A vetusta senhora estava à espera, já o sabia. Fui encontrá-la com excelente aspecto. Idosa é certo, vestida à moda da sua época, mas conservada como se ainda estivesse no alvor da sua juventude.
Verdade seja dita que também está muito bem instalada. Amplo salão, com muita luz natural (mitigada por grandes persianas) e impecavelmente limpo. A D. Elvira estava à espera, confortavelmente instalada na mezzanine de onde podia observar a maioria dos seus companheiros. Aqueles que não estavam ao lado dela no piso superior.
Deixem-me apresentar-vos a D. Elvira: um espectacular Ford T de 1906 , veículo dos primórdios da História do Automóvel.
O local? O Museu Automóvel do Caramulo.
Mas vamos por partes, porque o caminho para lá chegar foi longo (e divertido, muito divertido!).
A caminho do Caramulo – o prelúdio da jornada
Pelo caminho mais fácil, nunca aquele que um motociclista deseja, por auto-estrada e outros bons caminhos, são cerca de 280 km e 3 horas de viagem. Mas que piada tem isso, quando podemos divergir um pouquinho e abraçar as serranias que ficam ao lado?
Assim fizemos. Mesmo que para maximizar o tempo de diversão fosse necessário percorrer uns ainda longos 170 km pela A1, A23 e A13 até ao nó de Alvaiázere. Aí saímos em direcção a Figueiró dos Vinhos (a obrigatória paragem para reforço de cafeína).
E qual não foi a nossa surpresa, porque depois de tanta monotonia, assim que deixámos o asfalto pago…encontramos uma estreita estrada, com alguma inclinação, ganchos à direita e esquerda, para apanharmos a M517 que no conduziria a Figueiró.
3 km chegaram para abrirmos a pestana… e demos connosco em Venda do Henrique. Nome que me soou a estranho, vá-se lá saber porquê! Bem, selfie da praxe e a caminho do ansiado cafezinho.
Mas para lá chegarmos, ainda desfrutámos de uns 20 km bem interessantes…assim a modos que um aperitivo para o que nos aguardava no resto do dia.
Convém aqui referir que desta feita não estava sozinho. O Jaime e o Zé são, para lá de amigos de longa data, parceiros habituais de tertúlias, passeios e convívios motociclísticos.
Todos tínhamos vontade de visitar o Museu do Caramulo e fazer com que o caminho até lá fosse memorável.
Em modo sobe e desce, curva e contra-curva
De Figueiró dos Vinhos até Castanheira de Pêra são pouco mais de 15 km. Por estrada nacional…claro! Fizemos mais do dobro.
O primeiro ponto de passagem foi uma aldeia com um nome curioso: Ana de Aviz. Aqui virámos à esquerda, para a M525, que nos levou até às Fragas de S. Simão.
À beira da estrada, fica o miradouro de onde conseguimos vislumbrar uma paisagem extraordinária: duas graníticas paredes rochosas verticais onde, bem lá no fundo, corre a Ribeira de Alge.
Deste miradouro sai um passadiço que desce até lá abaixo, ao longo de cerca de 2 km até à aldeia de xisto de Casal de S. Simão. Pelo caminho, passa pela praia fluvial das Fragas de S. Simão. Não era nosso objectivo caminhar…até porque o destino estava ainda longe.
Prosseguimos sem mais paragens até Castanheira.
Sem paragens mas com muita “mão de obra”: a M525, as CM1447, CM1131, CM1130, CM1128, a M521 e finalmente a EN347 deixaram-nos às portas de Castanheira de Pêra com um enorme sorriso no rosto. E mal tinha começado a festa…porque vinha aí em pleno a Serra da Lousã.
Rumo ao almoço, na Lousã
A Serra da Lousã é linda. Arvoredo frondoso e uma estrada espectacular. Mais “trabalhinho” para as nossas meninas.
Ainda não tinha falado das nossas companheiras mas aqui vai: uma V-Strom 650, uma Multistrada 950 e a Africa Twin do escriba.
As armas perfeitas para nos divertirmos com segurança, algum conforto (até porque levávamos bagagem) e desfrutarmos de bons momentos de condução.
