Imaginem que estamos a fazer palavras cruzadas. A dado passo surge a pergunta
– na horizontal com 4 letras: “onde está a Virtude?”
… a resposta óbvia é: no “MEIO”!
A Suzuki tem uma estratégia muito clara e simples para a sua gama, no segmento “da moda”: as trails V-Strom. Um modelo de entrada de gama – a 250 – no pólo oposto tem um de elevada cilindrada – a 1050 – e, no meio, o terceiro que completa a sua proposta – a 650. Todos exactamente separados por 400cc.
No ano passado, quando foi lançada, experimentei a 1050XT (com apreciável satisfação; ver “Suzuki V-Strom 1050XT – Olhar o futuro e respeitar a herança“ e agora chegou a vez da “seis e meio”.
A V-Strom 650 que tenho comigo para esta experiência é a XT, ou seja, a melhor equipada com umas bonitas jantes douradas com raios que muito bem combinam com a combinação amarelo-cinza-preto que dá a cor à moto.
E é a predominância do amarelo – essa cor que dificilmente faz a unanimidade – que lhe dá um certo carisma e indiscutivelmente a fazem ser notada onde quer que esteja. Na minha opinião, e para começo de conversa, acho a moto bonita!
Naturalmente que nem todos gostarão desta tipologia de motos. Outros preferirão motos maiores. Ou mais pequenas. E alguns serão fãs de outros emblemas. Obviamente.
Também alguns irão atrás do preconceito relativamente ao “conservadorismo” da Suzuki. De facto, os modelos da marca têm geralmente grande longevidade (uma prova da sua fiabilidade), não fazem abanar as estruturas da estética (ou fazem…estou a recordar-me de uma certa Hayabusa, ou de uma Katana indo mais atrás…), preferem a evolução à revolução. É uma estratégia.
E já agora, vale a pena lembrar que o actual campeão do mundo de MotoGP conquistou o título com uma Suzuki. A moto poderia até não ser a melhor nos diferentes domínios (em curva, em aceleração, na travagem, nas pole position) mas era sem dúvida a mais equilibrada e talvez até a mais fácil de conduzir (e aqui o “fácil” tem um significado diferente do habitual).
Afinal características que, como veremos, à respectiva escala, servem também para qualificar a V-Strom 650.
A HISTÓRIA
Este modelo, V-Strom 650, foi lançado em 2004. Verdade…no próximo ano atingirá a maioridade.
Fá-lo-á sem qualquer problema pois tem toda a maturidade de uma infância e adolescência bem cumpridas, percorrendo sem sobressalto todas as fases da aprendizagem juvenil.
Será que em 2022 a idade maior será celebrada com algo mais que uma evolução? Um novo quadro? Um novo motor (quiçá a despedida do “Vee Twin”)? Novos aditivos electrónicos? Ou um novo ecrã LCD cheio de cores? Não vale a pena fazer futurologia porque:
a) a moto actual ainda é capaz de satisfazer muita gente como adiante ficará provado;
b) todas aquelas ideias não significam que o que lá está actualmente não funcione. Funciona e bem!
A primeira geração durou de 2004 a 2011.
Em 2012 surgiu a segunda e por fim em 2017 a terceira, esta que vos vou descrever.
Convém salientar o seguinte: a moto ensaiada é a versão 2020. Já começou a chegar aos stands a versão 2021 que tem duas diferenças substanciais: o esquema cromático (melhor dizendo, uma pequena variação nos autocolantes e na disposição das cores) e a adaptação à norma Euro 5, como é de lei.
O facto da nova versão já por aí andar não invalida esta experiência, pois as qualidades da máquina estão inalteradas e os ajustes mecânicos efectuados mantiveram quer a potência, quer o binário mas… ligeiramente a mais baixa rotação. Ou seja, sem prejuízo da performance, espera-se até um motor um pouquinho mais “redondo”, logo de condução ainda mais agradável. Notem o pormenor do “ainda mais”!
AS CARACTERÍSTICAS
Esta Suzuki V-Strom 650 é a versão XT. A mais elaborada mas que em bom rigor se diferencia da versão A por umas bonitas jantes douradas, de raios e com pneus tubeless, que lhe dão um toque de classe. Traz também de série as protecções de punhos e uma protecção de motor (em plástico).
