e 2 barragens.

Dessas 13, 10 foram construídas para a finalidade rodoviária, sendo a mais antiga a de Abrantes – inaugurada em 1870 – e a mais recente a das Lezírias – de 2007. Outras 3 eram de inicio ferroviárias e, depois de desactivadas, passaram a servir o trânsito automóvel: a das Mouriscas de 1881, a de Constância de 1888 e a de Muge de 1904. Passaram para rodoviárias respectivamente em 1992, 1988 e 2001. No total, 5 pontes do Sec XIX, 6 do Séc XX e 2 já no novo milénio.

As barragens cujo paredão permite a passagem, as únicas do Rio Tejo em território nacional, são as de Belver e Fratel, construídas respectivamente em 1952 e 1973. 

– A CAMINHO –

Saida às 8:30, como referi, tomei o caminho mais rápido para a primeira travessia: a Ponte 25 de Abril. Podendo fazê-lo junto ao Tejo, pela Marginal, optei pela A5 junto ao Jamor. Evitava portagens (algo a que só recorri quando não havia alternativa) e também a maior densidade de trânsito que, por ser dia de semana me poderia atrasar logo ao início.

Assim foi. Passado pouco tempo estava a passar a 25 de Abril. O panorama visto do seu tabuleiro é deslumbrante. Inaugurada em 1966 – 6 de Agosto – une as duas margens no ponto do estuário chamado “gargalo do Tejo”. Obra fundamental para toda a região que antes estava limitada à travessia fluvial, desde logo se tornou um dos ex-líbris da capital. Muitos anos mais tarde (embora o previsse desde o início) tornou-se também ferroviária. Com uma extensão de 2,3km e 190m de altura é uma das maiores do mundo com a sua tipologia: ponte suspensa.

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25 Abril – margem direita
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25 de Abril – margem esquerda

Segui pela A2 até ao Casal do Marco e tomei a EN10 até à Quinta do Conde onde virei para a A33 que me conduziu até à travessia seguinte: a Ponte Vasco da Gama.

A reentrada em Lisboa valeu atravessar aquela que é a mais extensa ponte da Europa – 17km – e uma das maiores do mundo e…pagar a primeira portagem do dia. Inaugurada a tempo da Expo98, tenho o privilégio de a ver todos os dias da janela de casa. Quase faz parte da família…

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Ponte Vasco da Gama
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Ponte Vasco da Gama 

Daqui, IC2, A1 e EN10 (novamente … esta estrada tem um percurso muito sui generis) até Vila Franca de Xira.

Esperava-me a Ponte Marechal Carmona. Inaugurada em 30 de Dezembro de 1951, teve a primeira portagem em Portugal, pois o Governo de então assumiu que deveria ser paga pelos seus utilizadores. Assim que ficou paga…a portagem extinguiu-se! Estranho…. 

Tem pouco mais de 1,2km de extensão e custou, à época, o que hoje seriam 650 mil euros. Teve um papel fundamental nos acessos entre o sul e o norte do País e o acesso a Lisboa (a 25 de Abril surgiu 15 anos depois!).

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Ponte Marechal Carmona

Aqui terminou a primeira parte do percurso ao longo do Tejo. Pelas suas características, chamar-lhe-ei “Urbano”, porque na realidade, o rio banha nas suas margens parte significativa da malha urbana da área metropolitana de Lisboa.

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Rio Tejo

Atravessado o rio para a margem esquerda, iniciei o percurso que designarei “Lezírias” e que se prolonga até Constância….lá chegarei!

Em Samora Correia apanhei a EN118 que me irá acompanhar até ao final do dia de forma intermitente, pois dela sairei e depois voltarei sucessivamente. Começa no Montijo, termina em Alpalhão e acompanha a margem esquerda do Rio Tejo. Não sendo particularmente interessante do ponto de vista de condução (exceptuando as curvas do Tramagal) tem pormenores de paisagem muito bonitos.

Poucos quilómetros adiante, o acesso à A10 que me levaria até à Ponte das Lezírias, a mais recente de todas que percorri.

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Ponte das Lezírias

Com 12km de extensão é a 3ª maior da Europa e, curiosamente, faz a travessia sucessiva de 2 rios: o Tejo e o seu afluente Sorraia. Neste pequeno percurso paguei a 2ª portagem do dia.

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Ponte das Lezírias

Saí de imediato no nó do Carregado, rumo a Vila Nova da Rainha e Azambuja, e um pouco mais à frente virei em direcção a Valada do Ribatejo. O objectivo situava-se 3 km mais à frente desta simpática povoação ribeirinha: a Ponte Rainha D. Amélia. 

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Ponte Rainha D. Amélia

Também conhecida como Ponte de Muge, datada do início do século passado como ferroviária e convertida à rodovia em 2001, tem sentido único alternado e foi o primeiro exemplar típico da “Arquitectura do Ferro” que atravessei. Outras se seguiram a partir daqui.

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Ponte Rainha D. Amélia

Pouco adiante, em Muge retomei a EN118 até à A13 e à Ponte Salgueiro Maia. Com 4,3km, inaugurada em Junho de 2000, fica situada a jusante de Santarém. Tem a curiosidade de não ser iluminada para não interferir com um aeródromo nas proximidades….

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Ponte Salgueiro Maia

E assim cheguei à “Capital do Gótico”, Santarém!

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Rio Tejo e Santarém lá ao fundo

Sobranceira ao Tejo, com a vista das “Portas do Sol”, tão magnífica quanto famosa , atravessei a cidade e rumei à ponte que leva o seu nome…mas que de facto se chama Ponte D. Luis I.

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Ponte D. Luís I

Mais uma ponte de ferro. Inaugurada em 17 de Setembro de 1888, tem o comprimento de 1.263m.

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Rio Tejo em Santarém

E como gostamos muito de nos “posicionar” no mundo…cumpre dizer que à data da sua construção era a maior da Península, a 3ª da Europa e a 6ª do mundo… Esta tendência para “o melhor” ou “o maior” da nossa rua não justificaria um Livro de Recordes com marca de cerveja nacional? Fica a sugestão!

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Santarém ficou para trás

Alpiarça e Chamusca ultrapassadas, cheguei à Ponte da Chamusca (famosa por uns “achamentos” recentes…). De seu nome Ponte Dr. João Joaquim Isidro dos Reis, fica a meio caminho entre aquela vila e a Golegã.

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Ponte da Chamusca
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Ponte da Chamusca – pormenor
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Ponte da Chamusca

Na Golegã esperava-me um companheiro que simpaticamente se ofereceu para me acompanhar neste pedaço do percurso. Residente em Vila Nova da Barquinha, o António Rebelo foi o meu companheiro no almoço ligeiro, na sua terra. Umas belas bifanas, num local muito recomendável:

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E depois, foi o meu cicerone até ao espectacular Castelo de Almourol. E no final acompanhou-me até ao Tramagal.

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Castelo de Almourol

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Castelo de Almourol

Daqui seguímos para Ponte de Constância, ele na sua Africa Twin preta (algo familiar esta moto…) e eu na Katana.