Para lá de repetir que a paisagem é fantástica, as curvas e contra-curvas são deleite puro, passámos ainda, ao longo destes 30 km que nos separavam do reabastecimento alimentar, pela bonita aldeia de xisto do Candal.
Se fosse esse o objectivo – as aldeias de xisto – teríamos muito para ver: não só a já falada Casal de S. Simão, o Candal onde passámos, também Talasnal e Cerdeira ficavam aqui próximo.
Chegámos finalmente à Lousã. A jornada ia longa. Cerca de 4 horas de viagem até agora e muito havia ainda a percorrer. Era tempo de almoço. Foi o que fizemos.
Começa o meio dia da tarde
Com motos e condutores devidamente atestados, Lousã ficou para trás.
O que não abandonámos foi o traçado sinuoso do percurso escolhido. Até Vila Nova do Ceira, onde apanhámos e depois seguimos pela Estrada Nacional 2, percorremos a EN342 e depois a M554. Em Serpins, seguimos junto ao Rio Ceira pela EN342-3 durante um pedaço, até Candosa. Depois, a estrada afasta-se do rio. Prosseguimos até V. N. do Ceira e à EN2.
Nesta altura tínhamos um objectivo concreto: estávamos aqui e impunha-se uma visita ao nosso amigo Rogério Lima e ao seu Central Bar em Vila Nova de Poiares. Um local já célebre para quem percorre a EN2 e que no dia seguinte viveria um momento alto: o Portugal de Lés-a-Lés aqui fez a sua paragem obrigatória.
Breve descanso, pusemos a conversa em dia pois tinha aqui estado em Janeiro do ano passado (este malfadado ano e meio!) e não tinha voltado.
Seguimos viagem, deixámos a EN2 e rumámos ao Mosteiro de Lorvão. Sempre no registo de estradas secundárias, tão sinuosas quanto possível.
Até ao Mosteiro do Lorvão
Não foi fácil dar com o Mosteiro. Alguma confusão entre o que víamos na estrada e o que o GPS nos dizia. E pelos vistos não fomos só nós. Lá chegados, outro visitante veio-nos perguntar por onde deveria ir para sair dali…
Lorvão é uma pequenina aldeia, ao ponto de a rua principal até ter circulação alternada. Quando deparamos com o edifício que foi Mosteiro primeiro e Hospital mais tarde, ficamos surpreendidos pela sua dimensão rodeado de serrania com frondosa vegetação. E água a correr por todo o lado! Diversas fontes, dá ideia que entre quaisquer duas pedras brota água, límpida e fresca.
A origem perde-se no tempo. Lorvão derivará de “Lurbine”, nome da paróquia suevo-visigótica cuja lenda diz que aqui terá sido localizada, no Séc VI. Os primeiros documentos escritos em que é referido são de 878. Aqui existia uma comunidade que teve papel fundamental no povoamento e no fomento agrário. São os Monges de Cluny que vão fundar o Mosteiro e dedicá-lo a S. Mamede e S. Pelágio.
O Mosteiro e a comunidade cresceram e desenvolveram-se e no Séc. X tinha relevância na região, até porque os domínios se tinham estendido devido a muitas doações de fiéis. No final deste século, todavia, com a conquista muçulmana, este esplendor vai decair.
Mas foi período que durou menos de um século. A partir de 1064, a par com a reconquista cristã, a comunidade laurbanense recuperou o seu prestígio, esplendor e em redor do Mosteiro cresceu uma população atraída pelo trabalho oferecido pelos monges nas suas vastas propriedades.
Depois de uma fase inicial na posse dos monges eremitas de Santo Agostinho ou sem regra fixa, em 1109, o Conde D. Henrique fez doação do Mosteiro ao Bispo de Coimbra, tendo o mesmo adoptado, em meados do séc. XI, a Regra Beneditina, que se manteve até 1200, quando passou para a Ordem de Císter. Nesta data, não apenas se adoptou a nova reforma cisterciense, como o Mosteiro passou a ser feminino, tendo por invocação Santa Maria.