Começo pela estética da moto…e logo pelo que não gosto: aquela óptica frontal tipo “olho de boi” nunca me agradou (aliás, não aprecio as ópticas verticais, mas lá está…gostos não se discutem).
Esquecendo este detalhe – ou habituando-me a ele… – a moto é muito elegante.
Bem proporcionada, com umas bonitas jantes, o amarelo correctamente doseado e equilibrado com os tons mais escuros – preto e cinzento – e o motor em V bem enquadrado por uma elegante protecção. O vidro (ajustável em altura com recurso a ferramentas) está perfeitamente enquadrado nas linhas da moto.
Para o meu gosto pessoal, esta moto é mesmo bonita (e confesso, o amarelo até nem está geralmente no top das minhas preferências).
Apesar dos elogios feitos, só devemos exigir desta V-Strom seis-e-meio aquilo que ela é. Uma moto com perfil trail, claramente vocacionada para a estrada mas que não se recusará a fazer umas incursões em off-road, desde que este não seja demasiado ambicioso.
O motor bicilíndrico em V a 90º refrigerado a líquido e com 645cc, tem 71 equídeos às 8.800rpm e 62 Nm às 6.500rpm. É esta ampla faixa de utilização óptima que torna a condução da Strom muito agradável.
Naturalmente não é “explosiva” e tem aquela característica dos motores em V (motor mais complexo, mais peças, maior inércia): ao início um pouco lento mas, à medida que as rotações sobem, ganha alento e a partir das 4.500 entrega-nos toda a sua vivacidade.
É um motor que vai sempre em progressão cada vez mais rápido e isso traduz-se num enorme prazer de condução.
Pena que a sonoridade não acompanhe. Embora eu não goste de escapes demasiado barulhentos, este peca por defeito. Em andamento quase não o ouvimos. Numa viagem mais longa até será bom, mas fica-nos ali a faltar algo. Julgo ser uma tendência dos tempos, uma certa ecologia de viver, que torna os motores actuais quase “asmáticos”: parece que têm a respiração atrofiada.
Às 5.000 rpm vamos a 110km/h o que nos antecipa, à entrada do red-line (10.000rpm), uma velocidade máxima teórica a rondar os 200 (descontados os acertos do velocímetro e alguma limitação do binário a essas rotações). Mais do que suficiente para garantir umas fotos à la minuta e a adição de uns pontos no cartão de fidelização do seu (in)feliz proprietário!
Está dotada de um quadro dupla trave que lhe garante uma óptima ciclística e suspensões com forquilha telescópica à frente, sem regulações e com um curso de 150mm. Atrás, um monoamortecedor com 160mm de curso, dotada de um manípulo de fácil acesso na lateral da moto.
As afinações das suspensões estão claramente orientadas para um excelente comportamento estradista. Isso paga-se em terrenos mais irregulares – por exemplo em estradas com piso irregular em que saltita um pouco – ou em off-road onde rapidamente se atinge o limite do curso se não houver o cuidado de evitar os buracos do percurso. Este é aliás um comportamento muito similar ao da sua mana grande, a V-Strom 1050. A opção é evidente.
A travagem, com ABS, está entregue a um duplo disco de 310mm na dianteira que está dotada de uma jante com 19”. Atrás, um disco de 260mm numa jante de 17”. Não trava de forma acutilante mas sim suave e progressivamente e será difícil, sem erro do condutor, apanharmos sustos.
As jantes com raios, específicas desta versão, são douradas e os pneus são tubeless. Lindas as jantes, já o disse!
Calçava uns Bridgestone Battlax Adventure 40 que são optimizados para a condução em alcatrão e com boa performance em molhado, características associadas a boa durabilidade. Não é claramente um pneu off-road pelo que aí teremos que tomar cuidado. Já referi o curso das suspensões atrás e convém também mencionar o seu peso: 216 kg.
Não significa isto isto que evitemos qualquer estradão que nos surja pela frente. Com os devidos cuidados, é avançar. Agora se entrarmos em percurso mais endurista ou com trialeiras…ou o kit de unhas consegue compensar ou algo vai correr mal. Como um político dizia em tempos, “temos que viver com o que temos”.