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As motos…
– POR FALAR EM MOTOS –

 Neste ponto já tinha percorrido mais de 200km e faltavam 7 travessias. E ainda não falei da minha companheira.

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Quando surgiu a oportunidade de levar esta moto fiquei algo apreensivo. A sua configuração poderia ser algo dolorosa para as minhas costas que já conheceram melhores dias. Puro engano! O encaixe foi perfeito, a posição elevada do guiador transmite confiança na condução e acima de tudo, naturalidade na postura, que não castiga nem a “espinha” nem os pulsos.

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Suzuki Katana

A protecção aerodinâmica é suficiente para as velocidades praticadas. Efectivamente o pequeno deflector por cima da óptica cumpre a sua missão. A velocidades para lá dos máximos legais (em autoestrada, por exemplo)…não há milagres.

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A Katana e o Castelo de Almourol

Esta não será a moto ideal para estas viagens porque não tem capacidade de carga…e será pecado mortal adaptar-lhe malas ou caixotes. Fracamente…ela não merece que lhe estraguem a beleza das linhas. E digo isto porque ao natural é muito mais bonita do que as fotos mostram. Opinião subjectiva, eu sei!

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Suzuki Katana

O principal defeito que lhe encontrei foi a autonomia. Não porque seja esbanjadora do líquido precioso – fiz no total da experiência mais de 700km e média de 5,1l/100 – nada disso, mas sim porque o depósito é pequeno. 12 litros dizem, mas o máximo que lhe consegui meter foram 10l e tinha autonomia para 20 km nessa ocasião. Torna-se incómodo estar a fazer paragens para reabastecimento e é aconselhável planear o percurso para não haver azar.

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Um gesto frequente

Em andamento? Talvez pelo seu comprimento ou p ela diferença de largura dos pneus (atrás um ambicioso 195) a inserção nas curvas não será a mais linear mas, com o hábito, não constituiu qualquer problema. Agora à saída…meus amigos!!! Os mais de 130cv, um pneumático daqueles e um motor com binário que nunca mais acaba é absolutamente fantástico. O 4 cilindros sobe desde as 3000rpm sem qualquer hesitação até quase ao infinito, sendo que o infinito – o red line – está nas 11500! Nas mudanças superiores provoca aquela adrenalina que gostamos. E nas mudanças baixas, saímos das curvas que nem um foguete…e com uma banda sonora a sair do escape a condizer.

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A marca e o símbolo…

A análise completa à Suzuki Katana está em: SUZUKI KATANA – Por fim a lenda voltou a ser realidade

– DE VOLTA À ESTRADA –

A travessia que se seguiu foi a Ponte de Constância (ou da Praia do Ribatejo). Mais uma antiga ponte ferroviária, datada de 1888 e onde os comboios passaram até 1959. O seu mau estado de então, levou à construção de uma nova ao lado.

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Descida para a Ponte de Cosntância

Mais tarde, as autarquias de Barquinha e Constância aproveitaram-na para o trânsito rodoviário em 1988. Tem um único sentido alternado e é mais um exemplar da “Arquitectura do Ferro”.

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Ponte de Constância
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Ponte de Constância

O semáforo passou a verde e seguimos rumo ao Tramagal.

Em Constância terminou a parte do percurso que designei por “Lezírias”. A partir daqui, a orografia do terreno torna as estradas mais sinuosas e em permanente sobe e desce. Chamar-lhe-ei “Percurso Serrano”, sendo certo que não alcançamos grandes desníveis a não ser já mais perto do final.

Antes do Tramagal um pequeno aperitivo das curvas e contra curvas que depois me levaram até ao Rossio ao Sul do Tejo. As famosas curvas do Tramagal, que eram em décadas atrás, antes da era das autoestradas, o terror dos viajantes automobilizados.

À saída da cidade do Tramagal, um miradouro dá-nos uma vista magnífica do Tejo e ao longe vislumbra-se a próxima travessia. Foi tempo de despedidas.

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O Rio Tejo no Tramagal
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No Tramagal a selfie da praxe

Fiz-me a caminho, novamente a solo pois o António regressou a casa.

Muito obrigado Amigo! Até à próxima…

A verdadeira diversão começou aqui e só iria terminar (com um pequeno interregno) mesmo no final da jornada. As curvas do Tramagal fazem justiça ao nome. E com bom piso são uma delícia.

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As curvas…da estrada e do rio!

 Assim cheguei ao Rossio ao Sul do Tejo e quando parei para a foto da ponte, encontrei 2 companheiros que estavam em breve descanso. Percorriam a EN2.

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Os dois companheiros da Benedita que estavam a fazer a EN2

Já vos disse atrás que o calor era verdadeiramente tórrido. Os 42º faziam-se sentir ao parar e quando na moto, o “bafo” era diabólico. Não havia água que resistisse (agravado com o facto de não ter muito onde a levar).  

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A caminho do chuveiro…

Surpresa minha, os rapazes, oriundos da Benedita, estavam ensopados. Tive pena deles, pensei. Devem estar a levar uma sova, nos seus fatos. Engano!!! À boa maneira portuguesa, um deles tinha uma habilidade quase milagrosa: sabia ligar a rega do pequeno jardim onde estávamos. Tinham estado a tomar duche…vestidos! Segui o exemplo…2 vezes! Abençoados…

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Duche refrescante e…inesperado!

Quando à ponte de Abrantes, é a mais antiga desta viagem. Inaugurada em 1870, tem um comprimento de 339m. Foi construída por um consórcio francês que a conservou sob exploração até 1945, quando passou para o Estado.

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Ponte de Abrantes
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Ponte de Abrantes
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Ponte de Abrantes
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Abrantes vista da outra margem

Contornei Abrantes até Alferrarede e aqui, uma das surpresas do dia pois cheguei a um troço de estrada que não conhecia. A EN3 que me conduziria até Mouriscas.

 A EN3, como o nome indica, foi estabelecida pelo Plano Rodoviário de 1945 e era, neste, a terceira estrada de Portugal por ordem de importância depois da EN1 (Lisboa-Porto) e EN2 (Chaves-Faro). Começa no Carregado e termina em Castelo Branco. Percebe-se bem a lógica desta estrada projectada como sendo a principal via transversal do País (por curiosidade, a EN 4 vai de Lisboa a Elvas). As autoestradas e a falta de visão levaram a que esta estrada esteja hoje toda desmembrada e em alguns troços desapareceu mesmo (mais à frente falarei nisso).

Mas se toda a EN3 fosse como este pedaço que percorri…só vos digo: um deleite de condução!

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Ponte das Mouriscas

Em Mouriscas, tomei a EN358 e fiz a 11ª travessia da jornada: a Ponte das Mouriscas. Também apelidada de Ponte do Pêgo ou Ponte Rodoferroviária de Alvega. A ponte actual, com dois tabuleiros paralelos, rodo e ferroviário, data de 1992. Mas a ponte original, para comboios, foi construída em 1881.

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Ponte das Mouriscas

Novamente na EN118, passei Alvega (sempre a memória do famoso Major Alvega…) e Casa Branca onde virei para a primeira Barragem a atravessar: a de Belver.