Deve-se esta profunda mudança que, naturalmente implicou também adaptações nos espaços, a D. Teresa, filha do rei D. Sancho I. Esta, vendo anulado o seu casamento com Afonso XI de Leão, veio para Lorvão e aqui introduziu a congregação feminina, expulsando os monges.
Até aos Séc. XVII e XVIII, em que por via de sucessivas obras o Mosteiro veio a ter a configuração que hoje podemos ver, passou por diversos momentos de esplendor e outros nem tanto, mas sempre com notória importância e que foram também acrescentando dimensão ao edificado.
Entre 1748 e 1761, procedeu-se a nova remodelação. E a definitiva que veio até à actualidade. A igreja foi reconstruída e o seu traçado denota a forte influência do barroco joanino de Mafra. Para além da arquitetura, são nela merecedores de especial atenção, os túmulos de prata das Santas Teresa e Sancha, da autoria do ourives portuense Manuel Carneiro da Silva, datados de 1715; as grandes telas de Pascoal Parente, representando São Bento e São Bernardo, nos altares sob o zimbório; e a porta de entrada de pau-preto, com aplicações de bronze dourado. Paralelamente a esta campanha, procedeu-se à mobilação litúrgica e artística.
A separação entre a Igreja e o Coro é feita por uma grade de ferro forjado com aplicações de bronze dourado, a melhor obra de rococó do seu género, em Portugal. Sobre ela ergue-se o órgão de duas fachadas em sóbrio, mas gracioso, neoclássico. A particularidade das duas fachadas se encontrarem opostas uma à outra, tornam-no único no país. Foi feito por António Xavier Machado Cerveira em 1795 e tem 61 registos.
Destaca-se, num dos altares do coro, a formosa imagem de Nossa Senhora da Vida, do séc. XIV. Mas, o que naquele espaço, mais desperta a admiração é, sem dúvida, o grandioso cadeiral em jacarandá preto do Brasil e nogueira, construído entre 1742 e 1747, pela delicadeza dos ornatos, pela espiritualidade tocante dos santos mártires esculpidos sobre as cadeiras e pela nota de fantasia dada pelas máscaras existentes na parte inferior dos assentos.
É o mais espectacular cadeiral português e o mais magistral, sob o ponto de vista técnico.
A Revolução Liberal de 1820 e a extinção das Ordens Religiosas em Portugal, em 1834, deram início à depredação de todas as riquezas acumuladas durante séculos. Espoliadas dos seus bens, as últimas freiras de Lorvão acabaram na mais degradante miséria. Tendo sido proibido ao Mosteiro de Santa Maria de Lorvão receber noviças, a última monja faleceu a 8 de Julho de 1887.
Abandonado durante a primeira metade do séc. XX, o Mosteiro viria a ser restaurado pelo Estado, tendo então ficado com três dormitórios, noviciaria, hospício, coro, igreja, dois claustros, refeitório, botica, cartório, oficinas, celeiro e outras dependências. A generalidade destas instalações foi, até 2012, ocupada por uma unidade hospitalar para doentes de foro psiquiátrico, o Hospital Psiquiátrico de Lorvão.
Visitámos a Igreja e sem dúvida que o cadeiral nos deixou impressionados. Lindíssimo!
Veja-se o que José Saramago referiu em 1981, no seu livro “Viagem a Portugal”:
“…Estes caminhos são fora do mundo. Estando o céu aberto e o sol fulgindo, talvez a paisagem se torne amável, mas o viajante (nota: assim ele se refere a si próprio, Saramago) duvida. Tudo por aqui é grave, severo, um pouco inquietante. As árvores escuríssimas, as encostas quase verticais,a estrada que tem de ser acautelada.