Último mas não o menos importante: o depósito comporta 20 litros daquele composto precioso que inclui 60% de impostos. Associado a um consumo que em condução mista normal rondará os 4,5l/100km dar-nos-á uma autonomia por cima dos 400 km. Excelente!
AS PRIMEIRAS IMPRESSÕES
Desde os momentos iniciais, três coisas merecem destaque. No final um reparo.
Em primeiro lugar, a moto é muito manejável. O que em cidade é um aspecto francamente positivo. E como vamos a olhar por cima dos tejadilhos de quem vai à nossa frente, tal traduz-se num grande desembaraço no trânsito citadino. As mudanças de direcção acontecem com naturalidade, tudo corre com facilidade, até porque o motor reage sempre com prontidão bem equilibrada.
Em segundo lugar, é confortável. O banco tem boa dimensão longitudinal e na largura, não obrigando a demasiado afastamento das pernas (o que também ajuda no controlo e maneabilidade da moto) e possui uma espuma com amortecimento adequado. Tem altura de 830mm o que ajuda para quem tenha a perna mais curta.
Neste caso, e fruto da experiência deste ensaio, diria que numa viagem mais longa, se recomendará um descanso de 200 em 200 km sob pena da coisa começar a tornar-se penosa no local onde terminam as costas….
O terceiro aspecto tem a ver com a ergonomia. Sentar é fácil e os comandos estão todos “à mão de semear”. As mãos do motociclista caem bem nos punhos garantindo uma posição confortável. As protecções plásticas apesar de satisfatórias, parecem um pouco pequenas pois quando esticamos os dedos para os manípulos, por vezes tocamos-lhes com as pontas dos dedos. O manípulo do travão dianteiro é regulável. O da embraiagem não.
Finalmente, o reparo. As 3 características enunciadas têm a ver com a moto. O reparo tem a ver com o autor destas linhas. Achei a moto pequena para a minha envergadura física (1,82m e bem encorpado…). As peseiras estão ligeiramente altas – o que não é um defeito, até porque evita que as raspemos em curvas mais apertadas – mas no meu caso fiquei mais encolhido e isso fez com que a condução fosse mais cansativa (principalmente porque as pernas iam menos distendidas do que o desejável). Ainda relativamente a estas: quando parados e assentamos os dois pés no chão, as nossas pernas ficam na mesma linha das peseiras, sendo inevitável o contacto (pelo menos até ganharmos algum hábito e não as evitarmos).
Sentados na V-Strom, os comandos não apresentam disposição diferente do normal. Está tudo “en su sitio”. De realçar que no punho direito, o starter tem uma característica peculiar: o sistema auxiliar de arranque da Suzuki (Suzuki Easy Start System), que apenas exige um breve toque para que a electrónica faça trabalhar o motor. Prático e eficaz.
O ecrã é de fácil leitura e tem toda a informação necessária bem legível: um grande conta-rotações analógico à esquerda e à direita dois quadrantes. No superior, o velocímetro e o indicador de mudança engrenada. No inferior, o indicador de temperatura do motor à esquerda, por cima o odómetro e por baixo as médias (ver funcionamento a seguir). No meio a temperatura ambiente e o relógio, bem como o indicador do controlo de tracção.
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No punho esquerdo, temos o comando que nos permite visualizar no écran::
a) No SEL– podemos optar por um dos 3 níveis do controlo de tracção: desligado ou então a escolha entre menor ou maior intervenção;
b) No MODE (com dupla função): se tivermos accionado o SEL, escolhemos a opção do controlo de tracção que desejamos. Se não, então a tecla “^” faz-nos navegar no odómetro com a quilometragem total e os parciais bem como escolher o nível de luminosidade do ecrã. A tecla”v” dá-nos as médias de consumo, a autonomia e a carga da bateria.
Nada mais simples de utilizar!
A moto tem dois aspectos que não me agradaram sob o ponto de vista estético, mas curiosamente nenhum deles é desadequado na utilização. Um deles referi-o no início. A óptica frontal, em posição vertical e com o formato destacado tipo “olho de boi” não é bonita na minha opinião. Mas é eficaz e o seu formato até contribui para um bom ângulo de iluminação. Pode ser que no futuro, uns leds possam melhorar o que já é bom…
O outro aspecto tem a ver com os espelhos. Aquele formato já não se usa. E neste caso, embora assegurem uma boa profundidade de visão (dada pela altura do espelho) perdem um pouco na visão lateral pelo facto de serem quadrangulares. Falta-lhes um pouco de largura.