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Rio Tejo. A caminho da Barragem de Belver

Construída em 1952 e, conjuntamente com a do Fratel que atravessei depois, são as únicas do Tejo em Portugal. Destinada à produção eléctrica, está dotada de uma pequena eclusa para a passagem dos peixes que irão desovar mais a montante mas que consta não ser verdadeiramente eficaz.

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Barragem de Belver
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Barragem de Belver

Na sua albufeira, num pequeno braço de rio logo a seguir ao paredão e na margem direita, está a Praia Fluvial da Ortiga. Aprazível com vegetação frondosa foi uma tentação…

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Praia Fluvial de Ortiga

Continuei em registo de curva e contra curva até chegar a Belver. O Castelo é imponente.

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Castelo de Belver

Situado num monte fronteiro à vila, dum lado, e com o Tejo aos seus pés. Magnifica paisagem.

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Belver e o seu Castelo

Belver tem a característica única de, por pertencer ao concelho de Gavião, ser a única parcela do Alentejo na margem direita do Tejo. Percorridas as ruas estreitas e em empedrado, inicia-se a descida para a Ponte de Belver. O cenário é fantástico.

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Belver
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Ponte de Belver

Inaugurada em 1907 e recentemente restaurada, tem no seu final um acesso ao passadiço em madeira que ao longo de quase 2km na margem do rio, nos leva até à Praia Fluvial do Alamal.

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Rio Tejo – Albufeira de Belver – Praia Fluvial do Alamal e passadiço
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Belver e o Tejo em contraluz

O troço de estrada que vai da Ponte de Belver até à sede de concelho, sinuoso e a subir, deixou-me novamente na EN118. O pedaço que se seguiu, ao longo de quase 20km é sempre a direito. Com rapidez encontro o IP2 perto de Arez.

Hora de decisões!

– O FINAL DA JORNADA –

Um pouco antes de Arez, a EN118 entronca no IP2. Em frente, para Nisa e a EN18, à direita rumo a Portalegre e à esquerda, para a Barragem do Fratel, a penúltima travessia. O final estava próximo.

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Barragem do Fratel

Esta Barragem, construída em 1973, é fundamental tal como a de Belver que passei antes, para o controlo do caudal do Tejo para lá da produção de electricidade. E talvez tenha sido, na época da sua construção, este o aspecto principal para o projecto ir em frente porque submergiu um núcleo importante de pinturas rupestres e ainda um troço do muro de sirga do Rio Tejo.

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Depois da Barragem do Fratel, o Tejo segue o seu curso…

É também um ponto de passagem obrigatório para quem vem de norte, Beira Alta e Beira Baixa, pela A23 e aqui inflecte rumo a sul.

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Barragem do Fratel

Neste ponto decidi reflectir sobre o caminho a seguir. O objectivo era a última travessia, a Ponte de Ródão. Tinha duas formas de lá chegar:

– a primeira, que era o caminho previsto, implicava seguir pela A23 (porque esta se sobrepôs à antiga EN3 que desapareceu em alguns troços não deixando alternativa), sair para Fratel (obviando o pagamento de portagens), retomar a EN3 até esta encontrar a EN241 perto do Cerejal e então descer em diracção a Vila Velha de Ródão  e ao rio. Seriam cerca de 30 km, não muito interessantes, diga-se.

– a segunda, subverter o principio da alternância de margens, regressar até ao cruzamento de Arez, aqui virar para Nisa e de seguida pela EN18 até à Ponte de Ródão. Percurso  por estrada, com a enorme vantagem de percorrer integralmente o troço de 18k da EN18 da Serra de Nisa (um dos bons pedaços de estrada de curvas que conheço) até à Ponte de Ródão. 34km no total, um pouco mais que a primeira opção, mas muito mais divertido.

Já perceberam, optei pela segunda. E não me arrependi como vos contarei. 

Deleitado com a EN18 cheguei ao espectacular cenário da Ponte de Ródão.

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Ponte de Ródão
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Ponte de Ródão

Inaugurada em 1888, mais uma ponte centenária e que sempre foi essencial na ligação da Beira ao Alentejo e vice-versa.

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Ponte de Ródão

Acresce ainda a magnífica vista do rio e da garganta natural que ali o aperta no seu curso: as Portas de Ródão.

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Portas de Ródão

As 15 travessias estavam concluídas!!!

Faltava apenas o troço final até ao ponto onde o Tejo é exclusivamente nosso: a Barragem de Cedillo.

A tarde ía já avançada, o cansaço atacava e somava-se também alguma desidratação. O calor, que ainda permanecia nesta altura, tinha sido violento ao longo de quase toda a jornada. O que implicava cuidados redobrados na condução pois a forma fisica já não era a melhor.

Alguns minutos de descanso, até porque tinha que atravessar a passagem de nível da Linha da Beira Baixa e esta estava fechada para o Intercidades rumo a Lisboa. 

Caminho desimpedido, regressei por onde tinha vindo: EN18. Mas desta feita apenas até metade do caminho pois virei à esquerda em direcção a Vinagra, Pé da Serra, Salavessa e Montalvão. Estradas municipais, estreitas mas em bom estado. Sinuosas, pelo meio da serra de Nisa. E sem trânsito. A desertificação do interior é uma realidade. Quase não se vê vivalma.

A partir de Montalvão, 7km a descer até à Barragem de Cedillo.

Esta é uma barragem curiosa. É totalmente espanhola, mas as suas duas extremidades estão assentes em território português. Situa-se no preciso local em que o Rio Sever desagua no Tejo, pelo que a albufeira se espraia pelas bacias dos dois rios. Estamos na fronteira com Espanha e parte do tabuleiro é atravessável, permitindo a entrada no país vizinho….mas só ao fim de semana!

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Barragem de Cedillo
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Barragem de Cedillo

Estava concluído o desafio. O POR ESTE RIO ACIMA chegava ao fim.

Eram quase 20h e ainda fazia calor. O dia tinha sido tórrido, o que tornou a jornada que no papel não era complicada, num verdadeiro desafio à minha resistência física. Se durante o dia bebi bastante água…depois de concluído, à chegada a casa (aqui ainda me faltavam 30km) bebi muito mais. estava verdadeiramente desidratado.

Mas um desafio só o é, se for difícil. E as coisas fáceis não têm o mesmo sabor.

Quando à minha fiel companheira? Pois, como se nada fosse com ela! Impávida e serena, como quem pede mais…

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A Katana junto à Barragem de Cedillo (para lá do portão é Espanha)

A Suzuki Katana foi uma belíssima opção pois o seu conforto tornou o percurso muito mais suportável. Diga-se que a maior parte do percurso teve asfalto em bom estado. Porque quando fica irregular e saltitante, a moto tem mais dificuldade pois as suspensões são bastante firmes. Um pequeno senão que é mais que compensado com a segurança e aprumo com que se lança às estradas mais sinuosas.

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A Suzuki Katana no final de Por Este Rio Acima

Quando passado uns dias a entreguei…deixou saudades!