…
De Lorvão não viu muito. Levava a cabeça cheia de imaginações, e poertanto só se pode queixar de si próprio. Da primitiva construção, no século IX, nada resta. Do que no século XII se fez, uns poucos capitéis. Pouco relevantes as obras dos séculos XVI e XVII.De maneira que aquilo que mais avulta, a igreja, é obra do século XVIII, e este século não é dos que o viajante mais estime, e em alguns casos desestima muito. Vir a Lorvão á espera de um mosteiro que corresponda a sonhos românticos e responda à paisagem que o rodeia, é encontrar uma decepção. A igreja é ampla, alta, imponente, mas de arquitectura fria, traçada a tira-linhas e escantilhão de curvas. E as três gigantescas cabeças de anjos que enchem o frontão por cima da capela-mor, são, no franco entender do viajante, de um atroz mau gosto. Belo é porém o coro, com a sua grade que junta o ferro e o bronze, belo o cadeiral setecentista. E aqui aproveita para verificar que o século XVIII, que tão mal se entendeu com a pedra, soube trabalhar a madeira como raras vezes antes e depois. E é também belo o claustro seiscentista, da renascença coimbrã. E se o viajnate está de maré de não esquecer o que estimou, fiquem também notadas as boas pinturas que na igreja estão.…”
Que da nossa modesta apreciação ou da ilustre escrita do nosso Nobel, fique a vontade de visitar estas paragens. Julgo que os viajantes não ficarão desapontados. pelo contrário. Escolham um dia bonito (como o que encontrámos) e talvez o vosso olhar seja como o nosso, mais benevolente.
A caminho do Caramulo
A tarde ia adiantada e a perspectiva inicial de nos embrenharmos de novo nas estradinhas mais secundárias foi revista. Importava chegar ao destino ainda com dia aberto. Tínhamos a subida da Serra do Caramulo, pelo percurso tornado célebre pela Rampa Automobilística, e a visita ao Caramulinho: uma daquelas vistas a 360º que nos espandem os horizontes.
Assim, apontámos para um percurso mais rápido pelo IP3 até Tondela, passando por Penacova.
Com a curiosidade de em grande medida seguir paralelo à Estrada Nacional 2 o que nos possibilitou ter uma outra perspectiva desta: não a de quem nela vai mas sim de quem vê os que lá vão!
Pequena paragem para reabastecimento alimentar e rumámos ao Caramulo. Que estava bem à nossa frente. Cerca de 20km pela EN230, com passagem por Campo de Besteiros .
E foi precisamente a partir daqui que tivemos a parte final de diversão do dia.
A subida até ao Caramulo, em excelente estrada, com curvas e contra-curvas sucessivas foram a melhor forma de concluir a jornada que ia bem longa.
Faltava só a “piéce de resistence”: a subida ao Caramulinho! Passámos em frente do Museu do Caramulo (e do hotel onde recuperaríamos forças) e seguimos por mais 3 km a subir.
Por falar nisso, o Golden Tulip Caramulo Hotel & SPA onde ficámos revelou ser uma excelente opção. Com 4 estrelas, preço em conta, serviu na perfeição, até porque fica em frente do Museu o que é bastante conveniente.
Algo datado na decoração é verdade, mas com excelentes condições de conforto e um acolhimento extra-simpático, só teve um senão: porque não nos apetecia andar às voltas, resolvemos marcar o jantar no respectivo restaurante. Azar!
Reserva feita para as 21h, cardápio na mão às 22.15h, manjar nitidamente de recurso (sopa salgada com aroma a cenoura, potas à lagareiro, para mais aquecidas no micro-ondas…excesso de sal? potas? francamente!). Se fosse no Hell´s Kitchen tinha havido bernarda da grossa!!! E no final…convite para levantar ferro porque já estávamos a ultrapassar a “hora de recolher da pandemia”.
O preço foi a condizer com a casa, manifestamente exagerado para a qualidade do repasto ou do atendimento. O restaurante ganhou uma cruz! E esta referência, claro…
A visita ao Museu seria na manhã do dia seguinte.
Museu Automóvel do Caramulo
O Caramulo (a localidade) nasceu do espírito empreendedor da família Lacerda.
Jerónimo Lacerda, médico com grande espírito empreendedor, vindo dos campos de batalha da 1ª Grande Guerra, resolve lançar uma estância termal e turística do melhor que havia por esse mundo fora.