São dois pormenores que atestam a antiguidade do desenho da V-Strom. Veremos se 2022 nos traz novidades!
NA ESTRADA
Sentados, e uma palavra para a muita facilidade com que conseguimos passar a perna direita por cima do banco, as mãos caem no guiador com a maior naturalidade. Um pequeno toque no starter e a máquina acorda! Estamos prontos.
A única configuração personalizável é a escolha do nível do controlo de tracção. Optei pela posição 1. O 2 é mais interventivo e as condições de circulação não o justificavam. Optar por desligar também não faria sentido. Se temos ajudas à condução, porque não usá-las?
Houve um outro ajuste que fiz à posteriori: dei 2 toques na pré-carga da suspensão traseira. E melhorou. O peso é importante…o do condutor, naturalmente!
Em andamento, não temos a percepção de conduzirmos uma moto com mais de 200kg, tal a leveza com que se comporta.
Já referi que a sua maneabilidade em cidade é notável, para a qual contribui essa leveza, o diâmetro de viragem bastante reduzido e a forma linear com que o motor entrega a potência à medida que aumentamos a velocidade. Simples e suave são as palavras chave. Não se lhe antecipam comportamentos inesperados e eventuais surpresas que surjam no caminho serão contornadas de forma airosa.
Por tudo isto, confirmamos a primeira das impressões prévias: esta é uma moto muito adequada a quem faça o seu quotidiano em ambiente citadino, no meio do trânsito ou nos percursos nas vias suburbanas.
E na estrada? Era fundamental perceber se a essa boa atitude citadina poderíamos adicionar uma utilização em deslocações mais longínquas.
Levando em consideração as duas notas que mencionei atrás – o conforto depois de uma longa permanência a conduzir e o facto de me sentir ligeiramente acanhado – devo salientar que a moto superou o teste em estrada com brilhantismo.
A forma dócil como entrega a potência na primeira metade da escala do conta rotações e a vivacidade com que o faz depois, associada à tal maneabilidade já referida, dão um grande prazer de condução principalmente em estradas sinuosas. Não será aqui que perderá na comparação quer com outras alternativas da concorrência quer até com outras soluções de gama superior. É uma 6 e meio, não esqueçamos!
Nestas estradas sinuosas, dois aspectos são relevantes: o comportamento da suspensão e o dos travões. No caso das suspensões, se a estrada tiver bom piso, o prazer é completo. Todavia se for bastante irregular, a firmeza que apresenta recomenda alguma cautela pois a partir de certo limite terá alguma dificuldade em as absorver de modo a impedir algum susto em curva. Aqui, como se costuma dizer, “cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a alguém”!
Esta não é uma máquina para corridas….e por isso também o comportamento dos travões não tem a acutilância de modelos mais radicais. Nem isso seria esperado ou sequer desejado. O travão traseiro serve perfeitamente a sua função de equilibrar a moto e o dianteiro dá-nos o que precisamos sem brusquidão. Adequados portanto.
A caixa de 6 velocidades tem muito pouco a dizer. É uma caixa Suzuki. Precisa e suave, garantindo boa precisão seja “para cima” seja nas reduções. E mesmo que seja necessária engrenar a mudança “de aflitos”, ela entra sem qualquer reclamação!
Em auto-estrada, que não será o seu ambiente favorito, a boa atitude mantém-se. A protecção do vidro é adequada, desde que regulada para a compleição física do condutor. No caso, ia na penúltima opção no sentido da altura e estava bem. Talvez se este meio fosse frequente na sua utilização, provavelmente colocá-la-ia na posição superior. Não testei uma vez que implicaria a utilização de ferramentas e tal não se justificava. Mas fica registada a flexibilidade.
No que diz respeito às zonas dos ombros e braços, nada de diferente da generalidade das motos desta tipologia. Para as mãos, os protectores dos punhos em plástico garantem alguma protecção. Mas se a moto fosse minha, esse seria o primeiro upgrade que lhe faria, uma vez que em caso de queda não inspiram muita confiança. Mas as motos também não são para andar a cair, pois não?