E pronto! …Está concluído este desafio de Viagens ao Virar da Esquina!

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O Tejo e as suas travessias: POR ESTE RIO ACIMA
NOTA

Este é o texto original que, depois de editado e resumido por limitações óbvias de espaço, foi publicado a 31 de Julho na Revista Motojornal. Pode ser lido em“VVE na Imprensa”

Motojornal#1488
Motojornal #1488 – 31 de Julho 2020
– A 16ª TRAVESSIA –

Duas semanas depois do POR ESTE RIO ACIMA, descobri por mero acaso a 16ª travessia do Tejo.  Fica no sítio apropriadamente chamado Barca do Tejo, junto à aldeia de Amieira do Tejo.

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A Amieira é uma terra ancestral com muita história, com um orgulhoso castelo que desempenhou papel fundamental na defesa do Tejo e também de Portugal.

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Por ruas estreitas chegamos ao Castelo da Amieira

É monumento nacional e foi mandado construir pelo Prior do Crato no século XIV , o pai de Nuno Álvares Pereira.

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Castelo de Amieira do Tejo
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Castelo de Amieira do Tejo

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Amieira do Tejo – Igreja do Calvário

Descemos cerca de 3km de estrada asfaltada mas estreita, em que a aproximação ao Tejo tem enorme beleza.

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Rio Tejo
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A descer para o Rio Tejo
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Rio Tejo

Lá chegados a travessia faz-se…por barca!

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A nova Barca d’Amieira
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A nova Barca d’Amieira

A barca (esta é moderna pois a nova travessia, que evoca uma muito antiga, foi inaugurada em Setembro de 2019) permite o tráfego entre a Barca de Amieira e S. José das Matas, na outra margem. E a importância desta travessia é maior do que à primeira vista pode parecer: Em S- José das Matas fica o apeadeiro de Amieira do Tejo – Envendos da linha de caminho de ferro da Beira da Baixa.

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Linha da Beira Baixa (aproximação ao apeadeiro de Amieira do Tejo – Envendos)

Tenho que lá voltar numa próxima oportunidade e experimentar a travessia na barca. Mas fica o registo para quem queira aproveitar.

AGRADECIMENTOS

Para terminar, um agradecimento ao representante da Suzuki em Portugal, a MOTEO PORTUGAL, SA que me permitiu experimentar a Suzuki Katana. Foi uma espectacular companheira no “Por Este Rio Acima”!

Devo ainda referir e agradecer a simpatia do concessionário JPM Motos em Frielas.

Finalmente, muito obrigado pelo apoio e a publicação na Motojornal (revista #1488 de 31 de Julho). Pode ser lido em “VVE na Imprensa”

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse… (final)

15 travessias do nosso maior rio, o Tejo, de Lisboa até à ponte de Ródão que une a Beira ao Alentejo com o rio como testemunha.

15 travessias de Lisboa a Ródão

4. Objectivo concluido. O regresso.

Faltava a sobremesa! Falei nela um pouco atrás…

Desde a Ponte de Ródão até Nisa, pela EN18, são cerca de 20 km do melhor que pode haver para fazer de mota. Curvas para todos os gostos, bom piso, pouco trânsito, uma paisagem com uma certa beleza agreste….foi mesmo a cereja no topo do bolo!

E assim chegámos a Nisa. Era tempo de reabastecer as montadas.

Cabe aqui fazer um intervalo na descrição. No início mencionei que se fosse hoje, complementaria o percurso e fá-lo-ia desde a foz (em Oeiras) até ao ponto em que o Tejo passa a ser integralmente português. Esse ponto fica no concelho de Nisa, na fronteira com Espanha e tem uma curiosidade adicional: a barragem de Cedillo (ou embalse de Cedillo em castelhano). Trata-se de uma barragem inteiramente espanhola, cujo paredão faz parte da fronteira e que está construído no local exacto em que o Tejo não só entra em território português (na margem norte já há alguns quilómetros que o é) como também é a foz de um dos afluentes, o Rio Sever que daí para sul separa Portugal de Espanha. É uma barragem que simultaneamente bloqueia a passagem de dois rios, daí a sua curiosidade.

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É possível atravessá-la até metade do paredão e depois tomar a estrada que leva à povoação de Cedillo e daí partir para o interior de Espanha, nomeadamente Cáceres. Todavia, nem sempre esta travessia está aberta ao público pelo que é melhor não contar com ela se o objectivo for prosseguir para Espanha.

De destacar que entre Nisa e Montalvão (EM359-3) temos mais cerca de 20 km de estrada espectacular. Estreita mas com bom piso e com algumas curvas em ângulo recto (entre outras mais ou menos pronunciadas) capazes de nos deixarem com um sorriso de orelha a orelha dentro do capacete! Aqui já se sentirá o cansaço dos quilómetros mas vale a pena. Montalvão é uma pequena povoação que tem um miradouro nas ruínas do seu castelo com uma vista deslumbrante. Podemos ver a Serra de S.Mamede a sul, Serra de Nisa a oeste, Serra da Gardunha (e eventualmente a da Estrela se a visibilidade for óptima) a norte e as serranias espanholas a leste.

De Montalvão à barragem de Cedillo, a estrada é menos interessante, com pior piso e com uma inclinação na aproximação à barragem algo significativa.

Depois, se objectivo for o regresso, é fazer o caminho inverso até Nisa e aí optar pela via mais conveniente. Ou então, em Montalvão rumar a Castelo de Vide e … mais um dia ou dois para desfrutar de tudo o que a região de S. Mamede tem para oferecer: o triângulo Castelo de Vide, Marvão e Portalegre. Asseguro que vale a pena! E que estradas tem…

Feito este pequeno intervalo, voltemos ao nosso relato. Acabámos de abastecer em Nisa e com um simples telefonema, porque não uma visitinha à família? Assim foi. Em Gáfete pudemos descansar um pouco, saborear um lanche com algumas iguarias regionais (esta é a zona do queijo de Nisa e também profícua em enchidos) e finalmente fazermo-nos à estrada de regresso a Lisboa depois de um breve descanso.

Gafete

Desde o início dissemos que iríamos evitar ao máximo as AE. Assim fizemos.

O regresso foi por Crato, Alter do Chão, Ponte de Sor, Montargil, Couço.

Aqui, foi obrigatória uma paragem. Há bastante tempo que viajávamos de noite e a certa altura comecei a ter dificuldade em algumas curvas pois, percebi depois, estava com dificuldades de visão. A estrada, nomeadamente entre Montargil e Couço era bastante escura,  bordejada de árvores e com piso bastante irregular. Algo se passava. Quando parámos e tirei o capacete percebi: a viseira estava totalmente coberta por mosquitos! Dodot em acção, limpeza efectuada, visibilidade óptima e aí vamos nós outra vez: Azervadinha, Coruche (um pouco ao lado) e Infantado. Aqui optámos por entrar por Vila Franca de Xira pelo que tomámos a EN10, pelo Porto Alto. Depois A1 e estávamos em Lisboa. Mais de 700 km depois, cansados, mas mais do que satisfeitos.