Aproveitando os ares e as águas da Serra do Caramulo, era esta infraestrutura virada para o combate ao flagelo da época: a “peste branca” como lhe chamavam, ou seja, a tuberculose.
Da página do Museu do Caramulo retiramos este texto que muito bem resume a história do Caramulo:
“Magnífica obra urbanística dotada de infra-estruturas únicas em Portugal, naquela data. Em 1938 já possui água canalizada ao domicílio, uma exemplar rede de esgotos urbanos e respectiva estação de tratamento, sistema de recolha de lixos com forno crematório, energia eléctrica produzida a partir de central hídrica própria, bem como um planeamento urbanístico invulgar, com estradas largas com passeios, espaços verdes e jardins públicos de beleza incomparável e numa proporção nunca vista. É neste cenário que, em 1921 e 1923, nascem dois filhos do Dr. Jerónimo de Lacerda, Abel e João.
Cientes de que o progresso da medicina ditaria o fim do Caramulo enquanto centro de tratamento, Abel, que enveredara pela carreira de economista, e o seu irmão João, médico, iniciam a procura de ideias que assegurem a sobrevivência da sua terra e a continuação da obra herdada. Decidem programar a transformação das estruturas existentes em turismo de altitude e retirar ao nome Caramulo o epíteto de doença, convertendo o cenário serrano em pólo de atracção cultural e artística.
É com esta ideia em mente que Abel e João de Lacerda fundam, nos anos cinquenta, um invulgar museu, situado numa montanha no centro de Portugal, com luxuriante vegetação, virada a Sul, sobre um vale extenso de 80 Km: o mais vasto panorama do país. Abel de Lacerda, apaixonado pela arte, constrói um edifício, com os mais modernos conceitos de museologia, para expor uma invulgar colecção de objectos de arte constituída por 500 peças de pintura, escultura, mobiliário, cerâmica e tapeçarias, que vão do antigo Egipto até Picasso.
João de Lacerda, apaixonado por automóveis, constrói outro edifício anexo ao primeiro, vocacionado para expor 100 automóveis e motos, dentro do princípio de que todos os veículos pudessem sair facilmente, para exibição e conservação.
Com a morte prematura de Abel de Lacerda em 1957, criou-se a Fundação Abel de Lacerda – hoje Fundação Abel e João de Lacerda – detentora do Museu do Caramulo. Aberto ao público todo o ano, o Museu do Caramulo já recebeu mais de um milhão e meio de visitantes desde a sua criação. O edifício planeado por Abel Lacerda, para albergar as preciosas antiguidades doadas, foi inaugurado pelo Presidente da República em 1959, tendo sido um dos primeiros museus concebidos e realizados em Portugal, com todos os requisitos modernos da museologia. “
Depois de uma excelente noite de sono, sentidos todos alerta para uma viagem à história dos motores – sim, o Museu também tem motos.
A expectativa era elevada. E foi confirmada!
Vamos por partes:
A visita principia no edifício central onde tivemos oportunidade de apreciar uma magnífica colecção de miniaturas. Merecedora talvez de um espaço mais amplo em que fosse possível uma maior separação das peças e uma arrumação temática mais detalhada. Mas não há dúvida que vela a pena determo-nos um pedaço a apreciar brinquedos….que não são brincadeira.
Passámos depois ao edifício lateral, onde está a D. Elvira que referi no início em muitíssimo boa companhia. Convém esclarecer que escolhi o Ford T para “a” D. Elvira por ser um modelo que marcou profundamente toda a História do Automóvel. Mas a outros que lá estão também assentaria bem.
Já agora, não consegui descobrir – e tentei mesmo – porque razão se utiliza o termo para designar estas preciosidades. No dicionário fica bem definido que uma D. Elvira não é uma velharia ou uma carripana.
O significado é: ”…um automóvel de modelo muito antigo, mas que poderá estar muito cuidado e a funcionar relativamente bem.”