Falta dizer se em estradas rápidas ela “se mexe”. Pois, mexe-se e bem. Já o referi anteriormente: se o objectivo for “decorar” o cartão de fidelização de pontos, serve perfeitamente. O Estado agradece… Mas se formos prudentes, assegura-nos bons ritmos de viagem, principalmente se optarmos por estradas mais divertidas como as nossas nacionais.
CONCLUSÃO
Sabemos que a tipologia trail significa uma expectativa de grande polivalência: adequa-se a qualquer ambiente, desde a auto-estrada a percursos off-road. A V-Strom tem essa polivalência, mas não com a mesma eficácia nos diferentes tipos de estrada (não sei aliás se alguma o terá).
As V-Strom, esta 650 tal como também a 1050, são trails vocacionadas para os percursos estradistas. O seu comportamento, as suspensões e o tipo de pneus a isso recomendam. O que não significa que não se sintam à vontade em estradões rápidos e com piso razoável.
Se utilizarmos um paralelo com as classificações dos pneus, eu diria que esta é uma moto 80/20. Destina-se a quem só esporadicamente opte pela terra. O que significa que se é este o objectivo talvez o ideal seja procurar solução alternativa….
Na minha apreciação, a Suzuki V-Strom 650 está muito próxima de ser a solução ideal para quem faz da moto o seu veículo de eleição quotidiana. Tem o desembaraço citadino que começa a fugir às big-trails e aproxima-se do conforto e dinâmica destas nas aventuras estrada fora. Certamente que tiradas de várias centenas de quilómetros de enfiada, cobrarão o seu preço ao físico do condutor (e do pendura se for o caso). Mas chega onde as outras chegam, isso não restam dúvidas.
É uma moto com excelente condução, robusta e fiável. Já agora…bonita também.
Uma nota relativamente a viagens mais longas: nestes casos, o condutor far-se-á acompanhar de bagagem. Provavelmente com uma top-case e malas laterais. Não terá qualquer problemas em as montar, sejam as da Suzuki ou de marcas independentes. Poderá é a moto ficar acanhada se se levar pendura. É uma 650 e não uma big-trail, não esqueçamos.
E aqui chegados, é obrigatório fazer um registo: é notável que um modelo nascido em 2004 chegue, 17 anos depois, ainda perfeitamente competitivo face ao mercado. É evidente que ao longo deste período foi sempre evoluindo, seja nas características mecânicas, electrónicas ou estéticas. Mas chegar a este ponto da sua história e podermos afirmar que constitui uma alternativa muito válida face a outras propostas bem mais recentes merece ser destacado.
Talvez aqui surja um pormenor menos positivo: o preço chave na mão da versão 2021 ultrapassa por muito pouco, mas ultrapassa, os 2 dígitos de milhar de euros. Mais de 10 mil euros parece-me um pouco caro. Mas esta será sempre uma escolha mais racional do que apaixonada e talvez o “investimento” o justifique pela longevidade garantida.
As más-línguas antecipam uma evolução significativa para breve. Já aconteceu com a V-Strom maior e será este o caminho que a marca japonesa provavelmente seguirá em breve.
Sem revoluções ….mas com muitas evoluções. Enquanto não chegam, só podemos assegurar que a Suzuki V-Strom 650 cumpre e bem o seu papel. Tiro-lhe o meu chapéu…perdão, capacete!
E termino com a resposta à questão inicial, recordam-se? Se seria no meio (da gama V-Strom) que estava a virtude?
A resposta só pode ser afirmativa. A Suzuki V-Strom 650 é claramente uma moto com uma grande virtude: o seu equilíbrio (na polivalência, na dimensão, na facilidade de condução). Tal não significa qualquer menosprezo para as outras duas versões. Pelo contrário. Mas o facto de se posicionarem nos extremos torna-as mais direccionadas para necessidades específicas e menos abrangentes do que esta V-Strom 650.
O diagnóstico de Viagens ao Virar da Esquina está feito. Mas, como se costuma dizer, “cada cabeça, sua sentença”. Por essa mesma razão, fará todo o sentido acrescentar aqui uma segunda opinião. E principalmente, uma opinião mais abalizada da parte de quem possui uma e dela faz o seu “cavalo de batalha” diário.