E concretizámos a nossa homenagem ao Rio Tejo. Percorremos as suas duas margens, fizémos as 15 travessias entre elas, visitámos as muitas terras que ficam no caminho, vimos paisagens espectaculares e bastante diversificadas e desfrutámos de alguns excelentes troços de estrada a pedirem uma condução um pouquinho mais empenhada. Muito bom!

É evidente que um percurso com esta dimensão, a fazer num só dia, retira a possibilidade de contactos com as muitas pessoas com que nos fomos cruzando. Para tal, seria necessário mais tempo, como é óbvio. A camaradagem entre os companheiros de viagem foi extraordinária…a pedir a repetição em outros projectos e destinos.

O que já aconteceu, obviamente.

Obrigado pela companhia e camaradagem, Filipa, Filomena, Jaime e Nuno!

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Para terminar, o resumo das travessias:

  1.  Ponte Vasco da Gama – km 2
  2. Ponte 25 de Abril – km 62
  3. Ponte Marechal Carmona – km 89
  4. Ponte da Lezíria – km 120
  5. Ponte Rainha D. Amélia – km 150
  6. Ponte Salgueiro Maia – km 172
  7. Ponte de D. Luís – km 180
  8. Ponte João Joaquim Isidro dos Reis – km 210
  9. Ponte da Praia do Ribatejo – km 228
  10. Ponte Rainha D. Leonor – km 248
  11. Ponte das Mouriscas – km 266
  12. Barragem de Belver – km 281
  13. Ponte de Belver – km 294
  14. Barragem do Fratel – Km 314
  15. Ponte das Portas de Ródão – km 341

Anterior:

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(1)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(2)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(3)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse… (3)

15 travessias do nosso maior rio, o Tejo, de Lisboa até à ponte de Ródão que une a Beira ao Alentejo com o rio como testemunha.

15 travessias de Lisboa a Ródão

3 – De Alvega a Nisa. Objectivo cumprido!

Voltamos então à EN118 e logo à localidade de Alvega (sim, tem tudo a ver com o famoso Major Alvega dos livros de histórias aos quadradinhos – a saudosa colecção “O Falcão” – e da mais recente série televisiva… mas esta é uma outra história).

Depois de Alvega, cerca de 6 quilómetros mais à frente em Casa Branca, mesmo dentro da localidade e numa curva apertada à direita, temos a placa que indica a Barragem de Belver (é preciso alguma atenção porque é a única indicação, embora haja uma alternativa alguns quilómetros mais à frente, também ela parcamente sinalizada). E esta travessia será a primeira de duas que não será feita em ponte mas sim pelo paredão da barragem.

A Barragem de Belver, uma das duas situadas no Rio Tejo no seu percurso português , cuja construção foi finalizada em 1952, possui uma altura de 30 m acima do terreno natural e um comprimento de coroamento de 327,5 m. A capacidade instalada de produção de energia eléctrica é de 80,7MW. É dotada de uma pequena eclusa para passagem de peixes mas que consta ser pouco eficaz.

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Na margem norte encontramos uma pequena povoação de casas todas iguais que presumimos seriam as residências dos trabalhadores da central hidroeléctrica mas que os tempos das automações terão afastado, pois a maioria tem o aspecto de estarem desabitadas. Não vimos vivalma e aqui as primeiras hesitações. Convém referir que esta viagem foi efectuada sem qualquer recurso a GPS. E a escala dos mapas não nos dava aqui grande ajuda. Lá encontrámos alguém, montado num “potente” ciclomotor Zundapp ou similar, que nos indicou o caminho através de estradas municipais em direcção a Belver que ficava ali a meia dúzia de quilómetros.

Acercámo-nos de Belver vindos de poente e ao virar de uma curva lá estava: o Castelo de Belver, empoleirado no cimo de um monte fronteiro a outro onde se situa a vila. Lindo! E a merecer uma visita mais pormenorizada noutra ocasião.

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Vila branca, de ruas estreitas, muitas delas em empedrado, onde no alto temos uma vista deslumbrante para o Tejo e a para a ponte que leva o nome da terra e que iríamos atravessar de seguida, Belver é nome a reter.

Descemos para a ponte de Belver, na Estrada Nacional 244, que une Belver a Gavião. Foi inaugurada em 1907, é uma ponte com tabuleiro metálico e tem o comprimento de 239 metros divididos por quatro vãos. À saida da ponte existe um passadiço em madeira com cerca de 3 km que vai dar à Praia Fluvial do Alamal. Uma pérola do Rio Tejo…

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O destino agora era Gavião onde iríamos encontrar novamente a nossa “amiga” EN118. Faltavam-nos agora 2 travessias e o dia já ía longo. Este percurso entre Belver e o Gavião veio-nos alegrar um pouco pois apesar de pouco extenso, tinha alguma condução, com curvas e contra curvas bem encadeadas. Um aperitivo para a sobremesa que teríamos no final…

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Atravessámos Gavião, tomámos a EN118 até ao cruzamento onde esta encontra o IP 2, um pouco antes de Arez (cerca de 20km). Viramos a norte (direcção A23/Lisboa/Castelo Branco), em boa estrada mas que a certa altura nos apresenta uma descida inclinada, com curvas algo perigosas e o barranco à nossa direita. Começamos a ver a albufeira da Barragem do Fratel que rapidamente iremos atravessar para logo, em subida igualmente íngreme, chegarmos ao acesso à A23.

A Barragem de Fratel tem uma altura de 43 m acima do terreno natural e uma cota de coroamento de 87 m. A capacidade instalada de produção de energia eléctrica é de 130 MW.

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A construção foi finalizada em 1973. A albufeira da barragem submergiu uma boa parte dos núcleos de gravuras rupestres do Tejo e um troço do antigo muro de sirga do Tejo.

Para além da sua importância económica na produção de energia eléctrica, esta barragem bem como a de Belver que lhe fica a jusante, têm um papel muito importante na regularização do caudal do rio Tejo e na prevenção/minimização das cheias que ciclicamente ocorrem.

O único troço em AE e com portagem (pórticos) desde que passámos Vila Franca de Xira espera-nos mas que é obrigatório para chegarmos a Vila Velha de Ródão sem nos perdermos numa teia de pequenas estradas locais. Entramos no nó 16 (Gardete) e saímos no nó 18 (Fratel). A aproximação a Vila Velha de Ródão faz-se no sentido norte-sul e atravessamos a vila para nos acercarmos da ponte que une a Beira-Baixa ao Alto Alentejo e que até à recente AE era a única via de comunicação rodoviária entre as respectivas capitais: Castelo Branco e Portalegre. E uma das mais inportantes no interior do País. A A23 e o IP2 retiraram-lhe essa importância e carga rodoviária e atualmente serve praticamente para unir os dois concelhos fronteiros: Vila Velha de Ródão e Nisa.

A ponte de Vila Velha de Ródão é a 15ª travessia e praticamente o final da nossa missão!