Mas porquê D. Elvira e não uma outra Dona qualquer? Alguém sabe? Adiante…
Este edifício amplo – e onde também está a loja que tem alguns artigos de memorabilia bem interessantes – irrepreensivelmente limpo, com temperatura adequada apesar das grandes janelas envidraçadas de um dos lados, com a luz solar temperada por persianas, reúne no piso térreo e na mezzanine um conjunto relevante de veículos que marcaram de uma forma ou de outra a história do automóvel, nomeadamente em Portugal: desde o Chrysler Imperial que transportou Álvaro Cunhal na sua fuga da prisão de Peniche, o Mercedes blindado de Salazar, o desportivo Alba de fabrico nacional, tal como o pequeno IPA, ou o Reynard de Fórmula 3 que levou Michael Schumacher à vitória no Grande Prémio de Macau de 1990, derrotando (como viria a fazer inúmeras vezes depois na F1) Mika Hakkinen.
Não faltam os Bugatti, Ferrari, Mercedes, Alfa Romeo, Rolls Royce, BMW, Cadillac. Um Pegaso também.
E as verdadeiras D. Elvira: Benz, De Dion-Buton, Panhard Levassor, Hispano-Suiza, Abadal, Delahaye, Peugeot (de 1899), Darracq, Unic.
Ou os mais recentes, Mercedes Silverwing, Jaguar Type E, Lamborghini Miura, Maserati Merak e os Lancia 037 e Delta HF que tantas vitórias conquistaram nos ralis por esse mundo fora. Nem sequer falta um VW Carocha artilhado com uns skis, um Triumph, um Simca ou até uma Fiat 600 Multipla…ou um VW Kubelwagen da 2ª guerra mundial.
Devo dizer que quando saí, tinha um leve “sabor a pouco”. Estava à espera de ver mais carros.
Depois, digerida a visita, revista a colecção de fotos, é um facto que estão lá representados praticamente todos os emblemas que num ou noutro momento foram verdadeiramente relevantes. E alguns dos modelos que deixaram a sua marca na História do Automóvel.
E motos? Já referi que não sendo o foco principal do museu, também lá estão representadas: várias Indian, Vellocette, Matchless, Norton, BSA, Rudger, Wanderer-Werke, Peugeot… E até as mais recentes Honda CX650 Turbo ou NR750!
Ainda assim, achei que havia algumas lacunas que não esperava (meros exemplos):
- uma representação da indústria nacional mais recente – os UMM e Portaro, por exemplo. Seja nas suas versões normais, seja naquelas que brilharam no Paris-Dakar;
- alguns dos carros que marcaram o panorama dos ralis (nacionais e internacionais) como sejam os Ford Escort, Fiat Abarth ou Audi Quattro.
Mas o facto é que no Museu Automóvel do Caramulo conseguimos ver a História do Automóvel desde o seu início. O primado da qualidade versus a quantidade.
E um elogio que merece ser destacado: todos os automóveis e motos em exposição estão irrepreensíveis!
Nota final: depois da visita, surgiram-me algumas questões que achei valeriam a pena ser esclarecidas. Enviei um e-mail ao Museu em que questionava o seguinte:
- se os veículos expostos representavam o total do acervo do Museu ou outros existem que não estariam expostos (eventualmente para assegurar alguma rotatividade)?
- em condições normais, realizam exposições temporárias com outros veículos do acervo do museu ou de outros coleccionadores? Com que frequência?
- todos os veículos do acervo pertenciam à colecção do Dr. João de Lacerda ou foram doados, com está expresso num texto à entrada do Museu? Ou algumas viaturas têm sido adquiridas?
Mais de 1 mês depois….nem resposta!
Lamentável…mas algo que tenho constatado ser uma constante em muitas empresas e instituições nacionais.
A mim ensinaram-me que uma carta, qualquer carta, merece sempre uma resposta. Outros tempos…
Conclusão
E pronto! O objectivo estava concluído. Uma excelente jornada motociclística, complementada com uma visita ao Museu Automóvel do Caramulo, um desejo já de longa data.
Veja aqui o filme que está no Canal Youtube de Viagens ao Virar da Esquina e fique a conhecer melhor o Museu do Caramulo.
E a seguir? Pois…a seguir foi o Inferno! Mas essa é outra história ao virar da esquina…
Deverá estar ligado para publicar um comentário.