O José Serra é meu companheiro de muitos quilómetros e privilegia-me com a sua amizade. Para lá disso tem uma V-Strom 650 de 2018 (no caso a versão A, mas para o caso pouco releva porque só diferem os autocolantes e as jantes raiadas). É a ele que agora passo a palavra.
A SEGUNDA OPINIÃO
Ora bem… a minha opinião fundamentada sobre a amarela… antes de mais, o porquê da escolha porque, para um utilizador médio, a questão passa muito pela adequação.
Aos 54 anos, vindo de uma mota totalmente “estradista” com um motor de “4 em linha” e uma preferência vincada pelos altos regimes, precisava de “descontrair”, ou seja:
De uma posição de condução mais “descontraída”;
De um motor mais “descontraído”, menos exigente na utilização da caixa, mais cheio em baixos regimes;
Da possibilidade de, em passeios, sair do asfalto de forma mais “descontraída”, isto é, sem aquela sensação de “vou dar cabo disto…”
Acresce que me desloco diariamente de mota para o trabalho (16 km ida e volta, sempre dentro da cidade e, frequentemente, com trânsito (actualmente nem tanto, mas não pretendia comprar uma mota para revender no fim do confinamento, por muito que ele possa ainda durar); assim, procurava uma máquina de média cilindrada, com uma potencia e um binário “decentes”, ou pelo menos suficientes para os passeios de estrada com os amigos, normalmente sem “pendura”.
Dito isto, não foi difícil tomar a decisão:
A Africa Twin é grande (cilindrada a mais);
A Tracer e a Versys são puras estradistas (versatilidade a menos);
As Europeias são muito caras (dinheiro a mais na etiqueta do preço e a menos na carteira).
E foi então que ela apareceu! 2 aninhos, em Stand, 1 ano de garantia e um preço convidativo, tendo em conta os mais de 1500€ de equipamento que trazia (crash bars, protecção de motor, descanso central, piscas em Led, barra de acessórios, punhos aquecidos, guarda-mãos metálicos, topcase, malas laterais) – enfim, não foi um negócio “da China”, mas foi um negócio justo.
E, ainda por cima, amarela – eu sempre tinha dito que, se comprasse uma V-Strom, queria que fosse amarela (o que sempre provocou estranheza…)!
Então, após alguns (poucos, por causa do confinamento) milhares de km, o que dizer?
Motor:
Exactamente o que eu esperava, mas com mais uma dose considerável de vivacidade; a forma como reage ao acelerador logo a partir das 4000 rpm ou pouco mais é bastante mais divertida do que me lembrava (tinha feito um test ride em 2017); em “baixas” excelente, conforme eu já sabia que seria – uma delícia a curvar de forma um pouco mais entusiástica e sem necessidade de estar sempre a reduzir para manter o regime “lá em cima”.
A sonoridade é…o que é! Nos dias que correm, não é boa política substituir escapes (como eu tinha feito na minha mota anterior), porque o som que tanto gostamos de ouvir pode custar-nos uma apreensão da mota ou um chumbo na inspecção (quando houver); no entanto, o som do V-Twin até não é desagradável – é apenas baixinho…
Tecnologia:
Pouca coisa, mas o que tem é excelente:
Computador de bordo eficaz que, apesar de um ar algo “antiquado”, tem imensa informação e de fácil acesso;
O controlo de tracção sente-se! Especialmente em piso molhado, quando mudamos para o nível 2, sentimos que está lá – e à saída das curvas, dá mesmo bastante jeito.
Easy Start: não é a coisa mais essencial que se pode ter, mas o facto de apenas ser necessário um toque no botão de ignição é coisa a que até nos habituamos…
Low RPM assist: em utilização normal, esquecermo-nos que lá está, mas nas manobras em baixa velocidade é cómodo – e é preciso não esquecer que existe uma versão limitada a 35 kw, dirigida aos “recém encartados”, que agradecem estas pequenas ajudas…especialmente com mais de 200 kg de mota!
Travões:
Eficazes, suaves, a condizer em tudo com o estilo de condução a que a mota convida – “descontraído” (acho que já usei o termo hoje…); em situações de maior emergência (do tipo “ai mãezinha qu’eu parto-me todo”), podem obrigar a exercer alguma força na manete, mas correspondem e, mesmo em condução mais “apressada”, nunca senti a falta de nada a este nível.