Ródão é hoje mais tristemente célebre pelo seu presente ligado às fábricas de celulose, ao cheiro nauseabundo quase permanente e aos episódios de poluição do rio, mas o seu passado é antiquíssimo. Os mais antigos vestígios do passado de Ródão são de natureza geológica e estão datados de cerca de 600 Milhões de anos. Existem fósseis que testemunham a existência de um mar que chegava a Ródão… Muitas outras comunidades se forma estabelecendo por aqui na pré-história tendo deixado a sua marca no complexo de arte rupestre do Tejo, com cerca de 25 000 gravuras.

Os romanos por aqui andaram também, principalmente para explorarem a extração de aluvião de ouro e cobre. A navegabilidade do Tejo foi sempre fundamental para o desenvolvimento de intensa actividade económica nomeadamente pelo Porto do Tejo que dava passagem a uma estrada comercial e pastoril, fundamental para assegurar o fluxo de mercadorias do interior para o litoral e do litoral para o interior e que tinha em Ródão o seu local privilegiado. Até ao Porto do Tejo chegavam as embarcações que subiam o rio, auxiliadas pela força humana e de bestas que ajudavam a vencer os rápidos, usando para tal os muros de sirga que ladeiam as margens do rio.

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Estrategicamente, a sua localização era também fundamental. E aqui sobressai inevitavelmente o monumento natural que são as Portas de Ródão. Duas muralhas rochosas que estreitam e apertam o curso do rio e cuja vista da ponte que iremos atravessar é espectacular. Não entrando já na ponte, é possível por um caminho à sua direita encontramos um ponto onde a vista para a ponte e para as Portas de Ródão é espectacular. E ainda mais se subirmos um pouco mais, até ao castelo de Ródão, torre de vigia no alto das Portas… imperdível!

A Ponte de Portas de Ródão ou Ponte de Ródão fica na Estrada Nacional 18 em Portas de Ródão. Foi inaugurada em 1888, é uma ponte com tabuleiro metálico e tem o comprimento de 167 metros, apoiada em dois pilares centrais de granito. Foi alvo de obras de beneficiação concluídas em 1996. As vias de rodagem ocuparam o antigo espaço dos passeios e alargou-se o tabuleiro para criar novos passeios para peões com 75 cm de largura.

Atravessámos e estava concluído o nosso objectivo. 15 travessias, efectuadas alternadamente de norte para sul e vice versa, 13 pontes e 2 barragens. Nesta altura estávamos quase a perfazer 400 km, a tarde aproximava-se do seu fim e era tempo de regressar pois não pretendíamos pernoitar no caminho.

Anterior:

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(1)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(2)

A seguir:

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(final)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse… (2)

15 travessias do nosso maior rio, o Tejo, de Lisboa até à ponte de Ródão que une a Beira ao Alentejo com o rio como testemunha.

15 TRAVESSIAS DE LISBOA A RÓDÃO

2 – De Muge a Alvega, subindo o Tejo!

Tínhamos passado Muge. Pouco mais de uma dezenas de quilómetros adiante ficava a Ponte Salgueiro Maia. Está situada junto ao Vale de Santarém, a jusante desta cidade, no IC10 e tem um comprimento total de 4,3km (ponte e viaduto).

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O nome da ponte é uma homenagem ao Capitão de Abril. Foi inaugurada a 11 de Junho de 2000 e, curiosamente, não é iluminada porque a luz iria interferir com um aeródromo situado nas imediações!

Passada a ponte era tempo de chegarmos a Santarém, cidade antiquíssima, segundo a mitologia por ela terão passado Fenícios e Cartagineses, os Romanos chegaram a ela em 138 a.C. e antes da reconquista por D. Afonso Henriques em 1147, a cidade foi sede de um pequeno emirado independente: a Taifa de Santarém. Não nos detivémos mas passámos pelo seu centro e ao lado das famosas “Portas do Sol”. Descemos para a Ponte de Santarém, a nossa 7ª.

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A Ponte D. Luís I, também chamada Ponte de Santarém, une Santarém a Almeirim pela EN 114. Foi inaugurada em 17 de Setembro de 1881, e foi considerada na altura a maior da Península Ibérica, a terceira da Europa e a sexta do Mundo, ficando como um dos exemplares da “arquitetura do ferro”. Tinha originalmente um comprimento total de 1213 m, largura de 6 m, e altura de 22 m. Foi alargada em 1956.

Santarem

Pouco depois da saída da ponte, virámos à esquerda em direcção a Alpiarça pela EM368-1 onde iríamos tomar novamente a EN118.

O objectivo era a Chamusca onde teríamos, meia dúzia de quilómetros mais à frente, a nossa última travessia da manhã (que já ia avançada) pois o almoço aguardava-nos na Golegã. Ainda na Chamusca fizemos um pequeno desvio para podermos desfrutar da vista do vale do Tejo no Miradouro da Senhora do Pranto.

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A Ponte João Joaquim Isidro dos Reis, conhecida popularmente como Ponte da Chamusca, está localizada sobre o rio Tejo na Estrada Nacional 243 e une a vila de Chamusca com a vila da Golegã.

Esta estrutura é um exemplar emblemático da construção em ferro, muito em voga no final do século XIX e no início do século XX. Apesar de inicialmente (em 1900) prevista para ser ferroviária, fazendo parte do novo ramal de Torres Novas à Golegã, este nunca chegou a ser construído. Assim, em 1908 iniciou-se a sua construção já como ponte rodoviária e pedonal, tendo sido inaugurada em 31 de Agosto de 1909.

E assim chegámos à Golegã. 8 travessias concluídas ficavam as restantes 7 para a jornada da tarde. O nosso destino era agora a Adega do Cú da Mula onde nos desforrámos da canseira matinal saboreando algumas especialidades da casa. Tempo ainda para tomarmos um café na esplanada do Café Central em cujo interior pudemos ver muitos cartazes de touradas no qual o protagonista principal era um homem da terra: Ricardo Chibanga.

Golegã

Feitas as homenagens e restabelecidos os niveis alimentares (sólidos e líquidos, que a desidratação é perigosa para os motociclistas) era tempo de voltarmos à estrada e procurarmos a próxima travessia: a ponte de Constância. Rumámos a Vila Nova da Barquinha, rondámos Tancos e chegámos a Constância.

A Ponte da Praia do Ribatejo ou Ponte de Constância, liga as estradas nacionais EN3 e EN118, unindo Praia do Ribatejo ao município de Constância. Inaugurada em 1889, inicialmente era uma ponte ferroviária. Em 1959, devido ao mau estado da estrutura, a CP construiu outra ao lado, assente sobre os mesmos pilares. A linha abandonada foi cedida às câmaras de Vila Nova da Barquinha e Constância que a adaptaram a ponte rodoviária, inaugurada em 1988.

Em Novembro de 2007 esteve encerrada devido a um deslizamento do tabuleiro. Em 20 de Julho de 2010 foi novamente encerrada por razões de segurança, sendo de novo reaberta em dia 6 de Abril de 2011.

Ponte de via única, com trânsito alternado e gerido por cancela e semáforos, foi precisamente o local onde a embraigem da BMW deu de si. Voltámos a atravessar a ponte para tentar em Constância alguma forma de solução.

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Depois de várias tentativas, não foi possível e os nossos companheiros regressaram a Lisboa, pela A23, na única mudança que conseguiram engrenar… Pela nossa parte, retomámos o percurso, novamente pela ponte de Constância, voltámos à nossa bem conhecida EN118 – cabe aqui dizer que fazer esta estrada de fio a pavio, o mesmo será dizer do Montijo a Alpalhão, é projecto futuro – com rumo ao Rossio ao Sul do Tejo para aqui entrarmos na cidade de Abrantes pela ponte que lhe leva o nome: a nossa 10ª travessia.

Ainda antes passámos no Tramagal, importante núcleo industrial do sector da metalo-mecânica (mais do passado que do presente) e também nas famosas “curvas do Tramagal”, terror das viagens automóveis dos anos 60 a 80 do século passado quando a EN118 era o principal eixo viário de Lisboa para as Beiras e Alto Alentejo. Agora…momentos de grande diversão… quem diria?

O Rossio ao Sul do Tejo é uma pequena povoação fronteira a Abrantes e separadas pelo Rio Tejo. Desfruta de uma localização estratégica pois é o cruzamento de duas das maiores estradas nacionais: a EN2, a maior de todas e que cruza o país de norte a sul, e a EN118 que o atravessa de forma transversal desde as proximidades de Lisboa até perto da fronteira com Espanha.

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A Ponte rodoviária de Abrantes sobre o rio Tejo foi inaugurada em 1870, tem o comprimento de 339 metros e liga Abrantes ao Rossio ao Sul do Tejo. Foi construída por um consórcio francês e durante 75 anos foi explorada em regime de concessão, passando para o estado em 1945. Pouco antes de perfazer 100 anos o tabuleiro foi alargado. No nosso périplo, foi a única ponte onde encontrámos restrições de trânsito devido a obras de manutenção. Em 1889 foi também inaugurada a ponte ferroviária de Abrantes.

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E cabe aqui uma chamada de atenção para quem resolva seguir esta nossa sugestão: é aconselhável que tente informar-se previamente das condições de circulação nestas pontes. A maioria são pontes centenárias que justificam regulares obras de manutenção. Por exemplo, já depois do nosso passeio, a ponte de Belver (onde ainda iremos passar) esteve encerrada ao trânsito durante cerca de 2 anos estando já reaberta e recentemente a ponte de Constância também. É evidente que haverá sempre a alternativa de seguir em frente e atravessar na próxima…mas não é a mesma coisa!

Atravessada lentamente a ponte, devido às obras, entrámos em Abrantes e até Alferrarede percorremos um curto trecho da EN2.

Mais antiga que a nacionalidade, Abrantes é cidade desde 1916, tendo o seu foral sido concedido por D. Afonso Henriques em 1179. Em 1807, aquando das invasões francesas, Abrantes foi ocupada pelas tropas do General Junot a quem, na ocasião, Napoleão Bonaparte concedeu o título de Duque de Abrantes. Breve honra, felizmente!

Depois de Alferrarede rumámos à localidade de Mouriscas onde tínhamos a próxima travessia.

A Ponte Rodoferroviária de Alvega ou Ponte do Pego ou ainda Ponte das Mouriscas, é uma ponte sobre o rio Tejo, unindo Alvega (EN118) e Mouriscas (CM1221). Por ela passa o Ramal do Pego da Linha da Beira Baixa, construído pela EDP para acesso dos comboios com carvão provenientes do porto de Sines que abastecem a Central Termoeléctrica do Pego.

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A ponte rodoviária original foi inaugurada em 17 de Setembro de 1881. A nova ponte rodo-ferroviária foi construída em 1992. Com a construção da A23, a norte, esta ponte ganhou nova importância pois é um dos acessos principais à mesma autoestrada para quem vem do Alto Alentejo.

E, passado Alvega, era no Alto Alentejo que íamos entrar tendo deixado o Ribatejo para trás. Faltavam-nos 4 travessias…

Anterior:

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(1)

A seguir:

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(3)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(final)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(1)

15 travessias do nosso maior rio, o Tejo, de Lisboa até à ponte de Ródão que une a Beira ao Alentejo com o rio como testemunha.

15 travessias de Lisboa a Ródão

Viagem

I – O Início da jornada…até Muge

Porque se diz que se deve começar do início, esta é a história da minha primeira grande viagem, a minha iniciação ao moto turismo (até aí, os muitos quilómetros feitos tinham sido numa lógica mais utilitária).
A ideia surgiu casualmente de alguma leitura ou referência na internet, não sei ao certo, ao percurso do Rio Tejo e das muitas travessias que unem as suas duas margens. Sendo certo que as mais famosas são as de Lisboa, outras há que merecem ser conhecidas. E porque para as conhecer todas é necessário uni-las de forma terrestre, o objectivo estava traçado. Faltava isso sim, optimizar o percurso que seria feito alternadamente por uma margem ou por outra conforme o sentido em que cada travessia fosse utilizada. No fundo era como se estivéssemos a cozer dois panos, separados pelo Rio Tejo, em que a linha era o nosso percurso!

As estradas existentes, o interesse em minimizar a utilização de auto-estradas e o pagamento de portagens e o desejo de efectuar alguns trajectos pelo seu próprio interesse paisagístico ou de condução (a diversão é fundamental) também fizeram com que o percurso tivesse que ser este e não outro. A descrição adiante certamente trará a justificação para as opções tomadas.

Cabe aqui referir que o Rio Tejo tem no seu percurso nacional 15 travessias, das quais 13 são pontes e 2 são barragens. E o primeiro “nó” que se nos colocou tem a ver com as opções relativas às pontes lisboetas – 25 de Abril e Vasco da Gama – pois para garantir o fluxo como atrás referi (e sem percorrermos uma travessia para lá e para cá), era fundamental que a terceira ponte – a ponte Marechal Carmona em Vila Franca de Xira – fosse feita no sentido norte-sul. Afinal qual atravessar primeiro? Sair pela Vasco da Gama e entrar na 25 de Abril ou o inverso? A distância era a mesma pois acabava por ser circular e assim a opção foi entrar em Lisboa pela ponte que tivesse a portagem mais barata, ou seja, a 1ª opção.

Uma nota, porque aprendemos sempre algo: se fosse hoje, teria previsto a saída de Oeiras, junto à foz do  Rio Tejo – o simbolismo é importante – e nesse caso a opção teria sido a contrária: primeiro a 25 de Abril e depois a Vasco da Gama.

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Em resumo, saida de Lisboa manhã cedinho (que a distância a percorrer era substancial – cerca de 700km num dia) do habitual ponto de encontro nas bombas de gasolina da 2ª circular, junto ao Ralis. Quando a marca patrocinar, poderei indicar o nome….