Suspensão:
Merecia uma suspensão regulável à frente! Lá que merecia, merecia!! No entanto, a que tem cumpre bem; em estradas esburacadas (o chamado “todo-o-terreno asfaltado”, tão comum no nosso País), mantém um nível de conforto surpreendente, quase nos fazendo crer que estamos “montados” numa mota maior. Não fiz com ela percursos off-road, apenas umas estradas de terra batida em que se portou muito bem, admitindo eu que não seja mota para off-road à séria – mas também não é isso que alguma vez pretendi dela.
Quanto à suspensão traseira, com os meus 85 kg, mantenho a afinação de fábrica, não me parecendo que a mota se torne desconfortável ou saltitona… pelo que, assumo, será o correto – no entanto, é bom saber que, se levar pendura, a regulação é fácil. Também numa condução mais “empenhada” em estradas mais reviradas (como aquele troço bem divertido entre Tramagal e Rossio ao Sul do Tejo), o comportamento em curva é excelente e muito previsível – nada de mal a apontar, portanto.
Ergonomia:
Um “mimo”…e as costas agradecem!
Pese embora, como o amigo Henrique, eu não seja propriamente pequenino (1m81), venho de uma mota bastante mais “acanhada” em termos de posição de condução, pelo que nesta me sinto perfeitamente “à vontade”. Compreendo que lhe tenha parecido pequena, pois a mota que ele conduz habitualmente é bastante maior…
Em pé, o guiador fica um pouco “baixo”, mas de qualquer maneira, não é suposto conduzir em pé com as pernas esticadas, pelo que não se justifica instalar “risers”.
Comandos da mota, tudo nos sítios habituais, excepto o interruptor de máximos, que se acciona empurrando para fora o botão de sinal de luzes, solução em minha opinião mais eficaz do que o habitual botão. O botão “Mode” (onde costumava estar o tal botão dos máximos) permite “rodar” a informação disponível nas duas áreas do painel com toda a facilidade e conforto.
Uma palavra para os retrovisores – parecem, de facto, espelhos de casa de banho! No entanto, proporcionam (quando correctamente orientados) uma excelente visibilidade para trás, pelo que a vontade irresistível de os trocar passa rapidamente. Note-se que não vibram em nenhum regime.
Consumos:
Pois! É o hábito. Não é, de facto, uma mota que peça uma condução em “altas”, mas é o que dou por mim a fazer…
Tem feito 5,3 a 5,5 l/100km em cidade (que é onde tenho podido andar). Enquanto não me adaptar totalmente à mota, não sou exemplo – acredito que possa fazer bastante menos, ainda que não em “condução económica”, que é coisa que, de mota, não faço…
Em jeito de Conclusão:
Uma escolha racional, equilibrada e relativamente económica, com um tipo de utilização bastante abrangente em termos de passeios de fim de semana, em todo o tipo de estradas e estradões, sem esquecer os pequenos percursos do dia-a-dia no meio do trânsito da cidade.
De bónus:
Uma dose q.b. prazer de condução;
O facto de eu realmente gostar da mota o que, no fim de contas, deve ser o factor principal na escolha de uma mota – o gosto pessoal de cada um! Goste-se ou não do amarelo! Porque, para fazer escolhas 100% racionais, há os electrodomésticos…
AGRADECIMENTOS
Sobre a V-Strom 650 ficou tudo dito. Assim importa aqui deixar os devidos agradecimentos:
– À MOTEO, SA, representante nacional da Suzuki entre outras marcas e a quem fico grato pela disponibilidade, colaboração e amizade.
– À JPM MOTOS, concessionário da marca, localizado em Frielas-Loures, que para lá das excelentes instalações nos brindam sempre com uma grande simpatia e colaboração.
– Ao José Serra, pela colaboração neste ensaio. A experiente “segunda opinião” bem como a ajuda na captação de imagens são inestimáveis.
– Aos NEXIT nas pessoas dos seus músicos e meus Amigos Ricardo Silvestre e Bruno Duro que, mais uma vez, cederam a música para a banda sonora do filme que conta esta experiência com a Suzuki V- Strom 650XT e que poderá ser visto no Canal de YouTube de Viagens ao Virar da Esquina.
A todos um enorme bem haja!
Deverá estar ligado para publicar um comentário.