Motos

No início, éramos 5 em 3 motas. Duas Hondas e uma BMW. No final sobraram as duas Hondas…mas isso é história lá mais para a frente.Vasco

Começámos pela passagem pela Ponte Vasco da Gama – para inaugurar as travessias da jornada. Esta ponte, cuja inauguração ainda estará na memória da maioria, une as duas margens do Tejo entre Alcochete e Montijo a sul e Sacavém e Moscavide a norte. Tem 17 km de comprimento o que a tornam a mais extensa da Europa e uma das mais compridas do mundo.

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Cerca de 12 km são sobre o estuário do Tejo a montante do Mar da Palha. Foi inaugurada em 1988 a tempo da Expo 98 e demorou cerca de 18 meses a ser construída. Com 155 metros de altura é também umas das mais altas construções de Portugal.

O rumo era em direcção à Ponte 25 de Abril pelo que tomámos a saída para o Montijo e entrámos na A33. Depois seguiu-se a A2 e a reentrada em Lisboa.

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A Ponte 25 de Abril é uma ponte suspensa rodoferroviária que liga a cidade de Lisboa à cidade de Almada. A ponte atravessa o estuário do rio Tejo na parte final e mais estreita — o designado “gargalo do Tejo”. A sua construção começou em novembro de 1962 e 4 anos mais tarde, 6 meses antes do prazo limite e dentro do orçamento previsto, foi concluída tendo a inauguração ocorrido em 6 de agosto de 1966, na altura designada por Ponte Salazar. Tem uma altura de 190m e um comprimento de 2,3km. Não só é uma das maiores pontes suspensas do mundo, como o seu enquadramento privilegiado a torna, desde sempre, um dos ex-libris da capital. E resolveu um gravíssimo problema de acessibilidades a Lisboa, pois à época as alternativas eram a ponte existente em Vila Franca de Xira (25km a norte) ou a travessia de barco a partir de Cacilhas – daí os barcos que a efectuavam serem geralmente designados por cacilheiros e fazerem também eles parte do imaginário da cidade.

Atravessada a 25 de Abril e a cidade de Lisboa pelo eixo norte-sul, 2ª circular e entrada na A1 seguimos a caminho de Vila Franca de Xira. Neste momento tínhamos já feito as 2 primeiras travessias do Tejo.

Em Vila Franca saímos da A1 e rumamos à ponte Marechal Carmona – aquela que durante bastantes anos era a mais próxima da capital e que nos remete para imaginários da memória como a Recta do Cabo ou a Estalagem do Cavalo Branco na N10.

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Esta ponte começou a ser reclamada pelas populações e autarquia vilafranquense em 1924. O governo da época, já em meados dos anos 40,  resolveu avançar com o projecto, quando era ministro das obras públicas, Duarte Pacheco. Este tinha a curiosa opinião que sendo esta uma obra de interesse público, deveria ser o Estado a construí-la e suportar o respectivo custo. Outras opiniões havia no governo, que face ao elevado custo, a construção e exploração poderia ser entregue à iniciativa privada sendo esta remunerada através da cobrança de portagens. Quando o projecto finalmente arrancou, já Duarte Pacheco tinha falecido, e o seu sucessor José Ulrich avançou com a primeira iniciativa de uma ponte com portagens em Portugal! A ponte foi inaugurada em 30 de Dezembro de 1951, tem 1224m de comprimento com um tabuleiro central de 524m dividido em cinco vãos de 104m. O seu custo na época rondou os 650 mil euros (feita a conversão de escudos para a nova moeda).

Passamos Porto Alto e viramos à esquerda onde iremos percorrer pela primeira vez a N118. Esta estrada que corre paralela ao Tejo pela sua margem sul e vai do Montijo até Alpalhão, irá ser recorrente em toda a nossa viagem. O destino será o acesso à A10 que nos permitirá atravessar pela quarta vez o Tejo na  Ponte da Lezíria.

006LeziriasUma curiosidade: esta ponte, inaugurada em 8 de Julho de 2007, tem uma extensão de cerca de 12 km que a torna numa das mais extensa do mundo e a terceira da Europa depois da Ponte Vasco da Gama e da Ponte da Crimeia, na Rússia (inaugurada em 2018).
Feita a travessia é tempo de abandonar de imediato a auto-estrada e rumarmos a Vila Nova da Rainha pela N3. Depois Azambuja e aqui viramos à direita para a N3-3 em direcção a Valada do Ribatejo. Antes de Valada, passamos pelos acessos a algumas das aldeias avieiras tão típicas da lezíria do Tejo – por exemplo o Cais Palafítico da Palhota – e seguimos com o muro-dique de protecção contra as cheias do Tejo pela nossa direita.
Passamos Valada, que mereceu uma breve paragem para um cafézinho e para apreciar a sua mini-marina bem como o ameno recanto junto ao rio…

Dirigimo-nos então para Muge, depois de atravessada a nossa 5ª travessia: a ponte de Muge ou, de seu nome, Ponte Rainha D. Amélia.

É uma antiga ponte ferroviária inaugurada em 14 de Janeiro de 1904. Após a construção na década de 1980 de uma nova ponte ferroviária, que a substituiu, foi em 2001 alvo de obras e reconvertida para tráfego automóvel e pedonal ligando deste modo, Muge no concelho de Salvaterra de Magos, e Porto de Muge,no concelho do Cartaxo, bem como a localidade de Valada, que, antes desta ligação, ficava frequentemente isolada em períodos de cheia.

Em Muge retomamos a já nossa conhecida N118.

Para quem, aqui chegado, sinta já um certo vazio no estômago, as bifanas do Silas são imperdíveis. Fica só o registo, porque o nosso caminho mandava-nos seguir e o almoço estava previsto para ser mais à frente.

Ainda havia muita estrada a fazer…e 10 travessias!

A seguir:

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(2)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(3)

Coser o Rio Tejo como se um pano fosse…(final)

Porquê?

Porque para viajar necessito virar a esquina da minha rua.
E a seguir a essa, outras se sucedem!

Viagens…

O acto de nos deslocarmos de um sítio até outro.
Presume-se a existência de alguma distância e um objectivo. Nem um nem outro são essenciais…

…ao Virar da Esquina

Porque para viajar necessito virar a esquina da minha rua.
E a seguir a essa, outras se sucedem!

Aqui falarei de viagens, feitas de moto, por aqui e por ali.

Viagens por perto, frequentemente e um pouco mais além, ocasionalmente!

E, como o sonho comanda a vida, porque não partilhar projectos (realizáveis ou não…)?

Afinal descrever passeios que preencham os 3 requisitos fundamentais de uma viagem com propósito:

  • Curiosidade:

de vermos aquilo que diariamente outros nos mostram nos mais diferentes meios e perceber se o que os mapas nos sugerem é real! Acima de tudo, ver…ver com os nossos olhos.

  • Conhecimento:

cada terra, cada paisagem, cada pessoa com que nos cruzamos é uma nova realidade que nos enriquece e aumenta o conhecimento que temos do mundo que nos rodeia.

  • Convívio:

o mundo é feito de gente. Cada um diferente do outro. Cada qual o seu mundo que podemos conhecer, partilhar, aprender, viver…

Com um único objectivo:

Partilhar! E que possa ser relevante…

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